Com a reabertura da economia portuguesa, depois do confinamento imposto no início de 2021, as vagas de emprego aumentaram consideravelmente no segundo semestre de 2021. Em 2020, a média mensal de ofertas de emprego disponíveis rondou as 12 mil. Em agosto de 2021, o número de postos de trabalho disponíveis duplicou, passando para mais de 24 mil, um valor que em todo o século XXI só tinha sido atingido em 2017.

Dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), mostram que entre junho e novembro de 2021 (os dados de dezembro ainda não estão disponíveis) as vagas de emprego estiveram sempre acima das 20 mil. É verdade que o número de desempregados tem vindo a baixar desde abril, mas com mais de 345 mil desempregados registados em novembro (389 mil se considerarmos a média mensal até esse mês), por que razão existem tantas vagas de emprego por preencher?

Apoios do Estado entre as razões

Em entrevista ao JPN, Filipe Grilo, professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), refere que, entre as possíveis justificações para a falta de procura sobre as vagas de emprego, está o facto de, depois da pandemia, as pessoas ainda estarem “muitos apoiadas pelo Estado”.

Perante a relativa segurança económica providenciada por esses apoios, “só um bom salário permitirá convencer as pessoas a irem para um novo emprego”, considera ainda o economista. Até porque, acrescenta, as vagas que estão a ficar sem candidatos correspondem a empregos com salários mais baixos, como os oferecidos nos setores da restauração e do turismo.

Entre os apoios do Estado está o subsídio de desemprego que, segundo Filipe Grilo, “acaba por impactar na falta de pessoas disponíveis para trabalhar”. De acordo com o INE, o número de beneficiários de subsídios de desemprego aumentou consideravelmente em 2020 – ano muito afetado pela pandemia – em relação aos anos anteriores (2017, 2018 e 2019).

Filipe Grilo também explica que nos setores mencionados (turismo e restauração) existirá agora, por parte dos trabalhadores, uma maior perceção dos riscos inerentes a estas atividades, que além de salários tradicionalmente baixos e horários flexíveis, estão muito expostas a flutuações do mercado e à sazonalidade na procura: “Começam a pensar que aquele salário já não compensa, mesmo com as ajudas do Estado. Ou seja, como o risco agora aumentou, há um custo acrescido que agora tem que ser compensado [pelas empresas]”, comenta.

Sentimento de insegurança também nas empresas

De acordo com Filipe Grilo, o tempo de pandemia trouxe insegurança também para as empresas, que refletem essas cautelas na natureza dos vínculos que propõem. “Como as empresas ainda não sabem bem como é que vai ser isto do desconfinamento, se ainda vamos ter mais confinamentos, de certeza que os novos contratos que andam a propor são contratos muitos temporários, com muitas indefinições, o que é pouco convidativo para as pessoas preencherem essas vagas”.

Outro dos fatores que o economista acrescenta à lista para justificar a subida do números de empregos disponíveis está relacionada com o aumento das ofertas de emprego do Estado: “O Estado contratou em força este ano”, recordou.

Os setores mais afetados

Segundo dados do IEFP, os empregos disponíveis com maior oferta a nível nacional em outubro de 2021 eram dos setores do Imobiliário; Comércio por grosso e a retalho; Alojamento e restauração; Educação, atividades de saúde e apoio social; e da Construção.

A escassez de mão de obra na construção é bem conhecida por Isaura Santos, que tem, com base no Porto, uma empresa de construção civil desde 2004. Tem onze trabalhadores ao seu encargo.

Em entrevista ao JPN, a empresária afirma que há um ano e meio que tem um problema de falta de trabalhadores: “Dantes, íamos ao centro de emprego e mandavam-nos candidatos. Falta mão de obra, porque agora é muito difícil. Só as pessoas de mais idade é que aparecem para trabalhar e querem ordenados milionários, porque estiveram emigrados e acham que vão chegar cá e que vão ganhar os 2 ou 3 mil euros como ganhavam lá. Mas nós não temos poder de compra para lhes pagar isso”, afirma.

