Num manifesto, a Associação para o Planeamento da Família (APF) e o movimento feminista A Coletiva pedem ainda o fim do período de reflexão obrigatório e o alargamento da prática aos centros de saúde. Em 2022, foram realizadas 16.471 interrupções.

Segundo a DGS, o número de abortos subiu 15% face ao ano anterior Fernandozhiminaicela/Pixabay

A Associação para o Planeamento da Família (APF) e o movimento feminista A Coletiva defenderam, este domingo (11), uma série de reivindicações relacionadas com a interrupação voluntária da gravidez (IVG), entre as quais o alargamento do prazo do limite gestacional até às 12 semanas e o fim do período de reflexão obrigatório de três dias.

As 10 semanas são insuficientes, especialmente quando, em Portugal, existem tantos obstáculos [para a realização do aborto]. Há um desenquadramento com as legislações de outros países europeus”, disse Catarina Moreira, membro d’ A Coletiva, em entrevista ao JPN. A ativista explica ainda que o período de reflexão obrigatório estabelecido pela lei vai contra as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo com o manifesto, a APF e o movimento A Coletiva exigem ainda o fim da “obrigação da intervenção de dois médicos” para a realização do aborto. “Num hospital que tenha só um médico ou uma médica a fazer a IGV, não é possível. São precisos dois médicos para fazer a intervenção”, explica Catarina Moreira.

Para além disso, as duas associações pedem o alargamento da prática aos centros de saúde e garantias de que “todas as unidades de saúde, preparadas para a prática da IVG, asseguram o direito efetivo à mesma, não podendo a objeção de consciência constituir-se como obstáculo ao cumprimento da lei”. Segundo os número da Direção-Geral da Saúde, citados no manifesto, das 40 unidades hospitalares preparadas para garantir a interrupação voluntária da gravidez, “apenas 29 o fazem“.

A objeção de consciência é uma das principais razões pelas quais os hospitais se negam a proceder à IVG. “Neste momento, a falta de hospitais que executem a prática por objeção de consciência, traduz-se num boicote ao acesso ao aborto. Verifica-se que há regiões no país onde o hospital inteiro é objetor de consciência”, explica a ativista.

O comunicado de imprensa diz ainda que,”por não ser obrigatório prestar informação a priori sobre profissionais de saúde que exercem do direito de objeção de consciência”, não existe um mapeamento nacional das unidades de saúde que garantem o direito ao aborto.

Conforme o Relatório de Análise Preliminar dos Registos das Interrupções da Gravidez (2018-2021), citado no comunicado de imprensa, Portugal é “o país da Europa com a mais curta mediana de semanas de gestação para a realização da interrupção (sete semanas), mas continua a haver mulheres que não conseguem aceder à IGV dentro do período gestacional legal”.

“Sabemos que as mulheres tentam aceder ao SNS, mas ao não haver resposta, são reencaminhadas para muitos tipos de respostas”, afirma Catarina Moreira. A ativista refere ainda que os obstáculos no acesso ao aborto podem ter graves consequências. “No pior dos casos, pode empurrar as mulheres para o aborto clandestino, fora da legalidade ou outro país. Isto afeta as mulheres mais pobres, de classes sociais mais baixas, que não têm os recursos”, explicou.

Em 2022, um relatório da DGS dava conta de que o número de abortos subiu 15% face ao ano anterior: 16.471 interrupções, mais 2.123 do que as registadas em 2021. O mesmo relatório informa que, em aproximadamente 72% dos casos, era a primeira vez que a mulher recorria a IVG. Apesar do aumento verificado, Portugal está abaixo da média europeia no que diz respeito ao número de abortos por mil nados-vivos.

Dezassete anos depois da despenalização do aborto (Lei nº 16/2007), o manifesto d’ A Coletiva e da APF pretende, “relembrar que a luta pelos direitos sexuais e reprodutivos está longe de terminar“.

Editado por Inês Pinto Pereira