A Volta à França vai mesmo acontecer em agosto devido à pandemia de COVID-19. Após várias especulações, a União Ciclista Internacional (UCI) oficializou, esta quarta-feira (15), as novas datas da competição sem registo de alterações na rota prevista. Se vai ou não ter público na estrada, é matéria ainda não resolvida, mas seria “super triste” se assim fosse, comenta ao JPN o francês Olivier Bonamici.
A 107ª edição do Tour, que deveria ter início a 27 de junho, foi adiada para dia 29 de agosto e terminará a 20 de setembro, como tradicionalmente, na Avenida dos Campos Elísios, em Paris.
Esta decisão foi tomada após o presidente Emmanuel Macron declarar, na segunda-feira (13), que o confinamento vai continuar até dia 11 de maio, referindo também que estão proibidos os ajuntamentos entre pessoas até “pelo menos, meados de julho”.
Em declarações ao JPN, Olivier Bonamici, que há vários anos comenta a prova na Eurosport portuguesa – juntamente com Paulo Martins e Luís Piçarra -, afirma que esta é “a última chance” que a entidade organizadora, Amaury Sport Association (A.S.O), tem para realizar a competição.
“Há milhares de incógnitas. Para já, o estado de como vai estar a epidemia até lá e se o Estado francês vai autorizar ou não este tipo de eventos. o presidente disse ‘até pelo menos’, ele não disse ‘até 15 de julho’, e esta expressão “pelo menos” é super importante”, observa Olivier Bonamici.
O fecho das fronteiras é outra questão que deixa o comentador com dúvidas sobre a realização da “Grande Boucle“.
“Neste momento, continuam fechadas fronteiras dentro do espaço Schengen. Ou seja, será que vão reabrir ou não? Porque se não reabrirem, ciclistas colombianos, por exemplo, não poderão participar na volta à França”, acrescenta o comentador.
Para além do reagendamento, não foi dada qualquer informação adicional sobre as medidas que vão ser tomadas durante a competição, apesar de se falar na realização da prova “à porta fechada”.
Sobre este assunto, o comentador acha que, “à data de hoje”, pode ser uma solução. O problema é a “logística brutal” necessária devido à enorme quantidade de gente que a competição requer – corredores, Staff, forças policiais. Para além de que existe no ciclismo uma “comunhão entre as pessoas que estão a ver da estrada e os ciclistas”.Seria “super triste” ver uma corrida sem público, considera.
Para Olivier Bonamici o ciclismo está, como tudo o resto, dependente das condições sanitárias que se venham a verificar no futuro próximo. Caso não se venha a realizar a Volta à França, o ciclismo vai sofrer “consequências muito graves” no longo prazo, diz. Televisões, empresas patrocinadoras e até mesmo entidades organizadoras poderão passar por situações dramáticas caso a Tour de França não aconteça.
Até para Olivier Bonamici estes são tempos difíceis. O comentador recorda que a primavera é “o grande regresso do ciclismo” e que por esta altura estaria a comentar as competições clássicas da Belgica e da França.
“Para mim, que comento ciclismo há muitos anos é a primeira vez que fico parado sem fazer nenhum comentário de ciclismo e é evidente que há imensas saudades”, admite o comentador.
Mas para evitar situações ainda mais complicadas no setor, a UCI declarou no comunicado que é uma prioridade a “realização deste evento nas melhores condições possíveis” devido ao “seu lugar central na economia do ciclismo e a sua exposição, em especial para as equipas que beneficiam de uma visibilidade sem paralelo”.
Assim, caso não haja complicações até ao período de realização da “Grande Boucle”, o público poderá, em teoria, assistir ao evento como nas edições anteriores.
Até hoje, a única competição dos três “Grand Tours” que tinha sido adiada era a Volta a Itália. Prevista para o decorrer entre dia 9 e 31 de maio, o Giro de Itália foi adiado dia 13 de março. Agora, e de acordo com o comunicado da UCI, a ordem das competições deve ser: Volta à França, os campeonatos do mundo, a Volta a Itália e, por último, a Volta a Espanha.
O Tour de França, Giro de Itália e a Vuelta de Espanha são as três provas mais prestigiadas do “Grand Tour” de ciclismo. No entanto, por ser a competição mais antiga, o Tour de França é considerado como a mais importante.
Criado em 1903 pelo jornal “L’auto” de Henri Desgrange, o Tour de França foi pensado como estratégia para vender mais jornais do que o concorrente “Le Vélo”. Atualmente, a competição é gerida pela Amaury Sport Organisation (ASO) e faz parte da União Ciclista Internacional (UCI). Após a primeira edição ter sido um sucesso, a competição tornou-se um evento anual, tendo sido cancelada entre 1915-1918 e depois mais tarde entre 1940-1946 devido às Guerras Mundiais.
Inicialmente narrada pelos jornais e mais tarde emitida por Transmissão Sem Fios (TSF), o Tour de France foi crescendo e acolhendo cada vez mais corredores estrangeiros. Atualmente, o número de equipas varia entre 20 e 22 com nove ciclistas cada e a maioria das equipas são da elite profissional, devido a ser um evento da UCI World Tour. Porém os organizadores têm a possibilidade de convidar corredores para participar na prova.
Até aos Campos Elísios
A corrida ocorre tradicionalmente durante o mês de Julho. O percurso da competição é sempre alterado de ano para ano, mas inclui sempre provas de contrarrelógio, passagem pelas cadeias de montanhas dos Pirinéus e dos Alpes, terminando na Avenida dos Campos Elísios, na capital Francesa. As edições são compostas por 21 etapas diárias com uma duração de 23 dias, e cerca de 3.200 quilómetros percorridos.
Traçado da edição deste ano do Tour
Todas as etapas são cronometradas e após o término de cada uma o tempo de cada ciclista é somado aos resultados anteriores. O corredor com o menor tempo de percurso é declarado como o vencedor do cobiçado “maillot jaune” – integrado na prova em 1919 tem por objetivo distinguir o líder da classificação geral.
Grandes nomes do Tour
Com 117 anos de história, a Tour tem, gravada na sua história, os nomes de grandes corredores.
O primeiro chama-se Maurice Garin, um ciclista Italiano nascido em 1871 em Arvier, naturalizado francês em 1901. Aos 14 anos Garin deixou a sua aldeia natal atravessando a fronteira para procurar trabalho. Instalou-se em Savoie no norte de França, onde limpava chaminés até descobrir a paixão pelo ciclismo em 1892. Depois de várias vitórias enquanto amador, Maurice Garin tornou-se profissional em 1895. Ao longo da sua carreira amealhou dois prémios Paris-Roubaix – uma das mais antigas provas de ciclismo criadas em 1896 – e em 1903 tornou-se o primeiro vencedor do Tour de França.
Também Chrisopher Froome se tornou um grande nome na história da competição francesa. Froome é um ciclista britânico nascido em 1985 em Nairobi, no Quénia. É membro da equipa Ineos. Atualmente, é o único a ter ganho quatro vezes o Tour de France (2013, 2015, 2016 e 2017). Ganhou duas vezes a Vuelta (2011 e 2017), uma vez o Giro (2018) e foi duas vezes medalha de bronze no contrarrelógio dos Jogos Olímpicos em 2012 e 2016.
Melhor do que Froome, só mesmo Jacques Anquetil, Eddy Merckx, Bernard Hinault e Miguel Indurain que são os únicos a terem ganho cinco vezes a prova.
Já Lance Armstrong, ciclista norte-americano e campeão do mundo de ciclismo de estrada em 1993, fica na história do Tour de France por ter ganho sete vezes consecutivas a competição (1999-2005). No entanto, os títulos foram-lhe retirados em 2012 depois de se ter reformado, devido à Agência Norte Americana Antidopagem (USADA) ter revelado que o desportista testou várias vezes positivo no teste de doping.
Outro caso marcado pelo uso de substâncias dopantes é o caso Festina, fazendo parte das maiores desqualificações da história do Tour. A equipa patrocinada pela marca de relógios Festina foi desqualificada em 1998 depois de surgirem revelações da prática de doping dentro da equipa. Após a descoberta a competição foi interrompida em protesto.
O uso de substâncias, para melhor desempenho desportivo, é um assunto que tem perseguido a prova desde 1903. Inicialmente era consumido álcool e éter – substância líquida utilizada como anestésico – para aliviar a dor. Ao longo dos anos o desempenho dos corredores foi aumentando e a UCI assim como os governos começaram a promulgar políticas para o combate ao uso de substâncias.
Artigo editado por Filipa Silva