De dia ou de noite, a prostituição é uma realidade no Porto. Os carros param e as prostitutas entram, sem medo e com destino incerto.
Prostituição no Porto
Dossiê por Bárbara Oliveira e Marisa Pinho
– “Sujeitas a tudo, até a ser mortas”
– A história de vida de um travesti
– Espaço Pessoa dá apoio a prostitutas há 11 anos
– Carrinha dá apoio na rua
– Vamp: Viatura Móvel de Apoio à Prostituição
– Um percurso da VAMP (primeira, segunda e última paragem)
– Ana Lopes defende debate sobre indústria do sexo”
A poucos dias do Natal, na Baixa do Porto caras desconhecidas enchem as ruas em busca de presentes. Na Trindade, as senhoras que lá vagueiam têm o rosto a nu, familiar aos muitos que conhecem a zona e que as procuram mais nesta época.
Três prostitutas de rua dão a voz pela prostituição no Porto. Preferem trabalhar durante o dia porque têm medo dos perigos que a noite pode trazer. Luísa tem 47 anos e passou mais de metade da vida a prostituir-se. As palavras saem cruas, sem receio, a não ser do incerto de uma vida feita entre becos e calçadas.
É defensora da legalização da sua actividade e explica que as prostitutas “deviam fazer descontos para a velhice [segurança social]”. É que “a carne não dura sempre”. “As mulheres de rua deviam estar numa casa. E o cliente procurava a mulher, o que queria, e pagava o seu devido valor”.
Gracinda tem outra história para contar. Tem 67 anos, está reformada e é prostituta. Já esteve presa. Não gosta do que faz e queria arranjar um emprego “normal”, mas confessa que não tem “outro modo de vida”. A família sabe o que faz e, apesar de ter sofrido muito no início, “todos acabaram por se conformar”.
“Uns são humanos, outros não”
Maria Luísa, de 56 anos, fala abertamente sobre os perigos da prostituição. “Uma vez, um cliente apontou-me a pistola à cabeça dentro do quarto. Disse que não me fazia mal, mas fiquei sempre com medo”. Maria já é avó e o seu desejo é sair da prostituição para que o neto um dia possa conhecer uma mulher diferente daquela que o filho dela conheceu.
Com mais de duas décadas de rua, Maria Luísa trabalha para o agregado familiar. O marido abandonou-a quando descobriu que estava grávida, a nora está desempregada e o filho recebe o salário mínimo. “Há muitos portugueses que ainda não aceitam a actividade e isto tão cedo não vai mudar”, reflecte. Não consegue contar as vezes que foi discriminada – esconde a sua vida para não ser alvo de represálias.
Preservativo: sim ou não?
Ao contrário de outras profissionais do sexo com quem o JPN falou, Maria diz que nunca pratica relações sexuais sem a utilização de preservativo (já recebeu propostas para o fazer). Apesar do uso de contraceptivos ser uma questão que as incomoda, Gracinda e Luísa partilham uma opinião diferente de Maria.
São três mulheres que se prostituem devido à força da necessidade, que muitas vezes faz com que sonhos sejam adiados. Como o de Luísa, que confessa, em tom tímido: “Se pudesse sair da rua, gostaria de cumprir o sonho de ser cabeleireira”.