O debate entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro tornou claros os aspetos que dividem os dois candidatos a primeiro-ministro, principalmente no que diz respeito à saúde, impostos e educação. Sem que nada o fizesse prever, várias centenas de membros das forças de segurança protestaram à porta do Capitólio, local onde se realizou o debate.

Debate entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro durou mais de uma hora Ilustração: Jaime Silva

A abertura de Pedro Nuno Santos, líder do Partido Socialista (PS), à possibilidade de viabilizar um governo minoritário da Aliança Democrática (AD) foi a grande novidade do debate, que durou cerca de uma hora e que opôs esta segunda-feira (20) o candidato do PS a Luís Montenegro, líder da AD. Já o presidente do Partido Social Democrata (PSD) disse trabalhar em cenário de vitória, mas não deixou claro se vai ou não viabilizar um governo minoritário do PS.

Um debate marcado por protesto das forças de segurança

As reivindicações das forças de segurança foram o primeiro tema a ser abordado, dada a concentração de centenas de membros da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Guarda Nacional Republicana (GNR) à porta do Capitólio, em Lisboa, local onde se realizou o debate. Os elementos das forças de segurança pedem melhores condições salariais e de trabalho.

Luís Montenegro considera “prioritário” encetar, após a tomada de posse do novo governo, “um processo negocial com as forças de segurança com vista a reparar a injustiça criada por este governo”, fazendo referência às diferenças remuneratórias entre as diversas forças de segurança. Já o secretário-geral do PS sublinhou a “disponibilidade total” dos socialistas para chegar a um acordo com a classe. No entanto, Pedro Nuno Santos alertou que “é fundamental garantir a ordem e a segurança do povo português” e que “não se negoceia sob coação”.

O “tabu” do pós-10 de março

Questionados sobre se garantiriam a estabilidade do novo governo em caso de derrota do seu partido, os candidatos dividiram-se. Luís Montenegro disse trabalhar em cenário de vitória e não colocou de parte a possibilidade da sua coligação alcançar a maioria absoluta no Parlamento. No caso de cumprir o seu segundo objetivo – vencer as eleições com maioria relativa – promete empenhar-se nas negociações com a Iniciativa Liberal (IL) e com o maior partido da oposição.

Por outro lado, Pedro Nuno Santos, disse que “não votará nem apresentará” uma moção de rejeição contra um eventual governo do PSD, embora não tenha deixado claro se aprovaria o primeiro orçamento desse Executivo. O líder socialista considera ainda que a possibilidade de derrota é um “tabu” para os sociais-democratas.

De resto, Pedro Nuno Santos apontou várias vezes o dedo ao líder da oposição por não responder às perguntas dos moderadores. “Está a ser uma marca deste debate Luís Montenegro não responder ao que lhe perguntam”, disse.

PS promete avançar com a construção do aeroporto, mesmo sem consenso com o PSD

Luís Montenegro aproveitou o debate para relembrar o momento em que Pedro Nuno Santos decidiu, sem o consentimento do primeiro-ministro, que a localização do novo aeroporto seria em Alcochete. O líder da Aliança Democrática referiu ainda que o PSD “salvou o PS de cometer mais uma trapalhada” ao propor a criação da Comissão Técnica Independente.

O socialista justificou a polémica com a sua vontade de “não querer arrastar os pés” no que diz respeito ao avanço do país. Pedro Nuno Santos deixou ainda claro que vai procurar um consenso com o PSD e com os restantes partidos para a localização do novo aeroporto, embora admita que “se ele não existir, vamos decidir e avançar“.

Um só país, duas visões distintas, da economia à saúde

No que diz respeito ao crescimento da economia portuguesa, o líder da AD prometeu fazer crescer o país na ordem dos 3% ao ano. “Com as transformações que vamos fazer – na economia, nos serviços públicos e no Estado – e com a política fiscal que vamos introduzir, que se destinam ao aumento da produtividade e da capacidade exportadora do país, acreditamos que vamos chegar a um crescimento de 3,4% em 2028“, explicou. Em resposta às declarações de Montenegro, o secretário geral do PS acusou a Aliança Democrática de prometer algo que não vai conseguir cumprir, classificando as políticas económica da AD como sendo uma “aventura fiscal“.

Luís Montenegro prometeu ainda valorizações de 4% ao ano, divididas em três eixos fundamentais: valorização das carreiras, atribuição de prémios de produção e aumento do salário médio para chegar aos 1.750€ até 2030. Mas o líder socialista, que pretende negociar as compensações salariais junto das classes profissionais, relembrou que o acordo de rendimentos já aponta para que este valor seja atingido três anos antes.

No que diz respeito ao IRS, Pedro Nuno Santos criticou a proposta de descida da AD, já que significaria abdicar de 16,5 milhões de euros de receita fiscal durante toda a legislatura e colocar em causa a saúde das contas públicas. Em resposta às acusações do socialista, Montenegro disse que Pedro Nuno Santos fez mal as contas, acusando-o de não estar preparado para governar.

Na educação, ambos os partidos prometeram a reposição do tempo de serviço dos professores, uma medida já há muito pedida pelos profissionais. Montenegro culpou o PS pelo pior desempenho dos alunos portugueses alguma vez registado e disse que, caso seja eleito primeiro-ministro, vai desenvolver um plano de recuperação de aprendizagens.

Já o líder do Partido Socialista, que integrou o Governo entre 2015 e 2022, disse ser necessário “aumentar a remuneração dos escalões de entrada para atrair mais pessoas para a carreira docente“, para além da reposição do tempo de serviço.

A discussão do tema da saúde veio acrescentar ainda mais tensão ao debate. Pedro Nuno Santos, contrariando um cenário de degradação do Serviço Nacional de Saúde (SNS), acusou o líder da Aliança Democrática de “não estar preocupado com o SNS“. “Não podemos ignorar que o SNS produz mais do que em 2015. Ao contrário do que o líder do PSD disse ontem num debate, não houve desinvestimento na saúde, houve sim um aumento do investimento”. Não nega, no entanto que o PS “poderia ter feito mais” e admite que o Serviço Nacional de Saúde “está sobre tensão”

Para responder aos problemas do SNS, o líder social democrata diz ter preparado um plano de emergência de 60 dias, que “visa reorganizar a rede de urgências, assegurar o cumprimento do tempo máximo de espera para cirurgias e consultas”. Montenegro assume ainda o compromisso de assegurar que todos os portugueses tenham médico de família até 2025, algo que o PS não conseguiu fazer “por teimosia”. 

Quanto à falta de profissionais, Pedro Nuno Santos acredita que solução do problema deve passar pela formação, e não por “descapitalizar do SNS, dando mais receitas ao setor privado para contratar, retirando mais médicos e profissionais de saúde ao SNS“, referindo-se à complementaridade com o setor privado defendida pelo líder da AD.

Habitação 

Os dois líderes voltaram a discordar, desta vez em relação às soluções para a crise da habitação. Luís Montenegro considerou que devem ser dados incentivos fiscais  a privados para que estes construam habitação acessível. Já o PS defende o aumento do parque público de habitação.

Relativamente às rendas, Pedro Nuno Santos defendeu um limite de subida das rendas de acordo com a taxa de inflação, para além da retirada do teto para o Porta 65. Montenegro disse que esta imposição aos senhorios “não faz sentido” e apontou para o desenvolvimento de uma política de apoio para os cidadãos que “realmente necessitam”.

A três semanas das eleições, restam ainda dois debates: um entre os partidos sem assento parlamentar (20 de fevereiro às 21h00) e um segundo entre todos os partidos com assento parlamentar (23 de fevereiro às 21h00).

Editado por Inês Pinto Pereira