Esta semana, o Conselho Europeu vai votar a atribuição do estatuto oficial de país candidato à Ucrânia. O que implica esta decisão e como se posiciona Portugal sobre o assunto?

Conselho Europeu reúne-se em Bruxelas nos dias 23 e 24 de junho. Foto: Conselho Europeu/Wikimedia Commons

A 28 de fevereiro deste ano, quatro dias apenas após a invasão russa da Ucrânia, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky escreveu uma carta a solicitar a adesão à União Europeia. A 1 de março, o Parlamento Europeu votou favoravelmente a concessão do estatuto. Em abril e maio, a Ucrânia completou os questionários de adesão que lhe foram pedidos. Na última sexta feira (17), foi a vez da Comissão Europeia defender a oficialização da Ucrânia como um país candidato. Mas a última palavra sobre a atribuição do estatuto é agora dos 27 estados-membros que vão reunir-se na próxima quinta e sexta-feira, em Conselho Europeu, para tomar uma decisão final sobre a matéria.

O JPN reuniu algumas perguntas e respostas que podem ajudar a compreender melhor o assunto.

O que é o estatuto oficial de país candidato?

É o primeiro passo para o processo de adesão à União Europeia. Quando um país se encontra nessa fase, significa que atende aos critérios de adesão e está pronto para as negociações formais. Não significa necessariamente que essas negociações serão feitas no imediato após a aprovação do estatuto.

Aliás, a concessão do estatuto oficial de país candidato à Ucrânia ficará dependente do cumprimento de uma série de exigências por parte da União Europeia que deverão ficar especificadas no estatuto que vier a ser assinado entre as partes, no caso de tal vir a acontecer.

Quando será decidida a concessão do estatuto à Ucrânia?

Nos dias 23 e 24 de junho, data do próximo Conselho Europeu, através de uma votação dos líderes europeus. Para que o estatuto seja concedido à Ucrânia, é preciso unanimidade por parte dos 27 membros da União Europeia. O consenso não está garantido.

Qual a situação atual da Ucrânia no processo de adesão à União Europeia?

A Ucrânia encontra-se com o pedido de adesão realizado e está à espera do estatuto oficial de país candidato para iniciar formalmente a adesão à União Europeia.

Será ainda analisada a atribuição do mesmo estatuto a outros dois países que se encontram na mesma fase: a Moldova e a Geórgia.

Quais as vantagens para a Ucrânia na entrada da União Europeia?

Colocada de parte que está, pelo menos por agora, a adesão à NATO, a entrada da Ucrânia na União Europeia teria uma enorme importância política simbólica para o país do Leste, na rota de aproximação ao Ocidente – e consequente afastamento da Rússia – que o país vem trilhando sobretudo desde a Revolução de 2014 (conhecida como Revolução da Dignidade).

Depois desse ano, as relações do país com o bloco europeu reforçaram-se muito, existindo mesmo um Acordo de Associação entre as partes em vigor desde 2017 que já contempla vários benefícios comuns, sobretudo no âmbito das trocas comerciais. A título de exemplo, as exportações de ferro, aço, produtos minerais e agrícolas da Ucrânia para a UE terão aumentado cerca de 48% desde 2016, dando uma ideia do impacto deste acordo.

Mas entrar no “clube” europeu traria outros benefícios para os 44 milhões de ucranianos, nomeadamente ao nível da livre circulação dos cidadãos no espaço europeu, direitos na área do trabalho ou do estudo.

Também a possibilidade de ter representação nas instituições europeias (Parlamento, Comissão, Tribunais), é relevante. O benefício de políticas agrícolas e energéticas comuns também. Mas, mediante o atual cenário de conflito, o principal benefício e, provavelmente, o principal responsável pela urgência no pedido do estatuto, deve-se ao desejo de proteção que os tribunais do bloco europeu concedem aos países-membros e beneficiar do orçamento europeu, sobretudo tendo em linha de vista a reconstrução do país que será necessário no pós-guerra.

Quais as consequências para a União Europeia?

A forma como o processo está a correr e a urgência pedida por diversos líderes apontam para um tratamento diferenciado da Ucrânia face ao que foi aplicado a outros países que já estão há anos como países candidatos a aguardar por uma conclusão das negociações.

