A derrota frente ao Sporting por 0-13 selou a inédita despromoção do CR Candoso a cinco jornadas do fim do campeonato. O JPN esteve à conversa com Sérgio Abreu, presidente do CR Candoso, o treinador Óscar Rosas e o capitão João Francisco Rodrigues para perceber como estão a lidar com a época.
A época 2023/24 do Clube Recreativo de Candoso vai ficar lembrada como uma das piores da história do futsal português: 18 jogos, 18 derrotas e 202 golos sofridos. O clube de Guimarães partiu para esta temporada com um plantel totalmente novo, composto unicamente por jogadores amadores e quase todos oriundos da equipa B. Depois de quatro anos seguidos no principal escalão, a despromoção ficou confirmada depois de uma derrota por 0-13 contra o Sporting CP.
Ao JPN, Sérgio Abreu, presidente do CR Candoso desde 2016, e que, em 2019, acompanhou o clube no maior feito da sua história – a subida à primeira divisão -, lamentou que o clube não tenha conseguido acompanhar a evolução do campeonato. “O que aconteceu é que a Liga Placard atingiu um nível muito elevado. O Candoso sobrevive um bocado dos patrocinadores e houve uma queda muito grande neste aspeto. O investimento teve de ser reduzido em mais de 70%, por isso não pudemos fazer muito mais que isto. Tínhamos a expectativa de alcançar outros acordos que estiveram muito perto de acontecer, mas não se concretizaram”, contou.
O presidente disse que esta época “praticamente todas as equipas da primeira divisão” já são profissionais, o que acabou por dificultar o progresso. “Ainda há dois anos, quase ninguém era profissional, tirando o Sporting, Benfica e Braga. Havia equipas com dois ou três jogadores profissionais, mas de um momento para o outro isto atingiu um nível muito elevado. No ano passado, tínhamos dois atletas profissionais e o resto era jogadores amadores. Mas haviam muitas equipas nesta situação. Este ano, até o Belenenses e o Torreense têm orçamentos dez e 20 vezes maiores que o nosso“, explicou.
A subida à Liga Placard aconteceu de forma muito mais rápida do que o esperado. Sérgio Abreu acredita que talvez tenha sido “um bocado cedo demais” mas que se não tivesse acontecido nesse ano, talvez nunca se tivesse vindo a concretizar. “Diria que aconteceu um bocado cedo, mas também se fosse mais para a frente, com a profissionalização da liga, provavelmente seria impossível. O Candoso, fruto de um trabalho excelente e mérito próprio, acabou por subir. Agora, estamos a levar um pouco com as consequências desta subida rápida. Mas foi o que tinha de ser e estamos a trabalhar para que o futuro melhore”, afirmou.
Na próxima época, o objetivo não passa por sonhar com um regresso imediato à primeira divisão, mas sim construir bases para um crescimento estável. “Estaria a mentir se dissesse que é possível acreditar num regresso imediato. A curto prazo, sei que será muito difícil. Estamos a preparar bases mais sólidas e a trabalhar para que o Candoso cresça com maior estabilidade para que, se acontecer um regresso no futuro, seja uma coisa mais sustentável”, concluiu o treinador.
“Não é por falta de determinação que não temos feito melhores resultados“
Óscar Rosas foi o treinador escolhido para enfrentar o complicado desafio de liderar a equipa para esta temporada. O técnico de 67 anos é também presidente do JD Águas Santas, equipa da Divisão de Honra da AF Porto e treinava a equipa da Maia na época passada. A oportunidade de orientar o Candoso surgiu e resolveu aceitar o desafio, mesmo estando ciente das dificuldades do clube.
“O Candoso tem uma dificuldade que muitas equipas têm. É preciso um treinador com mínimo nível 3 para treinar na primeira divisão e não há muitos cá no Norte. O treinador que estava lá era meu amigo e sugeriu o meu nome. Resolvi aceitar o desafio. A tarefa era muito complicada. Qualquer um que fosse para o meu lugar ia passar as mesmas dificuldades. Mas, de qualquer forma, aceitei e não estou arrependido, nem fui enganado. Já sabia quais eram as condições quando assinei e não voltava atrás na decisão“, contou ao JPN.
