Em Nogueira da Regedoura, concelho de Santa Maria da Feira, existe um clube que homenageia os muitos emigrantes que saíram desta zona do país para a Venezuela. Com o objetivo de ligar a cultura portuguesa à venezuelana, a ideia de construir o Centro Social Luso Venezolano (CSLV) nasceu num jantar de amigos, tendo sido concretizada em 1985. Mais de trinta anos depois, a associação continua de pé, apesar de não atravessar tempos fáceis, devido ao impacto da COVID-19.

Nas instalações do clube, o JPN encontrou Domingos Ferreira que foi aos 12 anos com os pais para a Venezuela, onde viveu, diz-nos, os tempos de glória do país: “Naquela altura, chegava-se lá com uma mão à frente e outra atrás e no outro dia já éramos ricos“, enfatizou. Domingos vê com bastante carinho “o país que lhe deu tudo“, admitindo que “está aqui, mas tem a cabeça lá“. Um sentimento, aliás, partilhado por todos os que falaram com o JPN. “Todos os emigrantes iam para aquele país chegavam lá, faziam uma empresa e criavam emprego. Por isso, é que conseguimos fazer o que está aqui”, exempificou.

Hoje, passados mais de trinta anos, o centro cresceu. Possui várias salas de festa, restaurante, bar, ginásio, entre outras valências. No entanto, o impacto da pandemia tem-se feito sentir,  como refere Vítor Santos, o presidente. Apesar do regresso de muitos luso-descendentes a Portugal nos últimos anos, o CSLV não tem notado uma maior afluência no dia a dia.

Quando questionados sobre a crise que se tem vivido na Venezuela, não escondem a tristeza que sentem ao ver o estado a que chegou o país onde foram muito felizes. Ricardo Garzón, trabalhador do bar no CSLV, nascido e criado na Venezuela, veio para Portugal recentemente e mostrou-se bastante crítico do regime de Nicolás Maduro. Conta-nos que a polícia tentou por duas vezes sequestrá-lo, juntamente com a sua família, não acreditando por isso numa mudança de políticas venezuelanas nos próximos tempos. “Os militares nunca tiveram tanto poder como agora“, o que torna muito difícil haver uma revolta por parte do povo, afirmou.

CSLV apoia programas para a integração de imigrantes

Face à crescente imigração venezuelana para esta região de Portugal, o Luso Venezolano tem-se associado a iniciativas para que estes sejam bem acolhidos. Desde 2010, trabalham com a Associação de Solidariedade Internacional (ASI), fazendo parte da Rede de Centros de Locais de Apoio à Integração de Emigrantes (CLAIM). Marylin Oliveira, uma das pessoas por detrás da ASI, partilhou com o JPN algumas das principais dificuldades que os venezuelanos sentem na mudança para Portugal.

Os atrasos no SEF são, segundo Marylin, o principal problema que os imigrantes têm pela frente. A demora no processo da sua regularização no país acaba por condicionar a procura de emprego, o arrendamento de casa, entr outros aspetos fundamentais a uma adequada integração. A habitação tem também preocupado a ASI, sendo que muitas pessoas acabam por ir viver com familiares, uma vez que o preço das casas nesta zona do país é muito elevado. Isto leva a que se encontrem  lares onde coabitam três agregados familiares, por exemplo.

Muitos portugueses na Venezuela também não possuem os passaportes em dia, uma vez que nunca pensaram encontrar-se nesta situação. “O contacto com o Consulado na Venezuela é muito complicado“, adverte Marylin que garante já ter alertado o ministro dos Negócios Estrangeiros português sobre o assunto. Questionada sobre se os venezuelanos esperavam ainda regressar ao seu país no futuro, a entrevistada responde na primeira pessoa: “gostava muito de voltar, mas não o irei fazer enquanto este regime se mantiver“, afirmou.

Há poucas décadas, uma nota de 10 bolívares dava para “abastecer o carro três vezes”, dizem-nos. Hoje, até entraram em desuso, pois não se compra nada por esse valor. Foto: André D'Almeida

Mais recentemente, há cerca de um ano, o Centro Social Luso Venezolano também tem colaborado com a iniciativa Venelusos, que brevemente irá passar a ser uma associação sem fins lucrativos. Johnny Gámez, neto de uma madeirense e responsável pelo projeto, explica ao JPN no que é que este consiste. “Enviar encomendas para a Venezuela” é o principal objetivo, mais propriamente medicamentos, alimentos, roupas, tudo o que as famílias dos emigrantes aqui em Portugal querem fazer chegar aos seus familiares na Venezuela. Este programa tornou-se mais importante ainda, devido às complicações que o confinamento impôs aos venezuelanos.

Da esquerda para a direita: Fabiana Pinto; Domingos Ferreira; Marylin Oliveira; Johnny Gámez; Ricardo Garzón. Foto: André D'Almeida

Localizado na Rua da Venezuela, no Lugar da Portela, o Centro Luso Venezolano está aberto todos os dias, das 10h00 às 23h00, com exceção do domingo e da segunda-feira, dias em que fecha às 20h00 e 19h00, respetivamente.

Artigo editado por Filipa Silva

Este artigo foi realizado no âmbito da disciplina TEJ II – Online