Num jogo morno com um golaço no apagar das luzes, Porto vence Arsenal em jogo com grande atuação defensiva. Os dragões vão a Londres com vantagem de um golo no marcador e a oportunidade de avançar aos quartos de final da Liga dos Campeões.
O FC Porto venceu o Arsenal nesta quarta-feira (20) na primeira mão dos oitavos de final da Liga dos Campeões. Os dragões fizeram uma boa partida, na qual não permitiram que os gunners se infiltrassem na sua organização defensiva. O único golo da partida chegou já nos descontos, com remate de fora da área de Galeno. O confronto foi o sétimo entre as equipas e foi a primeira aparição do Arsenal nos oitavos da Liga dos Campeões desde 2017.
A redenção de Galeno
O primeiro tempo foi muito morno, mas começou com intensidade. Logo no primeiro minuto de jogo, Declan Rice, médio defensivo em destaque na temporada dos gunners, fez uma entrada dura sobre Wenderson Galeno, após este receber uma bola difícil de dominar. O inglês recebeu o cartão amarelo.
Aos 10 minutos, a defesa do Porto lançou uma bola longa no espaço por trás da defesa do Arsenal, mas o guarda-redes espanhol David Raya chegou antes de Galeno, que levava clara vantagem sobre o lateral direito do Arsenal, Ben White. Aos 15 minutos, a equipa inglesa tinha aproximadamente 75% da posse de bola.
Já aos 21 minutos, Alan Varela quebrou a primeira linha de pressão dos gunners com um belo passe para Pepê, que por sua vez carregou a bola até ao último terço do terreno. Lá, Francisco Conceição recebeu a bola na direita e cruzou-a de volta para Pepê, que viu o seu remate bloqueado na pequena área. Na recarga, Galeno fez um primeiro remate no poste direito e, em seguida, perdeu uma oportunidade incrível de abrir o marcador frente a um guarda-redes que viu com alívio a bola sair à esquerda de sua meta. No Estádio do Dragão, ouviu-se momentaneamente o grito de êxtase dos adeptos que pensaram que a bola tinha entrado, seguido de murmúrios de incredulidade.
Treze minutos depois, Saka partiu com a bola numa jogada individual pela direita e cruzou em direção à grande área. Contudo, a bola desviou na defesa e bateu na parte da trave. No canto, William Saliba subiu supremo diante de uma defesa desorganizada dos dragões, mas cabeceou à direita do poste de Diogo Costa e com muitas reclamações dos jogadores do FC Porto, que pediaram falta.
O primeiro tempo terminou com a bola a pertencer predominantemente ao Arsenal, mas a equipa inglesa não conseguiu fazer muito com a bola nos pés. Os dragões tiveram as melhores chances na primeira metade.
Na segunda parte, o jogo foi muito mais aberto e com muito mais intensidade por parte dos dragões. O FC Porto subiu mais ao ataque, com Francisco Conceição e Pepê mais participativos na transição. Contudo, a primeira oportunidade clara de golo foi dos gunners, num remate de Leandro Trossard. O avançado belga desperdiçou um remate sem oposição na grande área depois de receber a bola na sequência de um pontapé de canto.
A partir dos 60 minutos, o FC Porto começou a empurrar o Arsenal para o seu campo defensivo com a ajuda dos adeptos. o seu potencial na transição, a qualidade com que pararam qualquer movimento ofensivo dos gunners e a performance dos adeptos portistas nas bancadas fizeram com que os ingleses deixassem de fazer questão da posse de bola. Essa pressão quase resultou num golo aos 67 minutos após grande jogada individual de Pepê, mas Evanilson teve seu remate bloqueado em frente à pequena área. No canto que se seguiu, Francisco Conceição raspou na bola que havia sido desviada pela defesa londrina.
Contudo, mesmo com o empenho dos jogadores e dos adeptos, o jogo esfriou. Até ao fim do tempo regulamentar, não houve qualquer momento de perigo real. Pode dizer-se seguramente que as melhores oportunidades foram dos dragões, assim como as melhores performances. Alan Varela, Wendell e João Mário fizeram jogos incríveis.
Entretanto, já ao apagar das luzes, o Estádio do Dragão viu um momento de genialidade dar a vitória ao FC Porto. O Arsenal, que parecia ter jogado para o empate desde o início da partida, tentou lançar-se no contra-ataque, mas, após um péssimo passe de Gabriel Martinelli, Otávio fez a bola chegar a Galeno que avançou em direção à área do Arsenal e rematou colocado de fora da área. Redenção.
