A expressão “democratizar a moda” já não é de agora. Significa tentar expandir esse mundo e levá-lo a mais pessoas – algo que a fast-fashion domina na perfeição mas que sobre o qual a alta costura ainda encontra dificuldades. A moda de autor, por um lado, vai estar sempre ligada a um nicho muito reduzido de consumidores, até porque é suposto ser vista como algo fora do banal, cujo foco é a expressão do designer. Ainda assim, a fim de divulgar as peças em plataformas mais abrangentes, o Portugal Fashion (PF) investiu em parcerias com grandes superfícies comerciais – NorteShopping, Él Corte Inglés Gaia e Vila do Conde Fashion Outlet -, na mais recente edição.

“A moda tem uma componente artística de valor acrescentado, que realmente é suposto estar num universo mais de aspiração”, diz Mónica Neto, diretora do certame, ao JPN. Significa isto que democratizar algo que conta com uma enorme envolvente financeira é injusto para quem produz – até porque a moda de autor em nada tem a ver com a moda das grandes superfícies comerciais. As diferenças denotam-se, sobretudo, na produção: uma peça de autor, além de ser única, envolve muito mais atenção ao detalhe e horas de trabalho.

Nesse sentido, os custos de produção e todo o contexto que engloba a apresentação de marcas em eventos (como, por exemplo, o Portugal Fashion) leva a maiores dificuldades de alcance. Por isso, democratizar a alta costura passa mais pelo melhor acesso à informação do que pela própria compra das peças de roupa ou calçado. Moda de autor vai ser sempre mais elitista, mas a diretora do evento realça: “[Por] ter uma peça mais artística, não significa que o artista não possa ter [também] uma peça mais comercial e acessível ao consumidor”.

A semana da moda, através dos seus patrocinadores, tem o objetivo de dar a conhecer os designers portugueses que, na cena internacional, ainda não consolidaram o seu nome. Nesse sentido, Mónica Neto reitera: “Há muitos anos que estamos a tentar lançar as marcas portuguesas para o mundo”. Para a diretora do PF, o importante é fortalecer o mercado nacional para que este funcione como “base de sustentação” das marcas que querem ir além-fronteiras.

As parcerias com o NorteShopping e com o Vila do Conde Fashion Outlet acabam, então, por potenciar “a aproximação do consumidor final àquilo que é o conteúdo dos designers e da moda de autor”, como explica Mónica Neto. As superfícies comerciais que, todos os dias, recebem todo o tipo de consumidores, são um ótimo veículo para dar a conhecer não só o evento, como os designers emergentes portugueses.

Esta estratégia é, portanto, uma das apostas de um Portugal Fashion renovado, que se adapta às novas necessidades da indústria depois de um corte no orçamento (este ano o certame contou com apenas 450 mil euros para a sua montagem). Ainda sem o apoio de fundos europeus, a ANJE – entidade promotora -, continua à procura de ajuda para conseguir estabilidade financeira para os próximos anos, avança o “Público”.

Por agora, com propostas e formatos de exibição inovadores, o objetivo é simples: dar cada vez mais palco à moda nacional e lusófona, mostrando o que de melhor se faz, começando pela aproximação ao consumidor no seio do próprio país. Desta forma, promove-se não só o trabalho dos designers, mas também toda a indústria têxtil, do calçado e das joias portuguesas.

Mas também os próprios designers tentam, cada vez mais, aproximar-se do público geral. Em declarações ao JPN, Paulo Almeida, da dupla Marques’Almeida, indica ficar contente ao ver “alguém completamente desconhecido a usar a marca”. Para si, é crucial criar linhas destinadas a todo o tipo de pessoa. “Ver uma pessoa a entrar num autocarro com as nossas roupas é das coisas mais gratificantes que podemos ter”, remata.

Susana Bettencourt, embora admita que as suas peças não são para todos, completa que esta profissão está inteiramente dependente do público. “É preciso que as pessoas entendam o nosso processo e as nossas horas de trabalho”, conclui.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira