Autarcas dos 17 municípios da AMP e as ministras da Saúde e da Coesão reuniram-se no Porto para debater descentralização. À saída, Governo mostrou-se otimista. Autarcas esperam para ver.
Um acordo entre o Governo e a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) está para “muito breve”, garantiu a ministra da Coesão Territorial esta terça-feira, à saída de uma reunião com os 17 municípios da Área Metropolitana do Porto (AMP), que teve lugar nas instalações da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N).
Nas declarações que fez aos jornalistas no final da reunião, Ana Abrunhosa afirmou que é “uma questão de tempo” para se fazer um acordo que estabilize os valores a transferir pelo Estado para as autarquias no âmbito da descentralização de competências na Educação e na Saúde, anunciando que a área social será tratada num momento posterior. A governante assegurou ainda que o Governo transferiu mais do que as câmaras estão a gastar: “As câmaras já estão a receber mais do que o Governo gastava”, disse. Apesar de ter defendido que o processo tem corrido bem, a ministra reconheceu que este é um dossiê “complexo”.
As verbas têm sido o assunto mais contestado por parte dos autarcas. Ana Abrunhosa esclareceu que na reunião foi abordada a possibilidade de se reforçarem as verbas no Orçamento do Estado de 2023 para os custos de manutenção das escolas, assim como a possibilidade de também o Estado aumentar a comparticipação das refeições escolares.
A ministra declarou que há um conjunto de escolas e de centros de saúde que necessitam de obras de “grande envergadura”. “Na Saúde, esse equipamento está identificado e vai ser apoiado através do PRR.” “Se algum equipamento faltar, será através do Portugal 2030” e o mesmo acontecerá na Educação, garantiu a ministra. Confessou ainda que a “ideia é em julho” lançar “os primeiros avisos para apoiar as escolas que precisam de intervenção mais urgentes”. Fora o Orçamento de Estado, podem haver “outras fontes de financiamento”, como por exemplo o Banco Europeu de Investimento ou o PRR. As verbas podem ser utilizadas “para novas construções, requalificações” ou “viaturas” porque, do ponto de vista da ministra, o estado de degradação dos veículos na área da Saúde é algo que causa preocupação. São questões que estão a ser “articuladas” com a ANMP.
No mesmo sentido foram as declarações de Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios, que esteve presente na condição de presidente da Câmara de Matosinhos. “Saio satisfeita, porque verifico, em primeiro lugar, que não há nenhuma proposta que aqui tenha sido apresentada que não esteja já trabalhada pela associação [de municípios]”.
A autarca congratulou-se “por ver que há disponibilidade negocial” do Governo, dizendo que “têm sido alcançados resultados que estão prestes a serem formalizados num acordo que só ainda não está assinado” porque querem “ter as garantias que fica tudo acautelado”. Referiu também que a Associação Nacional de Municípios já está a trabalhar na área social, apesar de muitos municípios só aceitarem estas competências, a partir de dia 1 de janeiro.
A presidente da Câmara Municipal de Matosinhos destacou o trabalho que está a ser desenvolvido no setor educacional, sobretudo com o anúncio de “um grande pacote inédito em Portugal de reformulação de centenas de escolas que envolverá mais de mil milhões de euros de investimento”.
Sobre a polémica saída do município do Porto da ANMP, Luísa Salgueiro não se quis alongar sobre o assunto, assegurando contudo que se a Câmara do Porto quiser regressar à Associação Nacional de Municípios “será sempre bem-vinda”.
Autarcas correm “atrás do prejuízo”
Um dos principais críticos da condução do processo de descentralização é Rui Moreira. À saída do encontro desta terça-feira, o presidente da Invicta reafirmou que a preocupação dos autarcas é a neutralidade orçamental, argumentando que os municípios não são capazes de assumir encargos “quando não há uma receita equivalente”.
O presidente da Câmara do Porto revelou que ficou “surpreendido” quando se discutiu o setor educacional, dando conta que a ministra da Coesão Territorial anunciou “um conjunto de pacotes retificativos da questão da descentralização na área da Educação”. Para além disso, teceu críticas à forma “atabalhoada” como o processo está a ser desenvolvido, destacando o facto de a Associação Nacional de Municípios estar a ouvir as preocupações dos autarcas – “o que “deviam ter feito antes”, na opinião do edil do Porto – para tentar resolver todos os constrangimentos. Segundo o autarca, “agora vamos correr atrás do prejuízo”.
Aires Pereira, presidente da Câmara da Póvoa de Varzim, comentou na mesma ocasião que “o processo de descentralização estava tudo menos preparado”. O autarca referiu ainda que “há um conjunto enorme de diplomas que estão a ser ultimados e que dão razão àquele conjunto de autarcas que disse que não havia condições para se fazer a descentralização”.
Em forma de crítica, declarou que a reunião permitiu demonstrar que a Associação Nacional de Municípios esteve “muito adormecida e agora corre atrás do prejuízo”. Para além disso, assumiu que o Governo tem a responsabilidade “de incorporar no Orçamento de 2023 todas estas verbas”. O presidente poveiro espera “que agora nesta velocidade ultrassónica que está a ser introduzida” se possa “contribuir para um desejo natural dos municípios que é assumir mais responsabilidades” e “prestar melhores serviços” aos munícipes.
“Estamos longe da meta”
A ministra da Saúde, Marta Temido, que saiu mais cedo do encontro por causa de outra reunião, confessou, num registo menos otimista que o da ministra da Coesão, que ainda estão “longe de atingir a meta” a que se propuseram. Admitiu também que “resta continuar a trabalhar” para que se possa alcançar mais acordos para além dos 50 já assinados. Contudo, salientou que este processo teve início “num período particularmente difícil, em contexto de pandemia”. Um dos objetivos da reunião era discutir os parâmetros que podiam ser melhorados, no que concerne aos autos de transferência na área da Saúde. “Ao ouvir os autarcas podemos recuperar aspetos que possam ainda ser melhorados”, afirmou a ministra da Saúde.
Marta Temido garantiu que “há outras questões mais operacionais que se prendem com aspetos como seguros, as despesas da saúde de pessoas a transferir, a possibilidade de condução de viaturas que são dos municípios por profissionais que não são dos municípios”, ou seja, aspetos práticos que necessitam de uma resposta. A governante declara que vários países têm a municipalização da saúde e que isso é uma boa alternativa para prestar um “trabalho em proximidade sem descurar a equidade nacional”.
A reunião que teve início às 9h30, prolongou-se até ao final da manhã e contou com a presença dos municípios de Arouca, Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Oliveira de Azeméis, Paredes, Porto, Póvoa de Varzim, Santa Maria da Feira, Santo Tirso, São João da Madeira, Trofa, Vale de Cambra, Valongo, Vila do Conde e Vila Nova de Gaia.
Artigo editado por Filipa Silva