Cristiano Correia, dirigente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), considera que o Governo tem sido alertado "há muito tempo" para mal-estar que se vive entre as forças policiais e adverte que o "tom" usado pelo ministro da Administração Interna na conferência de imprensa que deu no domingo "em nada abona para o clima de paz e de tranquilidade" desejados.
“Há muito tempo que os sindicatos e os polícias têm vindo a alertar que a polícia estava a enveredar por um caminho muito difícil”. É por isso que, Cristiano Correia, dirigente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), insta o Governo a olhar “com atenção ao que se vive no seio das forças de segurança”. Na sequência das grandes manifestações de polícias ocorridas há cerca de uma semana em Lisboa e no Porto e dos jogos de futebol que ficaram por realizar no fim de semana, o sindicalista reforça que “era necessário ouvir as reivindicações dos polícias para serem dadas respostas a situações como a dignificação da carreira, através das questões salariais, e também as condições de trabalho”, afirmou em declarações ao JPN.
No domingo, o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, anunciou a abertura de dois inquéritos. Um deles relativo “aos acontecimentos que respeitam ao policiamento, pela PSP, do jogo Famalicão-Sporting, da Primeira Liga de futebol, em especial dos que se reportam a generalizadas e súbitas baixas médicas apresentadas por polícias” com um carácter “urgente”. O segundo diz respeito às “declarações de um responsável sindical relativas à atividade da PSP no contexto dos próximos atos eleitorais, nomeadamente a possibilidade de estar em causa o transporte de urnas de votos.” Além disso, também a Direção Nacional da PSP abriu uma averiguação relativa aos acontecimentos deste sábado, no jogo Famalicão-Sporting.
Durante a tarde de sábado, 13 dos 15 agentes da PSP que estavam destacados para o jogo da Primeira Liga comunicaram baixas médicas. O encontro acabou por ser adiado e registaram-se confrontos entre adeptos no exterior do estádio, que originaram seis feridos. Os jogos Leixões-Nacional, Feirense-Académico de Viseu e “um ou outro jogo de escalões secundários“, informou Cristiano Correia, também foram adiados.
Ainda assim, o dirigente da ASPP/PSP confessa-se surpreendido pela decisão do ministro. A organização sindical esperava que a tutela chamasse “primeiro os sindicatos” para chegarem “a alguma conclusão pacífica para todos”. A opção de chamar “os dirigentes máximos de cada polícia, neste caso, o diretor nacional da PSP e o comandante geral da GNR, para uma reunião de emergência, a um domingo de manhã”, não caiu bem junto dos profissionais.
Acrescentou ainda que o discurso na conferência de imprensa que se seguiu à reunião foi feito “num tom e de um modo que foram sentidos como ameaçadores para os próprios polícias. Isto, em nada abona para o clima de paz e de tranquilidade que deve imperar no país e nas forças de segurança”, afirmou.
Em entrevista à SIC Notícias, e após a conferência de imprensa que se seguiu à reunião, José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna, frisou que qualquer “manifestação de indisciplina e insubordinação deve ser imediatamente participada para ser objeto de avaliação e de procedimento disciplinar”.
Polícias exigem igualdade entre as forças policiais
A mais recente vaga de protestos dos polícias tem origem numa decisão tomada pelo Conselho de Ministros, a 29 de novembro, de aumentar o suplemento de missão dos profissionais da Polícia Judiciária com um acréscimo que, em determinadas situações, pode rondar os 664 euros. As restantes forças de segurança não foram incluídas, sendo que, nestes casos, o suplemento de risco não ultrapassa os 360 euros.
Nessa altura, foi lançada uma petição online pelo Sindicato Nacional de Oficiais da Polícia que exigia suplementos iguais aos da Judiciária para a PSP, a GNR e o corpo da guarda prisional. Em 48 horas, foram recolhidas quase 15 mil assinaturas.
Já durante o mês de dezembro, os sindicatos da PSP e associações da GNR uniram-se para uma série de protestos e, em janeiro, praticamente todas as viaturas policiais estiveram paradas nas grandes cidades do país.
Já no final do mês de janeiro, as reivindicações dos polícias tiveram “um grande reflexo nas duas grandes manifestações no dia 24 e 31, em Lisboa e no Porto, respetivamente”.
No Porto, foram mais de 20 mil polícias que saíram à rua. A manifestação foi organizada pela plataforma de sindicatos da PSP e associações da GNR. A multidão ocupou metade da avenida na baixa portuense, num percurso que se estendeu da Rua 31 de Janeiro até aos Aliados. No local, estiveram também presentes os representantes dos guardas prisionais, trajados de negro e com a palavra “abandonados” nas costas. Esta foi considerada “uma das maiores manifestações das forças de segurança de sempre”.
A manifestação ficou ainda marcada pela presença do bispo do Porto, D. Manuel Linda, que agradeceu às forças de segurança o papel que tiveram nas Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ), ocorridas em Lisboa no verão passado.
Na sequência das manifestações, e numa carta enviada a António Costa a 2 de fevereiro, a plataforma que congrega sindicatos e associações das forças de segurança, alertou para a “situação-limite” dos profissionais e para um eventual “extremar de posições”, que pode vir a afetar várias tarefas dos polícias, assim como a entrega de exames nacionais nas escolas, o controlo de fronteiras ou o policiamento de grandes eventos.
Editado por Filipa Silva