O dia da proclamação do novo rei de Espanha, Filipe VI, vive-se na ressaca da precoce eliminação da seleção espanhola do Mundial, que, ao contrário do país, parece não ter rei, nem rumo. Depois da humilhação perante a Holanda, na jornada inaugural do Campeonato do Mundo, por 5-1, a Roja voltou a ceder, desta vez diante do Chile. Com uma derrota por 2-0 – que não foi surpresa perante o que se passou na partida -, a seleção orientada por Vicente Del Bosque tombou pela segunda vez em duas partidas e tornou-se na primeira campeã em título a dizer adeus à competição ao cabo de duas jornadas.
O país que dominou de forma avassaladora o futebol mundial nos últimos seis anos tem, na partida com a Austrália, a única forma de sair da competição com uma réstia de dignidade, uma vez que, em caso de derrota, se tornará na primeira campeã em título a cair na fase de grupos com três desaires.
A Espanha confirma, assim, um fim de ciclo que já vinha apresentando alguns sintomas. Depois da esclarecedora derrota na Taça das Confederações perante o Brasil – 3-0 – várias vozes se levantaram quanto a um possível fim da era “tiki-taka”. A desastrosa participação na Copa do Brasil vem confirmar o diagnóstico: a Roja precisa urgentemente de renovação.
Felipe VI
Felipe VI sucedeu ao pai, Juan Carlos I, que abdicou após 39 anos de reinado. Com 46 anos, Felipe toma as rédeas de uma monarquia em decadência e que enfrenta tempos difíceis.
Apenas por outras duas vezes, no formato atual do Mundial, a campeã em título não foi além da fase de grupos
É preciso recuarmos até 2002 – ano de más memórias para Portugal – para encontrarmos um outro campeão em título que não foi além da primeira fase. Depois de vencer o Mundial de 98 a jogar em casa, a França apresentou-se na edição da Coreia/Japão como uma das principais favoritas à vitória final. Mas desde a primeira jornada ficou vísivel que a seleção gaulesa estava destinada ao fracasso.
Os bleus entraram com o pé esquerdo na “Copa”, ao serem derrotados, com alguma surpresa, por 1-0, pelo Senegal. Seguiu-se um empate sem golos com o Uruguai, que mantinha a França na luta pelos oitavos, mas apenas matematicamente. Realisticamente, a tarefa gaulesa era complicada. Precisava de uma derrota do Senegal, de recuperar três golos à seleção africana e vencer, obrigatoriamente, a última partida. O Senegal empatou 3-3 com o Uruguai e selou o apuramento para os oitavos. Quanto à França, perdeu 2-0 com a Dinamarca e terminou na última posição do grupo com apenas um ponto.
A Itália, campeã do Mundo na Alemanha em 2006, chegou à África do Sul, mais uma vez, como uma das principais seleções a ter em conta, ainda que não estivesse na linha da frente à vitória final. Mas em 2010 desiludiu. No grupo F, juntamente com três seleções bastante acessíveis – Paraguai, Eslováquia e Nova Zelândia -, a Itália somou dois pontos e terminou no último posto, com dois empates e uma derrota.
Apenas por uma vez a Espanha sofreu mais golos num Mundial
A viagem espanhola para o Brasil toma contornos mais drásticos e preocupantes se analisarmos e olharmos ao que a Roja fez no plano defensivo. Os cinco golos sofridos contra a Holanda e os dois contra o Chile fazem já desta participação da Espanha a segunda pior de sempre no que toca a golos concedidos. Apenas em 1950, a seleção espanhola concedeu mais golos num Mundial, ao sofrer 12…ao cabo de seis jogos.
Na edição de 2014 leva sete em duas jornadas, mais do que nos dois últimos Campeonatos do Mundo juntos. Em 2010, conquistou o troféu com apenas dois golos concedidos ao longo de toda a competição, enquanto em 2006 foi eliminado nos oitavos-de-final pela França e disse adeus ao torneio com quatro golos adversários, na totalidade.
A “Squadra Azzurra” ficou, inclusive, atrás da Nova Zelândia, que participava apenas pela segunda vez num Campeonato do Mundo. Os transalpinos entraram na última partida no segundo lugar do grupo, com dois pontos, e disputaram a passagem aos oitavos-de-final no último encontro com a Eslováquia. A seleção de Leste europeu surpreendeu e venceu a Itália por 3-2, que disse adeus ao Mundial com uma prestação para não recordar.
Itália em 50 e Brasil em 66 também caíram na fase de grupos
O Campeonato do Mundo de 1950 marcou o regresso da competição, 12 anos após a última edição. Depois da “Copa” de 1938, realizada em França, o início da II Guerra Mundial levou ao cancelamento das edições de 42 e 46. A Itália, vencedora em 1938, chegou ao Campeonato do Mundo de 1950 como uma das favoritas, mas viu-se prejudicada pelas desistências que marcaram este Mundial.
A Turquia e a Escócia recusaram-se a participar, pelo que a FIFA convidou Portugal e França a preencher as vagas por ocupar. Portugal recusou, mas a França aceitou. Depois do sorteio, os gauleses e a Índia desistiram da participação, fazendo com que, em vez de 16 equipas, o Mundial de 1950 tivesse apenas 13. Um dos grupos contou com três equipas e outro com duas, ao invés dos restantes dois, com quatro. A Itália ficou no grupo de três seleções, o grupo C, de onde apenas uma equipa se apurou, a Suécia. A Itália garantiu o segundo lugar, mas não passou.
O Brasil chegou a solo inglês para a edição de 1966 com um estatuto que só a Itália, ao longo da história da competição, pôde igualar: os “canarinhos” eram bi-campeões, com vitórias em 58 e 62. Com Pelé, Garrincha, Jairzinho e Tostão nas suas fileiras e com o estatuto de bi-campeão, o “escrete” era naturalmente o grande favorito à vitória no Mundial de 66, mas desiludiu e não foi além da fase de grupos. No grupo de Portugal, Hungria e Bulgária, os “canarinhos” ficaram no terceiro lugar, com uma vitória e duas derrotas. Venceram o primeiro jogo, por 2-0 frente à Bulgária, mas perderam frente à Hungria na segunda jornada. Só uma goleada no terceiro jogo podia colocar o Brasil nos oitavos, mas, frente a Portugal, o “escrete” saiu derrotado por 3-1.