O constitucionalista Jorge Miranda, considerado o “pai” da primeira Constituição portuguesa do pós-25 de Abril, mostra-se muito preocupado face ao futuro do Estado Português. A propósito de uma conferência, organizada pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP), para debater a Constituição Europeia, Jorge Miranda sublinhou que “o processo de Constituição tem sido conduzido de forma muito pouco democrática”.

O primeiro problema mencionado por Jorge Miranda foi “o desconhecimento generalizado das questões europeias”. Uma questão que não é só nacional, garante o especialista, e na qual a classe política tem responsabilidades “pela falta de esclarecimento” aos cidadãos. Para Jorge Miranda o que está em causa “nem sequer é uma Constituição”, porque esta pressupõe um poder constituinte que não é detido pela Convenção que foi designada para preparar uma Constituição para a União Europeia.

“O nome Constituição não é dado por acaso” garante Jorge Miranda, é antes “mais uma manifestação de vanguardistas que subliminarmente querem afirmar um certo federalismo”. Por detrás deste projecto preparado pela Convenção Europeia está “um sistema de dominação dos grandes Estados”, o chamado “directório” que Jorge Miranda acusa de introduzir neste projecto de Constituição um “jacobinismo centralizador”.

“A constituição da Comissão, as maiorias qualificadas, o desaparecimento das presidências rotativas” são graves problemas que enfermam o texto que no mês de Junho vai voltar à discussão na Conferência-Intergovernamental (CIG), que terá lugar em Bruxelas.

Outro ponto que leva Jorge Miranda a ser “extremamente crítico” é a revisão constitucional recentemente aprovada no nosso parlamento. Para o constitucionalista “pôs-se o carro à frente dos bois”. Ou seja, foram introduzidas alterações “sem que a Constituição Europeia tenha sido aprovada “mas abrindo caminho a ela”. Jorge Miranda referiu-se concretamente à introdução do nº4 do artº 8º que traz o “primado do Direito da União” sobre o Direito nacional.

As alterações relativas às Regiões Autónomas causam “uma subtracção de poderes do Estado”, segundo Jorge Miranda. Para este, é também “curiosa” a falta de consenso que agora se gera em volta da delimitação de mandatos para os eleitos locais, uma questão que prova, no seu entender, “o enorme peso que os autarcas assumem face ao poder central”. Resultado: “enfraquecimento e suicídio do Estado português”.

E deu até o exemplo do adiamento da visita oficial de Durão Barroso ao México (para assistir à final da Liga dos Campeões), para exemplificar como algumas relações dos políticos com determinados sectores não são desejáveis.

Jorge Miranda, disse ainda ser “favorável à existência de uma Constituição Europeia, mas não desta forma”. E concluiu a sua intervenção dizendo que “seria bom que me enganasse mas é o fim do Estado português que está à vista”.

Liliana Filipa Silva