Os Trovante são uma das bandas mais marcantes do panorama pop-rock português. João Gil e Luís Represas, entre outros, passaram pela formação da banda, que nasceu em 1976 e ficou sempre marcada pela influência da música tradicional portuguesa e pela forte componente política que transmitia nas suas letras.
Na altura, Luís Represas não imaginava ficar associado à causa de Timor, quase como Zeca Afonso ficou ligado à revolução de 25 de abril de 1974. “Timor”, tema que tantas vezes cantou ao microfone dos Trovante, não foi uma senha de ataque nem um hino à liberdade portuguesa. Mas acabou por se tornar numa das canções mais marcantes do reportório da música de intervenção, com uma influência considerável na resolução do conflito.
O tema remonta a 1988, quando João Gil compôs um instrumental para o filme “Flores Amargas”, de Margarida Gil, com um coro em tetum, a língua nativa de Timor. Em declarações ao JPN, Luís Represas explica que, durante as gravações do LP “Um Destes Dias”, o Papa João Paulo II deslocou-se à Indonésia, fazendo Timor parte dessa visita como território daquele país. “O Sumo Pontífice não beijou o solo à chegada ao território timorense, pois já tinha beijado em Jacarta”, recorda.
“Esta atitude levou o João Monge a escrever a letra definitiva de ‘Timor’, que gravamos com o objectivo solidário para com a luta do Povo de Timor Leste. Nessa época, pouco ou nada se falava desse drama”, explica. Apesar de não ter sido recebida muito bem pela crítica, a música acabaria por tornar-se num dos principais temas da banda sonora que acompanhou a independência timorense.
“A nossa intenção sempre foi chegar o mais longe possível e funcionar como um ‘despertador’ das consciências”, diz Luís Represas. “No fundo, queríamos ajudar a acordar os portugueses para a responsabilidade histórica que tinha para com o povo timorense”, refere.
Luís Represas classifica o momento da independência timorense como “único”. “Chegar ao fim de uma longa e sofrida caminhada dos timorenses, que todos nós acompanhámos, deu-nos o privilégio de ver nascer um país, novo por decreto mas antigo por cultura. Todos estivemos envolvidos e todos merecemos essa grande emoção”, afirma.
“Dez anos não são nada na vida de um país”
Dez anos depois da independência na qual, de certa forma, participou, Luís Represas considera que o país está a caminhar no rumo certo e num ritmo normal. “Embora antigo na cultura, Timor nasceu para a comunidade internacional como um país novo. Com tudo por fazer, tudo para aprender, com tudo para pôr em prática essa sabedoria ancestral”, diz.
“Em dez anos caminhou-se e construiu-se muito, mas dez anos não são nada na vida de um país”, considera o músico. E faz o paralelismo com Portugal : “quando falamos nesta história recente de Timor seria bom que antes olhássemos para o nosso pós-25 de Abril. E humildemente tomássemos consciência do que ficou por fazer nos últimos, do que foi mal feito, do que foi desperdiçado, da ganância e da incompetência que nos destrói, da sede de poder que nos afoga”.
Luís Represas olha para Timor e vê um futuro positivo, defendendo que Portugal deverá estar sempre disponível para ajudar a causa do segundo país mais jovem do mundo. “Deixemos Timor fazer o seu caminho, com Portugal sempre disponível ‘desinteressadamente’ para o que fôr necessário e puder cumprir”, conclui.