A maioria desses países pertencem à região dos Balcãs Ocidentais e também têm sentido grandes impactos com a guerra da Ucrânia. A demora da conclusão dos processos desses países e o suposto tratamento especial da Ucrânia podem afastar o interesse desses países pelo lado Europeu, aproximando-os da Rússia. É o caso, por exemplo, da Sérvia, já por si, historicamente, muito próxima da Rússia. E fora dos Balcãs, também da Turquia, que é país candidato desde 1999 e nunca concluiu as negociações para aderir oficialmente à União Europeia.

Por outro lado, a entrada de um país com a dimensão da Ucrânia – seria o quinto mais populoso da União, depois da Alemanha, França, Itália e Espanha – teria necessariamente um grande impacto em termos orçamentais, e não só.

Há alguma previsão para a adesão oficial da Ucrânia à União Europeia?

Não. As negociações entre a União Europeia e a Ucrânia para a adesão oficial podem demorar anos e dependem do estado em que o país se encontrar após a guerra. Parte importante das negociações envolverão uma transição, provavelmente lenta, de um país sobre leis marciais para um de democracia plena.

O tempo médio para adesão à União Europeia é de quatro anos e 10 meses, de acordo com o think tank de Londres, UK in a Changing Europe. Ainda assim, para muitos países-membros e candidatos houve e tem havido uma espera superior ao tempo médio de adesão calculado pela organização.

Que outros países são candidatos à adesão?

Atualmente são cinco: Albânia, Macedónia do Norte, Montenegro, Sérvia e Turquia.

Encontram-se ainda como países potencialmente candidatos, ou seja, que ainda não satisfazem todas as condições da União Europeia, a Bósnia-Herzegovina e o Kosovo (este último não é reconhecido como país independente por alguns países-membros da UE). E por fim estão a Ucrânia, a Moldova e a Geórgia com pedidos de adesão.

Declaração da Comissão Europeia sobre a concessão do estatuto de país candidato à Ucrânia, Moldova e Geórgia. Foto: Comissão Europeia

Na última sexta-feira (17), a Comissão Europeia recomendou ao Conselho Europeu que seja concedido o estatuto de país candidato à Ucrânia e à Moldova. 

Para justificar a primeira, a comissão refere que a Ucrânia “está bem adiantada no alcance de estabilidade de instituições que garantam a democracia, o Estado de Direito, direitos humanos e no respeito e proteção dos direitos das minorias”, além de elogiar o registo macroeconómico do país. A instituição liderada por Ursula Von Der Leyen não deixa de frisar a necessidade de a Ucrânia continuar a “precisar de reformas económicas estruturais”. Argumentos similares justificam a mesma recomendação relativa à Moldova.

Já para a Geórgia, foi proposto que o estatuto seja concedido apenas depois de “uma série de prioridades serem respondidas”.

Como Portugal se posiciona em relação a este assunto?

Portugal posiciona-se como apoiante da Ucrânia, mas entende que o estatuto oficial de país candidato não deve ser a prioridade.

O governo vai aplicar as atuais restrições no fim de semana a todos os concelhos com mais de 240 casos por 100 mil habitantes. O primeiro-ministro admite anunciar novas restrições na próxima semana.

António Costa assumiu postura cética, mas não pretende opor-se caso haja unanimidade na votação. Foto: D.R.

O primeiro-ministro português, António Costa, assumiu, em declarações aos jornalistas dadas a semana passada em Haia, durante a cimeira preparatória do encontro da NATO de 28 de junho, que Portugal não se vai opor à atribuição do estatuto se houver unanimidade na votação dos 27 Estados-membros.

António Costa considerou, contudo, difícil que seja alcançada essa unanimidade e que a Europa pode apoiar os setores financeiro, militar, humanitário e político da Ucrânia de outras formas. Por outro lado, referiu, tratar a Ucrânia de forma diferenciada pode produzir “frustrações” em outros países candidatos. “Há muita gente que entende que o facto da Turquia ter o estatuto de candidato de uma forma inconsequente há mais de 50 anos explica muito da involução que existiu na Turquia”, exemplificou o primeiro-ministro.

Outros países-membros que adotam uma posição mais cética a respeito da concessão do estatuto oficial de país candidato à Ucrânia são a Dinamarca, a Bélgica e os Países-Baixos. Inicialmente França e Alemanha também demonstraram esse posicionamento, mas após a viagem dos respetivos líderes, Emmanuel Macron e Olaf Scholz, a Kiev, na última quinta-feira (16), a posição de defesa da concessão do estatuto passou a ser clara.

Artigo editado por Filipa Silva