O treinador disse que não tem sido fácil manter a equipa motivada, mas aprecia a dedicação dos jogadores perante as já conhecidas dificuldades. “Tivemos de jogar com mais de 90% da equipa B, que estavam na distrital. É difícil. Para eles, para mim, para toda a gente. Todos sabemos que é uma missão quase impossível entrar em campo contra estes adversários muito mais poderosos. No início, ainda havia aquele entusiasmo de defrontarem os ídolos no Sporting e no Benfica, mas isso também passa. Agora é preciso saber realmente motivá-los para darem tudo. E eles têm dado. Não é por falta de determinação que não temos feito melhores resultados. É mesmo por falta de qualidade”, explicou.
Apesar da diferença de pontos em relação aos adversários continuar a ser muito grande, Óscar Rosas acredita que a equipa tem mostrado sinais de melhoria: “Vamos evoluindo também. Aquela ingenuidade do início está a desaparecer aos poucos. Se o campeonato começasse agora, provavelmente, faríamos na mesma zero pontos, mas não teríamos tido tantas goleadas“. A continuidade do treinador no Candoso na próxima época não está garantida e vai depender das condições que lhe forem apresentadas: “Não posso garantir. Se houver reforços que possam permitir lutar pela subida e se for convidado talvez possa continuar. Se não houver condições para ter uma equipa competitiva, provavelmente não”.
Jogadores do Candoso mantêm motivação, apesar dos resultados negativos
João Francisco Rodrigues, mais conhecido como Kiko, é capitão da equipa de Guimarães desde os escalões de formação. Esta época subiu à equipa principal e manteve a braçadeira. O ala de 21 anos afirmou que mesmo que o plantel estivesse ciente da dificuldade do desafio, a sua magnitude chocou na mesma. “Todos sabíamos que ia ser difícil. Desde o início que fomos avisados que ia ser uma tarefa quase impossível. Se calhar não sabíamos é que havia uma diferença assim tão grande. Por alguma razão é chamada a melhor liga do mundo. Mas nós não íamos abandonar o clube numa situação destas”, disse ao JPN.
O capitão do Candoso realçou a força mental do plantel para manter a motivação perante os resultados negativos consecutivos: “A nossa maior vitória da época foi conseguirmos manter a motivação. Com todos os resultados que temos, vamos todos os dias treinar e vamos todas as semanas aos jogos, mesmo sabendo que vai
continuar a ser negativo”. O sentimento de camaradagem entre os jogadores foi crucial para nunca desistirem. “Seguimos sempre com alguma motivação, porque gostamos mesmo uns dos outros e já são vários anos a jogar juntos. Se não houvesse essa intimidade e cumplicidade entre nós, não aguentávamos até ao fim” acredita Kiko.
Apesar de não ser fácil lidar com a responsabilidade, Kiko tentou sempre manter o balneário unido. “É um bocado difícil, porque as pessoas caem todas para mim. Já recebi muitos telefonemas, muitas coisas. Eles sabem, porque já sou capitão deles há uns anos. Mas desde início, mesmo acreditando que era quase impossível, nunca incuti isso para dentro do balneário. Tentei sempre ser o pilar de força lá dentro. Porque isto já está a ser mau, mas, se fossemos logo a achar que já tínhamos descido, ia ser ainda pior”, contou.
Mesmo que a situação do clube esteja longe de ser a ideal, nem tudo foi mau para o plantel. Os jogadores do Candoso passaram de jogar na distrital de Braga para defrontar alguns dos melhores jogadores do mundo. Kiko admite que esta oportunidade foi algo único e que vai guardar para sempre na memória. “Foi incrível. Passámos de estar no sofá a ver os nossos ídolos para jogarmos contra eles. Ainda na semana passada, jogámos contra o Sporting e joguei contra o Merlim, que é o meu ídolo. Ele estava ali, marquei-o e joguei contra ele. Nunca vou esquecer, mesmo sendo na situação que é. Vou poder orgulhar-me e dizer que joguei na melhor liga do mundo“, disse.
O principal objetivo do capitão “é acabar esta época no Candoso e ainda conseguir pontuar“. No que diz respeito ao futuro, não dá para ter certezas: “Depois vou ouvir o que o Candoso tem para me dizer. Se não tiver nada a dizer, é ver o que há por fora e perceber se este ano me ajudou a dar nas vistas”, concluiu.
Editado por Inês Pinto Pereira