As mulheres têm recorrido menos à pílula do dia seguinte desde Julho do ano passado, altura em que foi despenalizada a interrupção voluntária da gravidez. De acordo com dados da consultora IMS Health, no último semestre de 2007 venderam-se menos sete mil embalagens do fármaco de emergência do que em 2006, o que indica que, pela primeira vez em Portugal, o consumo de pílula do dia seguinte diminuiu, contrariando a tendência dos últimos quatro anos.

Entre Janeiro e Julho de 2007 venderam-se 106.862 caixas. Por outro lado, entre Julho e Dezembro o número desceu para 99.846, uma descida de 7%, de acordo com os números da IMS Health.

Segundo o médico psiquiatra Luís Marques, fundador da Associação de Defesa e Apoio da Vida (ADAV) em Coimbra, pode não existir uma relação de causa-efeito entre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez e a diminuição do consumo da pílula do dia seguinte, uma vez que “quem acha que não tem condições para manter a gravidez toma primeiro a pílula do dia seguinte e depois, se esta falhar, procura o aborto”. “Estas duas abordagens não são mutuamente exclusivas. São exemplos da mesma mentalidade, passíveis de uso em momentos diferentes”, afirma o clínico em declarações ao JPN.

O médico refere também que estudos realizados noutros países indicam que “as mulheres que usam a pílula do dia seguinte são aquelas que maior probabilidade têm de vir a fazer um aborto”.

Descida insignificante

Sara Ferreira, interna da associação Médicos Pela Escolha afirma que “o facto de o aborto ter sido despenalizado pode fazer com que as mulheres não tenham medo de falar com os médicos”, o que em parte pode explicar o decréscimo da venda da pílula. No entanto, “a descida é muito pequena” para serem retiradas conclusões.

Joana Almeida, psicóloga e terapeuta sexual, também da associação Médicos Pela Escolha diz que não é possível determinar em concreto as causas da diminuição do consumo da pílula do dia seguinte, uma vez que pela “diminuição da venda de caixas não se pode dizer se houve uma diminuição do uso”, já que os dados numéricos não permitem “falar de muitos comportamentos de muitas pessoas”. Para a psicóloga “seria preciso analisar caso a caso”.

Em declarações ao JPN, a psicóloga refere, ainda, que no ano passado “fez-se muito alarido” por se achar que existe um consumo muito elevado de pílula do dia seguinte, mas que há “poucos estudos e os que há não são representativos de toda a população”. Além disso, diz Joana Almeida, Portugal não tem “uma educação sexual implementada nas escolas” e que, para muitos, a “sexualidade é ainda um tabu”.

Apenas como emergência

Sara Ferreira sublinha que a pílula do dia seguinte deve apenas ser utilizada “em caso de emergência”. “Não deve ser utilizada todas as vezes que as pessoas têm relações sexuais não protegidas”, uma vez que o uso abusivo “aumenta o risco de vasoconstrição e de cancro da mama”. A interna dos Médicos Pela Escolha salienta ainda que “uma pílula do dia seguinte equivale a 15 normais”.

“No geral, as pessoas não estão bem informadas. Tem de haver um esforço combinado e conjunto” porque há “vários mal-entendidos, falhas de informação”, explica Sara Ferreira.

Luís Marques diz que é “sempre possível melhorar a informação e a formação das pessoas” e que “as mulheres precisam de conhecer as alternativas de apoio à gravidez, de receber o acompanhamento e o aconselhamento que lhes permita superar as dificuldades que enfrentam, precisam de saber que existem soluções para os seus problemas”.