A bola entrou à esquerda do guarda-redes David Raya, que estava adiantado. Galeno redimiu-se das duas oportunidades seguidas perdidas no primeiro tempo e puniu um Arsenal complacente que só pôde render-se à superioridade do FC Porto no Estádio do Dragão, que, como de costume, entrou em erupção após o golo. Os dragões vão a Londres com vantagem de um golo, e desta vez “basta” defender a baliza sem sofrer golos para avançar rumo aos quartos de final.
Este foi o primeiro jogo em que o Arsenal não teve um remate à baliza nos últimos dois anos. Foi a primeira vez que o Arsenal deixou de rematar à baliza na Liga dos Campeões desde 2011.
Embora esta tenha sido a quinta derrota seguida dos gunners em jogos a eliminar na competição, o FC Porto nunca venceu em Inglaterra em 21 partidas, 18 das quais foram derrotas. Contudo, os dragões qualificaram-se em 82% das vezes que venceram na primeira mão de um jogo em eliminatórias nas competições europeias.
Dragões não sofreram perigo dos gunners
Em geral, a partida não foi só morna por falta de proatividade de ambos os clubes, mas também pela administração do tempo pela equipa de arbitragem. Segundo a Opta, a bola esteve em jogo durante apenas 51,7% do tempo de jogo nesta quarta-feira, uma média baixíssima. Ou seja, a letargia não estava apenas na proposta das equipas, mas na forma com que Serdar Gözübüyük apitou a partida.
Quanto à forma das equipas jogarem, nada foi muito diferente do esperado. O FC Porto usou o mesmo 4-2-3-1 que havia usado nos últimos jogos, com Pepê centralizado e Francisco Conceição a ocupar a ala direita. Contudo, sem a bola, os dragões tomaram a forma de um 4-4-2, com Evanilson a pressionar o jogador com a bola, enquanto Francisco Conceição ou Galeno pressionavam a primeira opção de passe progressiva, dependendo do lado do campo em que a bola se encontrava. Diferente do que se esperava, o FC Porto jogou com um bloco médio, o que dificultou a penetração de Martinelli e Saka nos meio-espaços e forçou o Arsenal a ser menos construtivo ao tentar criar jogadas. Muitas vezes foi tentada a ligação direta aos extremos, mas sem sucesso, dado o excelente empenho defensivo dos laterais dos dragões.
Já o Arsenal jogou de forma habitual. Com a bola e uma linha alta, alternava entre um 3-2-3-2, com Kiwior ocupando a esquerda na linha defensiva de três e White invertendo para o meio-campo, e um 4-2-4, com Ødegaard a descer para a defesa e ajudar mais na saída de bola. Kai Havertz, que foi opção no lugar de Jorginho, praticamente não participou da saída de bola, mas ao menos participou mais que Trossard, que tocou na bola apenas 22 vezes em toda a partida. A pressão do Arsenal era alta e intensa num 4-4-2, com Trossard e Ødegaard a subir na tentativa de sufocar as opções de passe.
O Arsenal nunca ofereceu perigo real aos dragões, embora tivesse 65% da posse de bola. Os portistas fecharam-se bem, limitaram os espaços dos quatro jogadores mais avançados do Arsenal (Martinelli, Havertz, Trossard e Saka) e foram uma ameaça na transição. Varela e João Mário em especial tiveram atuações fantásticas. Varela ofereceu imensa segurança aos dragões, mesmo com a forte pressão dos gunners. Foi confiável durante a posse de bola e foi crucial defensivamente. Já João Mário anulou completamente o flanco esquerdo londrino, talvez a sua área de maior força na competição até agora. Gabriel Martinelli participou diretamente de golos ao marcar ou dar assistência em todos os jogos da fase de grupos desta época, mas não conseguiu vencer o duelo contra o lateral direito português, que foi o jogador que mais teve acções defensivas de sucesso no jogo.
Tendo em conta a sua dificuldade de penetrar nos espaços que queria, o Arsenal colocou o foco nas bolas paradas, estratégia que é o ponto forte dos gunners. E, de facto, as melhores chances vieram com as bolas paradas. Segundo o SofaScore, o Arsenal teve 0.36 xG (golos esperados) nas suas jogadas de bola parada, sendo que em todo o jogo teve 0.49 xG. Ou seja, 73% dos golos esperados do Arsenal vieram com a bola parada. Na antevisão do jogo, o JPN alertou sobre a dependência do Arsenal neste tipo de jogada e sobre a carência de qualidade na criação e conversão de chances com a bola a rolar.
Neste jogo, a proficiência do clube inglês nas cobranças de faltas e cantos foi insuficiente. Diogo Costa reinou soberano na maior parte das cobranças e, no restante, ou o Arsenal cometeu infrações durante a movimentação na grande área, ou os jogadores da equipa londrina desperdiçaram as suas chances. Em última análise, o Arsenal não teve criatividade suficiente para sequer criar oportunidades que fossem concretizadas. Até tentou mudar os seus padrões de saída de bola durante o jogo com o capitão a descer mais para receber a bola, mas com Saka e Martinelli forçados a fornecerem a única amplitude do sistema e o bloco defensivo médio do FC Porto a limitar os espaços nos quais os jogadores de ataque poderiam circular, os gunners foram sinónimo de impotência. A sua ineficácia foi tanta que sequer conseguiram um remate à baliza adversária.
