A 4 de julho de 2020, o Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia declarou a insolvência da Sociedade Atividades Hoteleiras Galiza Portuense, proprietária da Cervejaria Galiza. O processo foi movido pela Sociedade Real Sabor, um dos fornecedores do restaurante, por dívidas à empresa. 

Com a Galiza fechada, apareceram dois investidores interessados no espaço, um deles com intenção de dar continuidade ao negócio e manter 20 dos 33 postos de trabalho e o outro com interesse apenas nas instalações. A assembleia de credores nomeou o primeiro, a empresa Imparávelpuzzle, empresa de restauração do Porto, para ficar com o espaço. 

Contudo, o processo de insolvência foi, agora, encerrado, depois de o senhorio ter acionado o direito de preferência sobre o espaço, que é um “direito que decorre da lei”, explica Nuno Coelho, representante do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Norte, contactado pelo JPN. 

Após acionado o direito de preferência, ficou agendada para o dia 22 de março a escritura do direito de preferência, à qual o senhorio não terá comparecido, segundo o Sindicato e o trabalhador ouvidos pelo JPN. António Ferreira, empregado há 33 anos na Galiza, acrescenta que o senhorio terá, em paralelo, apresentado uma providência cautelar por considerar que “a casa lhe deveria ter sido entregue quando o espaço fechou” em julho de 2020. 

Com isto, entende o Sindicato de Hotelaria do Norte, o senhorio está a “atrasar o processo” e a “criar dívida na massa insolvente”. “O que estava em cima da mesa era um pagamento de 250 mil euros que seria para a massa insolvente. que depois seria distribuída pelos trabalhadores e credores. O senhorio, ao fazer isto, está a atrasar o processo e vai esvaziando a massa insolvente, porque há rendas a pagar”, afirma Nuno Coelho. O JPN tentou entrar em contacto com o senhorio, mas, sem sucesso, até ao momento. 

Desta forma, o futuro dos trabalhadores continua incerto – o fecho de portas não é definitivo. Nuno Coelho explica que “não há uma decisão nesse sentido [do fecho definitivo]. Mesmo que aquilo tivesse passado para o senhorio, não podíamos dizer que fechou definitivamente, porque não sabemos o que é que ele vai fazer com aquilo. Se vai ser ele a investir no negócio, se vai vender. Não sabemos”.

António Ferreira tem esperança que a decisão do tribunal, no que toca à providência cautelar, seja desfavorável ao senhorio. “Gostaria que conseguíssemos vencer este processo porque para mim, e penso que para alguns trabalhadores também, a Galiza já fazia parte da nossa família e, nesse aspeto, gostaríamos mesmo que voltasse a abrir. Foram muitos anos de familiarização com muitos clientes e isso faz-nos falta”.

Desde julho, os trabalhadores encontram-se no fundo de desemprego, a maioria ainda longe da idade da reforma. 

Tentativa de encerramento coercivo 

A Cervejaria Galiza é um restaurante histórico na zona do Campo Alegre, onde tinha portas abertas desde 1972. No espaço reuniam-se estudantes, artistas e políticos de todo o país. Mas a história deste restaurante é marcada por acontecimentos conturbados. 

António Ferreira, que serviu por mais de três décadas na casa, destaca o episódio que aconteceu a 11 de novembro de 2019. Era uma segunda-feira e os trabalhadores estavam de folga. A noite desta data ficou marcada pela tentativa de encerramento coercivo por parte da proprietária do negócio, Delfina Amaral. Um dos trabalhadores passou, por acaso, pelo espaço e, suspeitando do que estava a acontecer, chamou os restantes – que acabaram por forçar a entrada na Galiza. “Recusá-mo-nos a sair do espaço, porque a polícia tentou que saíssemos. Dialogámos com ela [proprietária] e, ao fim de quatro horas de negociação com o sindicato presente, ela nomeou três pessoas para assegurar a gestão do espaço – eu era uma delas”, lembra António Ferreira. 

António Ferreira, Luís Barbosa e Carlos Carneiro foram os trabalhadores que assumiram a autogestão do estabelecimento, numa tentativa de manter as portas abertas, mas também os seus postos de trabalho. Conseguiram ter a casa a funcionar, mas a situação tornou-se “insustentável”, principalmente depois da chegada da pandemia. 

A cervejaria fechou portas, pela última vez, a 4 de julho de 2020, com a entrada do processo de insolvência por parte do fornecedor. Depois de acionado o direito de preferência pelo senhorio, e com o avanço de uma providência cautelar pelo mesmo, o destino final da Cervejaria ainda não é conhecido. Desta forma, António Ferreira lamenta o que tem vindo a ser noticiado, pois, garante, a Galiza “só vai fechar quando o tribunal disser que a casa é do senhorio” e no caso do senhorio não querer dar continuidade ao negócio. “Só assim é que fecha”, definitivamente, considera o trabalhador. 

Artigo editado por Filipa Silva