A Academia Gil Vicente FC Toronto é um projeto criado em 2017 que já deu a mais de uma centena de jovens futebolistas a oportunidade de estagiarem em Barcelos. Noah da Silva foi o primeiro a garantir um contrato de formação.

Com apenas 15 anos, Noah da Silva assinou em janeiro o seu primeiro contrato de formação. Nos próximos três anos, o jovem canadiano vai vestir a camisola do Gil Vicente, clube que milita na Primeira Liga portuguesa. O sonho começou ainda no Canadá, no Gil Vicente FC Toronto, a academia criada em 2017 por iniciativa de José Carlos da Silva, à qual Noah se juntou com 13 anos. 

Ao JPN, o jovem sublinhou a “grande responsabilidade que é fazer parte da equipa gilista”. Noah veio para Portugal fazer o primeiro estágio prolongado em Barcelos há dois anos. O jogador confessa que “não foi um processo fácil”. Como maior desafio, aponta o sacrifício de estar afastado da família, uma vez que deixou grande parte dos familiares em Toronto, quando decidiu seguir o sonho do futebol.

Quando questionado sobre a melhor parte da experiência, o jovem reforça o privilégio de poder jogar futebol num país onde a modalidade é rainha. “Não estou assustado. Estou feliz e muito grato pela oportunidade”, disse ao JPN.

O mais recente reforço da equipa de sub-17 do Gil Vicente realça ainda a diferença entre o país de origem e Portugal, no que diz respeito aos métodos e estratégias de trabalho. “O futebol no Canadá, quando comparado com o de Portugal, não é nada. É por isso que os jogadores vêm para a Europa treinar”, afirmou.

O futebol sempre esteve presente na vida do jogador, que cresceu dentro de um meio que valorizava a modalidade. Como maior referência durante os seus anos de formação, Noah aponta o nome de Cristiano Ronaldo, o super jogador português, dono de múltiplos recordes, hoje jogador do Al-Nassr. Quanto às suas ambições e planos futuros, o atleta confessa ter o sonho de poder chegar à equipa principal do Real Madrid.

Elo de ligação com o futebol português

A academia Gil Vicente FC Toronto celebra este ano o seu 7.º aniversário. Conta com aproximadamente 240 atletas, entre os cinco e os 18 anos. O crescimento do projeto foi gradual desde a sua fundação, altura em que o plantel integrava cerca de 30 jogadores.

Miguel Sá Pereira, assessor e diretor de comunicação do Gil Vicente FC, é o principal elo de ligação entre a equipa portuguesa e a academia, em Toronto. O projeto deve a sua criação a José Carlos da Silva, um emigrante no Canadá, que propôs a ideia ao clube minhoto. Face à proposta, a estrutura gilista decidiu visitar a cidade canadiana e percebeu que o projeto tinha potencial e que seria benéfico para o clube.

Um dos fatores que influenciou a decisão, foi o facto de grande parte da comunidade portuguesa em Toronto ser natural de Barcelos. Isto viria a traduzir-se num número acrescido de apoiantes. Miguel Pereira faz questão de sublinhar o papel do atual presidente: “Já tinha o conhecimento e a experiência de outras escolas. Se não fosse o impulso dele, não acredito que o Gil Vicente tivesse nesta altura uma Academia em Toronto”, referiu ao JPN.

Miguel Sá Pereira é o diretor de comunicação e assessor do Gil Vicente FC. Foto: Mariana Laranjeira e Sofia Martins

A gestão da instituição é autónoma, contando com a supervisão e apoio da equipa gilista. A rentabilidade não é um objetivo da academia, segundo os responsáveis pelo projeto, uma vez que o intercâmbio de jogadores não resulta em qualquer lucro financeiro.

A interação entre os dois clubes inclui um balanço mensal do desempenho dos atletas. Para além disso, a equipa portuguesa tenta partilhar a sua metodologia e mentalidade de trabalho com a academia canadiana e proporciona formações aos seus treinadores. Todos os anos, três treinadores gilistas visitam Toronto durante uma semana. Durante esse período, os atletas da academia têm um acompanhamento personalizado, que inclui a conciliação entre aulas teóricas e treinos práticos. Segundo os responsáveis pela Academia, esta preparação facilita, posteriormente, a integração dos atletas e a sua adaptação ao futebol português.

Na opinião de Miguel Pereira, o resultado tem sido positivo, tanto para o clube como para os jovens: “É fascinante vermos que, para além da vertente desportiva, os pais também se associam a estes estágios. E ganhamos novos gilistas, novos patrocinadores e novos sócios.”

“Ter cá os jogadores a praticar futebol de uma forma competitiva nos quadros da Federação de Futebol Portuguesa é a cereja no topo do bolo”.

Um dos pontos abordados pelo assessor do clube foi a competição saudável que se gera no processo de seleção dos atletas que são propostos para estágio. O acompanhamento da prestação dos jovens jogadores é feito por via de relatórios e vídeos, enviados pela Academia para Barcelos.

Outro ponto a ser considerado é a idade dos atletas. Por ainda serem menores, necessitam da autorização dos pais ou encarregados de educação, para participar no estágio. É nesse sentido que Miguel Sá Pereira afirma que “há sempre algum jogador que se destaca e ganha a oportunidade de fazer o estágio mais prolongado. Contudo, a proposta é feita primeiro aos pais, por se tratarem de menores, o que acarta uma responsabilidade acrescida”. “Ter cá os jogadores a praticar futebol de uma forma competitiva nos quadros da Federação de Futebol Portuguesa é a cereja no topo do bolo”, afirma Miguel Pereira.

