“Não Sou Nada” (em inglês, “The Nothingness Club”) é o novo “cinenigma” sobre Fernando Pessoa, da autoria de Edgar Pêra. Com chegada aos cinemas portugueses prevista para 28 de outubro, a trama desenvolve-se em torno de um convívio entre ortónimo e heterónimos – tanto os que todos conhecem como aqueles que acabam por passar fora do radar.

“O objetivo em si, neste caso, é dar a conhecer aquele que é, para mim, o mais complexo artista de palavras que alguma vez li“, diz Edgar Pêra ao JPN. De facto, o ícone da literatura portuguesa acompanhou-o desde a adolescência. Nesse sentido, quando começou a carreira em cinema, ia “citando e às vezes [até] fazendo filmes inteiros baseados na obra dele”.  Mais tarde, surgiu a vontade de tecer uma narrativa apenas em torno da própria figura e das suas múltiplas personalidades. 

Num mundo alternativo, onde realidade choca com ficção, o realizador tentou “concretizar alguns dos sonhos de Pessoa”.  Desta forma, materializa as várias facetas no mesmo escritório, que nomeou de “The Nothingness Club” (em português “o Clube do Nada”).

“Todas as minhas leituras de Pessoa concluíram neste filme”, reitera. Foi também por isso que este se tornou o trabalho com a preparação mais demorada – porque começou a partir do primeiro contacto que Edgar Pêra teve com o autor.

Mas apesar de incluir notas e análises do realizador, a narrativa tem uma forte influência da escrita pessoana, em si – aliás, 90% das falas dos atores são da autoria do escritor. O foco não eram os argumentistas, diz Edgar Pêra, já que a única maneira de “pôr os “Pessoas” a falar, é com aquilo que Pessoa escreveu”. Ao mesmo tempo, procurou que “nenhuma dessas falas fosse entendida como uma leitura de poemas”, mas antes como um diálogo fluído.

Através do filme, tentou traduzir “em emoções algo que muitas vezes é só remetido para o nível racional”, partilha. As filmagens iniciaram-se em 2020, no entanto a ideia já vinha a ser desenvolvida deste 2014. Por causa da covid-19, os desafios enfrentados foram muitos e o guião, por si, acabou por se tornar um “resultado daquilo que foi a pandemia”, conta o realizador.

O local das gravações também foi um fator determinante. Inicialmente, o espaço idealizado consistia num edifício com a forma da cabeça de Fernando Pessoa. Mas quando o produtor Rodrigo Areias lhe mostrou a Fábrica do Rio Vizela, em Santo Tirso, Edgar Pêra sentiu que “os escritórios eram os ideais para o Clube do Nada”, reescrevendo tudo em função daquele espaço. Acabou também por reescrever o guião, adaptando-o “àquela zona – não só aos escritórios, como à zona circundante”.

No elenco constam, de uma extensa lista, nomes como Miguel Borges (no papel de Fernando pessoa), Albano Jerónimo (como Álvaro de Campos), Vítor Correia (Ricardo Reis), Miguel Nunes (Alberto Caeiro) ou Paulo Pires (Barão de Teive).

Apoiada pelo Ministério da Cultura, a fita foi produzida com a ambição de se tornar património para o futuro – uma preocupação presente durante todo o processo de criação e materialização do universo pessoano. Em retrospetiva, Edgar Pêra acredita ter elaborado “um filme à altura dos requisitos de relevância artística”.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira