Antes de chegarem a Portugal, há cerca de quatro décadas, os audiolivros já tinham passado por outros países. A oferta a nível nacional ainda é limitada, mas os profissionais da área acreditam que o cenário pode ser invertido. O JPN esteve à conversa com a editora BOCA, com o autor Ricardo J. Rodrigues e com o locutor João Lobato de Faria sobre o poder dos audiolivros.  

Os audiolivros surgiram nos anos 30, nos Estados Unidos da América, como forma de permitir às pessoas com deficiência visual o contacto com a literatura. Atualmente, este formato de livro faz parte do dia-a-dia de milhões de pessoas em todo o mundo.

Em Portugal, os primeiros audiolivros chegaram na década de 80. A Dom Quixote, em parceria com o Circulo de Leitores, lançaram várias obras de ilustres autores portugueses como Camilo Castelo Branco e José Cardoso Pires.

Os audiolivros no mercado dos Estados Unidos da América, em 2018:
940 milhões de dólares (aproximadamente 865 milhões de euros);
Aumento nos lucros de 24,5% face aos resultados de 2017;
91% dos audiolivros são consumidos em formato digital;
Dados da Audio Publishers Association (APA).

Em Portugal, tanto a procura como a oferta de audiolivros é escassa. Atualmente, a BOCA é uma das únicas editoras, a nível nacional, a produzir este formato de livros. “Enquanto não houver mais gente a fazer [audiolivros], os poucos que estão interessados também não têm muito por onde alimentar esse interesse”, afirma Oriana Alves, proprietária da editora, em declarações ao JPN. 

O que começou por ser um projeto de amigos tornou-se numa verdadeira editora. A BOCA surgiu em 2006 quando não havia praticamente mercado de audiolivros no país. As primeiras edições só foram lançadas no ano seguinte. Segundo Oriana Alves, a BOCA não é uma editora convencional, pois tem muitos registos diferentes de sonoplastia e mistura a literatura com outras artes e com as ciências.

O mercado dos audiolivros nos EUA, em 2019:
56% dos consumidores, de audiolivros e de livros físicos, acredita que o formato de áudio é a melhor forma de apreciar livros;
74% dos cosnsumidores de audiolivros dizem que o carro é o local de eleição para a escuta, seguido das habitações.
Dados da APA.

Além de poderem servir as necessidades das pessoas que não conseguem fazer uma leitura autónoma, os audiolivros podem ainda ser um bom ponto de partida para o desenvolvimento de hábitos de leitura, acredita a responsável pela editora. “Mesmo alguém que não lê, e que de repente ouve um audiolivro muito bem feito, no mínimo fica com vontade de ir saber mais alguma coisa sobre aquele autor, ou sobre aquela obra, e se ficar a vida toda a ouvir audiolivros, a mim não me choca nada”, acrescenta.

Tal como os filmes e os teatros, também os audiolivros são interpretações de obras. “Quando vamos ao teatro, aquele ator ou aquela atriz que estão a dizer o texto daquela maneira também limitam a forma como estamos a construir a história na nossa cabeça”, afirma Oriana Alves. “Por isso é que eu tenho muito cuidado com as pessoas que escolho para ler [os audiolivros], tenho muita preocupação que saibam ler o melhor possível aquele texto”, acrescenta.

Ricardo J. Rodrigues é autor da obra “Malditos – Histórias de Homens e de Lobos”, editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que também foi adaptada a formato de áudio. O livro não foi narrado pelo autor, pois este considera que “há atores, pessoas especializadas que têm que ser valorizadas. O livro destina-se aos leitores, por isso, tem que ser feito por quem sabe fazer da melhor forma”, explica Ricardo J. Rodrigues.

João Lobato de Faria, que deu voz ao livro “Malditos- Histórias de Homens e de Lobos”, também acredita que deve ser um profissional a gravar os audiolivros. “É preciso uma pessoa ter uma certa experiência, ter uma boa dicção, a locução tem que ser apelativa, não pode ser monocórdica”, frisa o locutor da empresa Roda de Sons, da qual é proprietário. Caso contrário, o ouvinte pode rapidamente perder o interesse no conteúdo.

A gravação de um audiolivro é um processo caro, demorado e exige bastante concentração da parte do locutor. “Nós estamos a ler um livro de 90 páginas e a tendência é a pessoa chegar ao fim da décima página e começa a acelerar. Não pode ser. A cadência tem de ser sempre igual, como se a pessoa gravasse o livro todo só num dia, agarrou e gravou. É mentira, mas o ouvinte tem que pensar assim”, clarifica João Lobato de Faria.

No caso da obra de Ricardo J. Rodrigues, o autor não teve contacto com o locutor durante o processo de gravação, apenas ouviu o resultado final na apresentação do audiolivro. “Na apresentação deste projeto o leitor do livro apareceu por trás do palco a ler o meu livro, a dar entoação e emoção”, conta Ricardo J. Rodrigues. “Tu ouvires as palavras como tu escreveste é diferente. Ouvir os sons que estavam só na minha cabeça foi algo de extraordinário”, acrescenta. 

Ricardo J. Rodrigues considera que ter o seu livro gravado foi uma boa experiência e que o formato áudio fez com que a obra alcançasse mais pessoas, quer mais novas, quer mais velhas. 

Já João Lobato de Faria realça também que um dos aspetos positivos dos audiolivros é permitirem que os ouvintes acedam ao seu conteúdo enquanto estão ocupados com outras tarefas. “Eu não preciso de estar a perder tempo a ler o livro se entrar no carro e o estiver a ouvir numa viagem. Eu posso não estar a ler o livro fisicamente, mas estou a ouvir o livro. Posso preencher aqueles tempos em que não estou a fazer nada”, elucida.

Plataformas de audiolivros em Portugal

Não são muitas as plataformas que disponibilizam audiolivros em português e a maioria apresenta o conteúdo em português do Brasil. O JPN deixa-lhe a sugestão de algumas plataformas a que pode aceder para escutar os seus livros favoritos:

  • Audible– É uma das apps de audiobooks mais conhecidas a nível mundial e é detida pela Amazon. A aplicação tem milhares de livros – em português, mas também noutras línguas – e permite ouvir uma amostra, antes de adquirir o livro. Além disso, o ouvinte pode também escolher a velocidade de narração. A Audible oferece 30 dias de trial gratuitos tendo, depois, uma mensalidade de aproximadamente 13 euros. 
  • Scribd– Plataforma que disponibiliza audiolivros, ebooks, trabalhos de pesquisa, páginas da web e até apresentações de slides. A aplicação costuma ter o custo de 9,99 euros por mês. Contudo, em tempos de pandemia a empresa fornece o acesso gratuito a todos os seus conteúdos, durante 30 dias, a quem se inscreva. 
  • Kobo– Plataforma que disponibiliza audiolivros, ebooks e dispositivos para leitura
  • Ubook– Plataforma que permite acesso a audiolivros, ebooks, séries, documentos e até notícias. Caso se inscreva tem direito a sete dias de experiência grátis. Devido ao movimento #FiqueEmCasa, a aplicação reduziu a mensalidade de 6,99 euros para 3,99 euros por mês.
  • LibriVox  é uma aplicação não comercial, na qual participam milhares de voluntários. Como não são narrados por profissionais, todos os livros são gratuitos. Os ouvintes podem fazer o download dos audiolivros e ouvir em modo offline. 

Artigo editado por Filipa Silva.