Fonte: Hellen Carvajal

Isaura Santos conta que, na empresa que gere, vários dos trabalhadores têm ido embora por entrarem no processo da reforma, e que um dos melhores empregados tem 60 anos. Opina que os jovens de agora não querem este tipo de trabalhos, além disso, há uma outra parte de trabalhadores portugueses com qualificações superiores, à procura de melhores oportunidades. “Ninguém quer ser trolha agora, ou quem quer ser trolha quer ganhar mesmo ordenados de 3 e 4 mil euros”, afirma.

Por outro lado, o economista Filipe Grilo complementa: “provavelmente, grande parte destes novos desempregados são relativamente novos, mas sem formação. Existe um desemprego jovem muito alto nas pessoas só com o [ensino] secundário. São novos, não se querem sujeitar a trabalhos que a sociedade considera como menos dignos, por exemplo; e, por isso, não estão disponíveis para aceitar qualquer trabalho. Ainda por cima, são jovens, podem ficar em casa dos pais”, comenta.

Contratação de imigrantes pode ser solução

A solução que está a ponderar a empresária Isaura Santos é a contratação de imigrantes: “Se vêm para cá para a apanha dos legumes e das frutas, se calhar também podem vir para a construção civil”, atira.

Também comenta que conhece donos de outras empresas do ramo que já trouxeram trabalhadores de Peru e Equador para colmatar a falta de mão de obra.

Filipe Grilo concorda que a vinda de imigrantes também vai ser uma solução para as empresas. “Conversei ainda há pouco com dois empresários que acham que se conseguissem pessoas de fora, era para eles a melhor solução. Porque lá está: há trabalho que pelo valor que acrescenta, só são possíveis com salários baixos”, aponta Grilo.

O economista também explica que há uma solução simples para aumentar a atratividade da oferta de emprego: o aumento dos salários oferecidos. Com esta medida, as vagas seriam preenchidas. Mas, adverte, o aumento de salários não será comportável para muitas empresas.

Grilo sugere que ao longo do tempo as vagas vão ser preenchidas. “A partir de certa altura, as pessoas vão ter que arranjar trabalho, porque o subsídio de desemprego tem um limite, portanto, pode dar-se o caso de as pessoas acabarem o período do centro de emprego e serem obrigadas, pela força das circunstâncias, a aceitar esses trabalhos menos remunerados. Eu acho que as empresas estão a contar com isso”, reflete o professor de economia.

O fenómeno não é só português

Não acontece só em Portugal. A necessidade de trabalhadores existe também noutros países da Europa e de outros continentes. Já desde 2019, antes da pandemia, que a Alemanha estava a precisar de trabalhadores de fora para cobrir a necessidade interna em diversos setores da economia. Assim informa o Governo Federal da Alemanha através do seu site oficial, comunicando novas estratégias para a entrada de trabalhadores imigrantes.

Também o Governo Britânico recorreu aos imigrantes, com a liberação de mais de 10 mil vistos de emprego para fazer frente à alta temporada de natal. O comunicado do site oficial do Governo oferece empregos para várias áreas da conomia, principalmente para a área de motoristas de pesados.

Do outro lado do Atlântico, também os Estados Unidos de América experimentaram em 2021 um crescimento recorde nas vagas de emprego disponíveis depois de quase dois anos de pandemia. Uma das razões por trás da elevada oferta de empregos passa pela decisão das pessoas não voltarem para os mesmos empregos que tinham antes da pandemia ou desistirem daqueles que tinham, avaliando outras possibilidades profissionais depois de terem ficado em casa por algum tempo. Esta terça-feira, os media norte-americanos deram conta de um novo recorde neste campo: só em novembro, 4.5 milhões de norte-americanos deixaram os seus empregos, o valor mais alto dos 20 anos em que o Departamento do Trabalho recolhe esta informação.

Artigo editado por Filipa Silva

Este artigo foi realizado no âmbito da disciplina TEJ II – Online – 2.º ano.