Rafael Ferreira e Armando Ávila são dois exemplos de jogadores que tiveram a oportunidade de estagiar durante um período prolongado em Barcelos. Contudo, estes atletas já não fazem parte do plantel gilista, ao contrário de Noah da Silva, que assinou um contrato de formação com o Gil Vicente o mês passado.

A nova aquisição da equipa gilista sub-17 sublinha a importância de projetos como o Gil Vicente FC Toronto, que possibilitam “ótimas oportunidades para os jogadores”. Porém, o atleta faz questão de alertar para a responsabilidade e disciplina exigidas durante todo o percurso: “A Academia é só para quem sabe o que quer e está disposto a esforçar-se para isso. Para conseguir ter sucesso em Portugal é preciso trabalhar muito.”

“Um clube também pode marcar golos fora das quatro linhas”

O primeiro estágio da Academia em Portugal durou duas semanas e incluiu 11 jogadores. Desde então, a equipa canadiana já visitou Barcelos mais dez vezes e já deu oportunidade a mais de cem atletas de estagiar com a equipa minhota.

Segundo a direção do projeto, o próximo estágio já está a ser planeado. Este ano, a equipa gilista irá receber cerca de 20 jogadores, entre os 13 e 16 anos. Os atletas vão ficar em Portugal de 16 de agosto a 2 de setembro. Relativamente à logística dos estágios, o diretor de comunicação adianta que, ao contrário do que acontece noutras organizações desportivas com afiliações, as despesas são cobertas maioritariamente pelo Gil Vicente.

Os pais dos jogadores contribuem com um valor residual, de forma a assegurar as despesas da viagem. Uma vez em território nacional, quer o transporte, a estadia e a alimentação são da responsabilidade da equipa portuguesa que os acolhe. De acordo com o presidente da Academia, José Carlos da Silva, “o grupo que vem a Portugal é bastante promissor e inclui atletas que podem vingar no futebol português”.

Miguel Sá Pereira dá ênfase à importância da vertente social e lúdica do clube, que ao abrir portas dá a conhecer a sua história. “Temos grande interesse na parte da responsabilidade social. Esse é o nosso grande objetivo. Eles são recebidos todos os anos pelo presidente da Câmara Municipal de Barcelos, conhecem a região, a gastronomia e sobretudo a cultura do Gil Vicente, que está a caminho dos 100 anos.” “Um clube também pode marcar golos fora das quatro linhas”, concluiu.

Quando questionado sobre aquilo que mais o marcou, desde que participa na interação entre a Academia e o Gil Vicente FC, o assessor volta a referir o impacto social que este tipo de projetos pode ter numa comunidade. “Foi aquilo que mais nos comoveu, tanto a mim, enquanto elo de ligação oficial, como ao nosso presidente e a toda a estrutura envolvida”, concluiu.

Miguel Pereira aproveitou ainda para sublinhar o apreço pelo trabalho do presidente, José Carlos Silva, e da equipa que o acompanha: “a conciliação entre as vidas profissionais e as responsabilidades associadas à Academia implica um enorme esforço e disciplina por parte de todos os envolvidos”.

Visita da estrutura portuguesa a Toronto. Foto: Academia FC Toronto/Facebook

Miguel Sá elogia ainda a forma como o programa está organizado e afirma: “não há aqui dois clubes, no fundo somos todos um, embora um esteja no Canadá e outro aqui em Portugal.”

Os jogadores em formação na Academia têm a oportunidade de treinar e jogar no recinto oficial do clube português, durante o estágio. Foto: Gil Vicente FC Toronto/Website

Portugal é dos melhores “no que toca ao futebol de formação”

O apoio no desenvolvimento da vertente técnico-tática feito em Portugal é, para Miguel Pereira, a área onde há maior necessidade de intervenção portuguesa. Isto deve-se maioritariamente ao facto de o futebol canadiano não estar no mesmo patamar de desempenho do futebol português. “No Canadá existe qualidade e competitividade, mas não ao nível de Portugal, que é um dos melhores do mundo, principalmente, no que toca ao futebol de formação.”

O diretor de comunicação alerta para a importância de uma abordagem responsável, num desporto que exige mais do que habilidades técnicas: “Alcançar o sonho de seguir carreira no futebol profissional não é fácil. É preciso ter os pés bem assentes na terra. Os jovens com 12, 13 anos têm todos os sonhos do mundo. Mas temos de perceber que só um grupo muito restrito de jogadores é que consegue chegar à elite. Só com dedicação, muito treino e disciplina é que se consegue alcançar os patamares mais altos.” 

A prova da forma como este projeto tem reflexo na comunidade portuguesa em Toronto, é o dia 10 de junho, Dia de Portugal, data em que se organiza uma parada que junta milhares de pessoas na capital da província de Ontário.

Entre os vários carros alegóricos que circulam no desfile, está presente o da Academia Gil Vicente FC Toronto. Em 2023, alguns representantes do clube minhoto tiveram a oportunidade de visitar o país norte-americano neste dia e de sentir o apoio dos adeptos emigrantes: “O que sentimos é que estas pessoas vibram muito com as vitórias e já começam a criar uma ligação muito forte com o futebol português.”

Carro do clube minhoto marca presença na parada do Dia de Portugal. Foto: Gil Vicente FC/Facebook

O principal objetivo da Academia é assegurar a formação responsável e saudável de novos atletas, ao mesmo tempo que contribui para a conquista de novos adeptos e para um reconhecimento acrescido do clube português.

Editado por Filipa Silva

Artigo realizado no âmbito da cadeira de TEJ Online – 2.º ano