Já o FC Porto não teve muito com o que trabalhar em termos de criatividade. Teve pouca posse de bola, e a maior parte dos seus ataques foram diretos e com foco na transição. No primeiro tempo, as diagonais para Galeno foram o recurso ofensivo mais utilizado pelos dragões. O extremo luso-brasileiro ganhava e com facilidade a Ben White na velocidade, mas o posicionamento do inglês era quase sempre impecável e, quando não era, tinha sempre a cobertura de Saliba ou Raya.
No segundo tempo, criaram-se mais padrões de transição que envolviam mais Pepê e Francisco Conceição. Ambos foram os maiores responsáveis pela progressão da bola pela equipa da casa, e embora não estivessem particularmente sincronizados, e tenham perdido muitas vezes a oportunidade de fazer combinações de sucesso, ainda fizeram muitos estragos no lado direito.
Na profundidade do lado direito, o FC Porto encontrou a sua zona de conforto. Embora não tenha conseguido marcar um golo com jogadas a partir deste corredor, foram de lá que saíram todos os seus passes-chave. Ao roubar a bola na construção da jogada do Arsenal, o FC Porto conseguiu apanhar uma defesa muito adiantada e desorganizada no contra-ataque. As transições seriam sempre a aposta do FC Porto para uma partida difícil como esta e elas quase deram bons frutos.
O golo de Galeno veio já nos últimos segundos, mas foi reflexo de uma equipa que se esforçou muito mais do que a adversária e que, mesmos nos minutos finais, não desistiu. Foi um retrato completamente diferente da equipa visitante, que pareceu letárgica e desinteressada em defender o esforço dos dragões.
Sérgio Conceição: “Eles quiseram jogar, nós quisemos ganhar”
Para o técnico do FC Porto, os seus jogadores tiveram de ser “quase perfeitos”. Sérgio Conceição deu destaque à preparação para enfrentar a qualidade do Arsenal na bola parada e, em seguida, exaltou a adesão dos jogadores à sua metodologia: “Interpretamos muito bem a estratégia definida, bloqueando a primeira ligação ao Rice, depois, numa segunda fase de construção, sobre o Havertz e o Ødegaard, que caíam nas meias e nos espaços entre linhas, nós não permitimos muito isso.” O treinador também discordou da visão de Arteta ao considerar o seu bloco um “bloco médio”.
Quando questionado sobre a declaração de Arteta sobre o estilo de jogo supostamente mais defensivo dos dragões, Conceição disse que “é uma visão, uma opinião”, mas imediatamente contrariou: “eles quiseram jogar, nós quisemos ganhar.”
No fim da conferência, o treinador do FC Porto falou sobre a questão da posse de bola no jogo. “A posse de bola tem a ver com aquilo que se faz com ela. Nós temos a pose de bola mais ligada. Tem que ver o que é que se faz com ela dentro da estratégia definida para fazer golos. A posse de bola serve para isso”.
Arteta: “És punido na Liga dos Campeões. Se não venceres, não podes perder”
O treinador do Arsenal, Mikel Arteta, não escondeu a sua deceção com a equipa. Numa conferência de imprensa de poucas perguntas e curtas respostas, o espanhol disse que ficou “muito dececionado” com a forma como a equipa entregou o jogo no fim e como não conseguiu administrar a situação bem o suficiente: “És punido na Liga dos Campeões. Se não venceres, não podes perder.” Arteta disse que o Arsenal dominou o jogo, mas que lhe “faltou objetividade, especialmente no primeiro tempo”, quando tiveram “mais agressividade para quebrar as linhas, jogar para frente e gerar mais ameaça na linha de defesa”. “Vamos aprender com os nossos erros”, disse o treinador.
Para Arteta, o Arsenal também precisa de melhorar o seu desempenho contra blocos mais baixos. “É nesta área que precisamos de melhorar. Precisamos de derrotar uma equipa que se defende de forma tão fechada e com um bloco tão baixo que não tem a intenção de jogar. É o que é”, afirmou.
O próximo confronto entre as duas equipas será no dia 12 de março, às 20h00. O FC Porto voltará ao relvado no próximo domingo (25) para enfrentar o Gil Vicente em Barcelos para a Primeira Liga. Já o próximo jogo do Arsenal será no sábado (24) contra o Newcastle, no Emirates Stadium.
Editado por Filipa Silva