Passado mais de um século, Fernando Pessoa continua a ser uma referência do país. Aliás, “muitos acederam à cultura portuguesa, em primeiro lugar, através de Pessoa”, lembra Rui Sousa, membro da organização da Semana de Eventos Pessoanos, que chega esta sexta-feira ao fim, em Lisboa.

No âmbito desta semana, que serve para assinalar os 135 anos sobre o nascimento do escritor, foi organizado um congresso internacional, que arrancou na quarta-feira e termina esta sexta (ver caixa). Para o evento, foram convidados poetas, romancistas, filósofos e estudiosos de diferentes contextos e geografias, com diferentes graus de especialização na obra de Pessoa, para participarem como conferencistas.

“Desde muito cedo que Pessoa despertou interesse numa série de poetas, filósofos e pensadores internacionais que foram trabalhando” a sua obra – tendo esta vindo a ser “traduzida e divulgada um pouco por todo o mundo”. “Pessoa é adotado, sobretudo, como um poeta da língua portuguesa, com uma ampla dimensão europeia e global”, diz Rui Sousa, em declarações ao JPN.

Biblioteca Nacional de Portugal João Carvalho/Wikimedia CommonsCC BY-SA 3.0

“A escolha [dos conferencistas] passou pelo interesse em trazer a Portugal uma série de especialistas, que nem sempre têm sido considerados noutros eventos dedicados a Pessoa, e expandir o horizonte da constelação pessoana, assim como, o seu impacto na Literatura portuguesa”, esclarece o responsável.

A organização é do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa (CLEPUL) em parceria com a Cátedra de Estudos Portugueses Fernando Pessoa (Universidad de los Andes).

Congresso ‘Variações de Fernando Pessoa’
Programa de sexta-feira (16)
10h30-12h00
Homenagem a Cleonice Berardinelli
“O Pessoa que Dona Cleonice divulgou no Brasil”
Ida Alves
ʺO esforço é grande e o homem é pequenoʺ: Cleonice Berardinelli e a gênese dos estudos pessoanos no Brasil
Rodrigo Xavier
Uma voz, muitas vozes
Sofia de Sousa Silva

14h00-15h45
Eugénio e Sophia na senda de Pessoa
Federico Bertolazzi
Eugénio de Andrade e Fernando Pessoa: reflexões sobre o “duro ofício da poesia”
Raquel S. M. Souza
ʺEu também queria ser um major aposentadoʺ: notas sobre uma paródia francesa de Fernando Pessoa
Caio Gagliardi

16h00-17h45
A recepção da obra de Fernando Pessoa em João Varela
Agnès Parmentier
Louvor e simplificação de Fernando Pessoa em Adília Lopes
Pedro Eiras
Tiago Veiga – Filho Espiritual de Álvaro de Campos ou do Infinito Heteronímico
José Vieira

18h00-19h00
Uma Recepção Quase Incompleta. Alberto Pimenta e Fernando Pessoa
Maria Irene Ramalho

Atualmente, por já existirem décadas de reflexão e vários estudos, a obra pessoana é vista numa perspetiva mais crítica e trabalhada. Isto leva à existência de diversas teorias e propostas de interpretação dos diferentes autores que tiveram a necessidade de “dialogar com a obra”.

Rui Sousa defende que o “século XXI trouxe, através de novos editores, um conhecimento sobre a obra de Pessoa que antes não existia, muito mais sistemático, com uma organização editorial diferente”.  Além disso, é da opinião de que é esta ampliação do conhecimento, comunicação da obra e da figura pessoana em diversos contextos que permite que nos continuemos a interessar pelo poeta.

Após um legado de 135 anos, ainda existem muitas vertentes e facetas do escritor que não são completamente conhecidas. Continuam a ser descobertos diversos documentos e cartas do poeta que permanecem inéditos e que ajudam a perceber melhor a sua visão do mundo. No entanto, “há todo um caminho ainda por fazer”, remata o organizador.

Homenagem a Cleonice Berardinelli

Pelo congresso já passaram nomes como o do português Paulo de Medeiros, que falou sobre ler Pessoa e ler Ana Luísa Amaral – poetisa e professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto que faleceu em agosto passado; ou de Ana Ilievska, da Universidade de Stanford, que fechou o primeiro dia a falar do ChatGPT, Fernando Pessoa, a inteligência artificial e a fragmentação do pensamento.

Esta sexta-feira há ainda várias mesas para acompanhar. A abrir, pela manhã, uma homenagem a Cleonice Berardinelli, tida como uma divulgadora fundamental de Fernando Pessoa no Brasil. A investigadora carioca, que faleceu este ano aos 106 anos, foi a autora da primeira tese no país – apenas a segunda no mundo – sobre o escritor português. Diz o jornal brasileiro “O Globo”, por altura da sua morte, que “sem ela a história de Fernando Pessoa no Brasil seria muito diferente”.

O encerramento do congresso cabe a Maria Irene Ramalho que vai falar sobre o poeta e ensaísta Alberto Pimenta e Fernando Pessoa.

Nascido a 13 de junho de 1888, em Lisboa, Fernando Pessoa é tido como o mais proeminente poeta português no mundo e como uma figura central do modernismo português. Depois de passar alguns anos da adolescência e juventude em Durban, na África do Sul, regressou a Portugal em 1905. São marcantes na sua obra os muitos heterónimos que criou – na biografia do escritor, Richard Zenith diz que foram 47 -, sendo destes mais conhecidos Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Morreu em Lisboa em 1935.

Editado por Ângela Rodrigues Pereira e Filipa Silva