Antes de os convidados começarem a abordar o tema da conferência “Vozes do Silêncio”, que, desta vez, foi dedicada ao tema “A comunicação social e os sem-abrigo”, o bispo do Porto, António Francisco dos Santos, afirmou que, quanto ao problema da igualdade e dos sem-abrigo na cidade do Porto, “mais importante do que ganhar a maratona, é garantir que todos podemos cortar a meta”.

A plateia pôde, depois, assistir a um excerto do filme “As Vozes do Silêncio”, que está a ser realizado por Christophe Bisson e que incide sobre os sem-abrigo na cidade do Porto. A mesa “A comunicação social e os sem-abrigo”, moderada por Paula França, coordenadora do Núcleo de Planeamento e Implementação nos Sem-Abrigo (NPISA) do Porto, incluía Ana Cristina Pereira, jornalista do Público, bem como Nuno Serrano e Luísa Teixeira, ambos da Comissão “Uma Vida Como a Arte”.

“Maior que tudo é a importância/De passar a mensagem a quem resiste”

Nuno Serrano foi o primeiro a intervir, utilizando um poema escrito por Celina Silva para começar a sua intervenção, realçando, depois, que é necessário mudar a maneira como os sem-abrigo são retratados na comunicação social.

“Interessa-nos contrariar a imagem dos pedintes, dos que cheiram mal, dos miseráveis, dos coitadinhos”, explicou, referindo que prefere “promover uma imagem de pessoas com dificuldade, mas com a dignidade que merecem”.

A arte também esteve presente

No final da conferência, houve espaço para o Bloco de Arte que acompanha as “Vozes do Silêncio”. A plateia pôde assistir a declamações de poemas, bem como atuações musicais, desde o piano ao fado.

Ana Cristina Pereira defende que não depende apenas da comunicação social a responsabilidade de uma aproximação entre os media e as instituições que apoiam os sem-abrigo. “Muitas vezes, os jornalistas querem dar voz e não podem. Não é só uma falta de tempo nem de sensibilidade, é que pura e simplesmente não há acesso”, explicou a jornalista do Público, dizendo que é preciso que “as próprias pessoas vão à procura da possibilidade de dizerem o que pensam”, daí ser “muito importante” um encontro como o “Vozes do Silêncio”.

“As organizações não governamentais e as organizações governamentais também têm de perceber mais esta história da importância da voz”, afirmou Ana Cristina Pereira, que também explicou, contudo, que, “por vezes, há falta de sensibilidade” por parte dos jornalistas, que acabam por privilegiar fontes oficiais em detrimento de outras fontes, mesmo que também sejam uma parte da história.

“A obrigação ética de todos os jornalistas é darem voz a todas as pessoas na história em que estejam a trabalhar”, referiu.

Luísa Teixeira, da comissão “Uma Vida Como A Arte”, serviu-se de um texto de Noé Alves sobre os sem-abrigo e a comunicação social, acusando-a de “procurar casos extremos para vender jornais e informação”, além de se aproveitarem “da baixa autoestima de alguns dos entrevistados”, que “só conseguem lamentar-se”.

“A comunicação social não deve explorar o choque”, escreveu Noé Alves, lido por Luísa Teixeira, que mais tarde afirmou que não ia baixar os braços, e, muito menos, deixar que outros “desistissem da luta” contra a própria situação, porque tem visto “melhorias” que pretende que abranjam mais sem-abrigo.

Plataforma + Emprego já empregou cinco sem-abrigo

Jorge Mayer apresentou a Plataforma + Emprego, ligada ao NPISA do Porto, que pretende prestar apoio aos sem-abrigo na hora de arranjar emprego, através da requalificação de cada um através de um processo de acompanhamento e de contacto com empresas, para que não exista uma “diferenciação” entre um sem-abrigo e qualquer outro candidato a uma vaga de emprego.

Jorge Mayer referiu o sucesso da iniciativa, que já empregou cinco pessoas, estando outras 25 já na bolsa de trabalhadores. “O nosso objetivo é aproximá-los do emprego”, explicou Jorge Mayer, utilizando, também, os apoios do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), nomeadamente a comparticipação de 60% do salário, “para que estes cidadãos possam ser reintegrados e o Estado possa investir o dinheiro noutros locais”.

Maria do Carmo e José Pinto são dois dos cinco sem-abrigo empregados pela plataforma e realçaram a alegria de voltarem a estar entregados num meio profissional. “Voltei a sentir-me útil”, afirmou Maria do Carmo.