A aventura de Renata Oliveira na música começou no mundo das bandas filarmónicas. Foi assim com ela, é assim com muitos músicos em Portugal. Aos 7 anos, na Banda Visconde de Salreu, distrito de Aveiro, começou a aprender clarinete e a tocar em romarias um pouco por todo o Norte do país. “Foi na banda que nasceu o gosto pela música”, recorda a maestrina em entrevista ao Linha Contínua/JPN.

Natural de Estarreja, Renata prosseguiu os estudos no Conservatório de Música de Aveiro Calouste Gulbenkian e formou-se em Psicologia, na Universidade do Porto. Mas no último ano do curso, quando já tinha concluído os estudos musicais, sentiu “que faltava alguma coisa para alimentar o bichinho da música”.

“Sempre quis estudar música, mas não queria seguir clarinete”, conta Renata para descrever o vazio que estava a sentir na altura. A partir daí, foi surgindo a curiosidade pela direção musical. “Será que consigo fazer isto?”, era a pergunta que fazia a si mesma, até que no desafio encontrou a sua vocação e paixão. E a psicologia também faz parte dele. A direção musical afigurou-se a Renata Oliveira como uma oportunidade de juntar “o conhecimento musical ao contacto humano”.

Não chegou lá sem um grande esforço. “De 15 em 15 dias, à quarta-feira, às 5 horas da manhã, toca a acordar, apanhar o primeiro Intercidades do Porto para Lisboa”, conta Renata explicando as viagens que tinha de fazer para aprender Direção Musical em Lisboa com o maestro francês Jean-Marc Burfin, enquanto estagiava no IPO do Porto e preparava a sua tese de mestrado.

Mas Renata Oliveira quis ir mais fundo. Aprender mais na área da Direção Musical. Primeiro, concluiu o mestrado em Direção de Orquestra na Universidade de Aveiro. Depois, em Direção HaFaBra (banda, fanfarra e brass band) no Conservatório Real de Haia (Holanda).

As primeiras experiências profissionais teve-as em orquestras, mas é às bandas, um mundo que sempre foi o seu. que dedica hoje toda a sua atenção. Com já alguns anos de experiência na área, Renata Oliveira assume, neste momento, o cargo de maestrina na Sociedade Artística Carvalhense (Figueira da Foz) e na Associação Musical Banda de Ourém.

EAWBC: um espaço de “conciencialização” da mulher na função de maestro

Aos 30 anos, a maestrina diz que sempre analisou o seu trabalho olhando para a competência. “Soube que consegui um trabalho e perdi a oportunidade de entrevista para outro, em ambas as situações, por ser mulher”, recorda. Recorda e lamenta, porque “adorava viver num contexto em que o que interessa é se és competente ou não”.

Apesar de se sentir uma “privilegiada” e de nunca ter tido grandes problemas no universo da direção musical por ser mulher, foi percebendo que “o mesmo não acontecia em muitos outros casos”.

A sua experiência na Holanda e contacto “com outras culturas, outras formas de pensar e outras realidades” fizeram vislumbrar uma realidade distinta daquela que vivia pessoalmente. “Se eu existisse há cinquenta anos, não podia ser maestrina, portanto, não é uma distância assim tão grande. Só porque para mim isto não foi uma questão, não posso fechar os olhos e dizer que somos todos iguais e está tudo bem, porque não, não é”, revela Renata.

Refletir sobre o assunto levou-a a aceitar fazer parte da equipa fundadora da European Association of Women Band Conductors (EAWBC), para onde entrou a convite da maestrina italiana Antonella Bona, a única maestrina de bandas militares em toda a Europa.

“Surgiu por essa vontade de criar uma rede, de nós nos conhecermos ao nível europeu”, explica. Também para criar “um espaço seguro e de produção musical” que traga mais “consciencialização” à temática da mulher na função de maestro.

Tudo isto começou em março de 2020, online, durante o período inicial da pandemia e em outubro de 2020 tiveram os primeiros contactos pessoais. A equipa é composta pela referida maestrina italiana e por Celine Pellmont, Sara Maganzini, Renata Oliveira e Roberto Masi. A European Association of Women Band Conductors tem sede em Genebra, na Suíça.

O objetivo da EAWBC não é “criar divisão”, mas sim criar uma união e continuar o caminho ascendente da credibilidade e da competência das maestrinas, “os únicos fatores que deviam importar”.

“Tornar-se sócio desta associação não está dependente do género. Com a nossa existência, não queremos acentuar as diferenças”, diz a maestrina portuguesa, que abraçou este projeto. A partir do início deste ano, começam a promover atividades como webinars, masterclasses, vídeos instrutivos, entre outras. Tudo isto, pelo mesmo motivo, pela mesma força, pelo mesmo foco: a paixão pela direção musical.

Artigo editado por Filipa Silva

Este trabalho foi originalmente realizado para o jornal Línha Contínua no âmbito da disciplina de AIJ/Online – 3.º ano