A Câmara Municipal do Porto (CMP) não tinha conhecimento nem aceita um eventual cerco sanitário da cidade, mencionado esta segunda-feira (30) na conferência de imprensa da Direção-Geral da Saúde (DGS), pela voz da sua diretora-geral, Graça Freitas. Em comunicado, a CMP considera a medida “absurda” e adianta que não foi pedida pela Proteção Civil do Porto, nem pela Proteção Civil Distrital.

“Nenhuma destas instituições e nenhum dos seus responsáveis, incluindo o presidente da Câmara do Porto, foi contactado, avisado ou consultado pela Direção-Geral da Saúde”, afirma a Câmara no comunicado.

A CMP refere que a pandemia do novo coronavírus (responsável pela doença COVID-19) já se “encontra generalizada na comunidade em toda a região e país”, sendo a medida, por isso, “inútil e extemporânea”.

No comunicado é ainda dito que isolar a cidade “não faz sentido”, visto que os concelhos à volta da cidade do Porto se encontram numa situação igual.

O cerco sanitário iria pôr em causa o funcionamento de serviços básicos da cidade, como “a limpeza urbana (cuja maior parte dos trabalhadores não reside na cidade), como a recolha de resíduos (cuja LIPOR fica fora da cidade), como o abastecimento e acessos a dois hospitais centrais (Santo António e São João)”, lê-se no comunicado.

A Câmara do Porto diz não poder concordar com a medida, que foi “baseada em estatísticas sem consistência científica ou fiabilidade, emitidas diariamente pela DGS e cujas variações demonstram a sua falta de credibilidade”.

A CMP termina o comunicado dizendo que “deixa de reconhecer autoridade à senhora Diretora-Geral da Saúde, entendendo as suas declarações” na conferência de imprensa desta segunda-feira “como um lapso seguramente provocado por cansaço”.

De facto, a opção da Direção-Geral da Saúde está longe de ser consensual. Além do município do Porto, também o de Vila Nova de Gaia rejeita que a solução seja a mais indicada. Ao JPN, o presidente da autarquia, Eduardo Vítor Rodrigues, diz que uma “cerca sanitária nunca foi discutida e nunca esteve em cima da mesa”. “Não faz sentido nenhum”, reforça.

“Que eu saiba, a Comissão de Proteção Civil o que pediu foi uma intensificação das medidas de proteção e segurança das entidades que são tuteladas pela Proteção Civil — que não são as da saúde, são basicamente as forças de segurança — para haver um reforço de intervenção no condicionamento da circulação das pessoas. Não era nenhuma cerca sanitária. E [esse reforço] aconteceu”, conclui o autarca de Vila Nova de Gaia.

Em resposta aos jornalistas no balanço conjunto diário da DGS e do Ministério da Saúde, Graça Freitas anunciou que estaria a ser discutido um eventual cerco sanitário no Porto. A diretora-geral da Saúde disse ainda que esta segunda-feira deve ser tomada a decisão sobre o tema, estando a medida a ser equacionada entre as autoridades de saúde regionais, as autoridades de saúde nacionais e o Ministério da Saúde.

Porém, o anúncio tomou praticamente toda a gente de surpresa. A questão original, sabe o JPN, perguntava na verdade quais as razões para não serem colocados cercos sanitários em cinco concelhos do Grande Porto que, segundo notícias da semana passada, os tinham pedido.

No entanto, uma falha na leitura da pergunta pela intermediária do Ministério da Saúde alterou o sentido e individualizou o concelho do Porto.

Nesta fase, as perguntas dos jornalistas que não estão a acompanhar a conferência no local são enviadas por mensagem de texto e lidas por um elemento da secretaria-geral do Ministério da Saúde.

Marco Martins, líder da Comissão Distrital da Proteção Civil do Porto, explica que o tema chegou a ser abordado, mas há já uma semana, tendo a Autoridade Regional de Saúde (ARS) entendido que a medida não se justificava. “Quando foi ativado o plano distrital, como o plano de emergência assim obriga, foi colocada à consideração da Autoridade Regional de Saúde implementar, ou não, cercas [sanitárias]. No dia 22 [de março]. E a resposta foi que não se justificava já naquela altura, que era tarde demais, que já não era eficaz”, diz ao JPN.

“No âmbito daquilo que é o plano de emergência, coloca-se a cada entidade na sua área técnica as medidas a implementar”, explica o também autarca de Gondomar.

Contactada pelo JPN ao início da tarde, fonte oficial da ARS Norte não quis adiantar mais informação remetendo-a para “quando for oportuno”.

Artigo editado por Filipa Silva.

Artigo atualizado pela útlima vez às 19h14 de 30 de março de 2020 com as declarações de Marco Martins e Eduardo Vítor Rodrigues ao JPN.