Para conter o avanço da Covid-19 em Portugal, país fortemente afetado na terceira vaga da pandemia, o Governo português determinou o fecho das fronteiras no dia 27 de janeiro. O encerramento teve que ser prorrogado, com a suspensão de voos de e para o Brasil até ao dia 1 de março de 2021.

Fruto desta decisão, muitos cidadãos brasileiros estão impossibilitados de regressar ao Brasil, e vice-versa. Para atender ao problema, decorreram negociações entre o Governo Português e o Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Em resultado delas, esta sexta-feira (26), realiza-se um voo humanitário extraordinário da TAP entre Lisboa e São Paulo.

A solução proposta pelos governos português e brasileiro não tem sido um recurso eficaz para boa parte dos brasileiros, que continuam retidos com a suspensão dos voos entre os dois países. É o caso dos pais da brasileira Janice Capistrano, de 40 anos, residente em Portugal, desde 2018.

Os pais de Janice chegaram à cidade do Porto em novembro de 2020 para visitar a filha e os netos que já não viam há cerca de dois anos. Com regresso previsto para o dia 30 de janeiro, tiveram de mudar de planos com o anúncio do encerramento das fronteiras a partir de 29 de janeiro.

Eu jamais ia imaginar que a gente fosse viver esta saga, ainda mais por causa de um dia”, conta Janice ao JPN. Com a passagem remarcada duas vezes pela TAP e regresso previsto para o dia 6 de março, Janice afirma que foi informada sobre o voo humanitário por e-mail, no entanto, faz uma ressalva sobre o trajeto do bilhete que comprou inicialmente (Porto-Rio de Janeiro): “Quem paga do Porto para Lisboa e de São Paulo para Rio de Janeiro? Além de que eles [os pais de Janice] não têm a menor condição de fazer esses voos, essas escalas sozinhos.”

O problema ainda mais grave incide sobre a saúde dos pais da brasileira, que sofrem de diversas patologias e, por isso, necessitam de medicação, que segundo Janice já está a acabar. Os pais não conseguem ter acesso em Portugal a novas doses dos medicamentos, por falta de receita médica. “Não é um capricho, é uma questão de vida ou de morte. O pior pode acontecer a qualquer momento”, sublinha a cidadã brasileira.

Janice sente falta de informação por parte da companhia aérea e expressa um sentimento de abandono por parte do Consulado Brasileiro. Não é só Janice que tem sentido este abandono e que pretende conseguir um voo entre os dois países.

O fecho de fronteiras “compromete a vida das pessoas”

Carolina de Castro, de 37 anos, enfrenta o problema inverso. A cidadã brasileira é residente em Portugal, casada com um português e mãe de um filho nascido no país. No entanto, depois de ter ido para o Brasil na época natalícia, não conseguiu regressar a terras portuguesas. O retorno estava marcado para dia 10 de fevereiro, mas agora espera conseguir regressar ao Porto apenas a 7 de março, conforme a última remarcação realizada.

Quem teve que correr atrás das informações sobre o voo e remarcação, fomos nós”, conta Carolina ao JPN. Foram várias as tentativas frustradas para obter informações dos consulados brasileiro e português e da TAP, refere.

O meu filho é português e não pode ficar no Brasil mais do que 90 dias“, explica Carolina. Ao ligar para o consulado português do Rio de Janeiro, a brasileira afirma que “ninguém fazia ideia” sobre quando era possível um voo de repatriamento.

“Liguei então novamente para a TAP e a resposta foi que deveria preencher um formulário no site, que não encontramos. Portanto, não tivemos apoio de qualquer instituição”, conta.

Com informações escassas, o voo previsto para esta sexta-feira é definido pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros do Brasil, na sua página na internet, como “uma operação privada“. “Os interessados devem tratar diretamente com a TAP da marcação ou aproveitamento de bilhetes aéreos”, lê-se no site.

A TAP, em comunicado do dia 15 de fevereiro, também faz uma breve sinalização de como os passageiros afetados pela suspensão dos voos devem reagir: “Aconselhamos os passageiros com reserva confirmada em viagens afetadas, durante o referido período, a não se dirigirem para os aeroportos e a contactar diretamente o Contact Center da TAP”.

Hipóteses de realização de voos já foram discutidas pelas autoridades envolvidas. No entanto, a extensão do estado de emergência em Portugal decretada pelo Presidente da República e aprovada pelo Parlamento, esta quinta-feira, gera ainda mais incertezas por parte das entrevistadas.

Janice Capistrano diz entender “a gravidade da situação em todo o mundo”, mas aponta que a sua situação também tem gravidade: “São dois idosos que não têm doses de remédio suficiente para permanecerem num país que não é o deles“, aponta.

Já Carolina compreende “a necessidade de conter a pandemia”. Não obstante, apela a que haja um maior “cuidado com este encerramento radical de fronteiras que compromete a vida das pessoas“.

Artigo editado por João Malheiro