Segunda-feira, noite em que o Porto e a Praça D. João I comemoravam os 32 anos da Revolução dos Cravos de 1974, galegos e portugueses entoaram juntos os cânticos de Zeca Afonso, entre outros nomes do 25 de Abril.

Com um cravo vermelho a servir de denominador comum, a Orquestra Folk Son de Seu, de Vigo, e a cantora galega Uxia Senlle (na foto) cantaram “Grândola, Vila Morena” e recordaram as palavras de ordem que “ainda estão vivas tantos anos depois”. “O Povo Unido jamais será vencido”, gritou Uxia. “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”, responderam da plateia os mais entusiastas.

“A Galiza é muito especial porque falam um português esquecido, um português que ficou perdido no meio da história. Há muita gente do lado de cá e do lado de lá que se quer reencontrar. A língua, apesar das diferenças, foi-se desenvolvendo com o passar dos tempos mas continua totalmente inteligível para cada um dos lados. Faz todo o sentido acrescentar à festa portuguesa a componente galega”, afirmou um dos membros da organização, Manuel Leitão do Movimento pela Paz.

Segundo a organização, uma das ideias deste ano era tentar estreitar a ligação entre a Galiza e Portugal, conservar os laços antigos e reafirmar uma cultura e uma tradição que nasceu de raízes comuns. Nada melhor conseguido tendo em conta que a própria convidada especial se auto-denomina “a mais portuguesa de todas as cantoras galegas”.

Uxia Senlle explicou o porque de se sentir tão próxima da cultura portuguesa e tão acarinhada em Portugal e vincou que sente a revolução portuguesa como uma conquista também dela e da Galiza. “A minha ligação a Portugal vem de longe. Começou porque sou galega, logo a proximidade linguística e geográfica é óbvia. Entretanto fui tendo cada vez mais conhecimento quanto à música de Portugal, à sua literatura e à sua história, e da história faz parte a revolução do 25 de Abril, como uma das mais formosas e marcantes revoluções do mundo. Para mim foi sempre uma referência”, diz ao JPN.

Esta cantora galega pertenceu a um grupo de Folk chamado Ma Lua, foi o primeiro grupo de folk galego a introduzir elementos da música tradicional portuguesa e adoptar as músicas fronteiriças.

“A música popular portuguesa é muito rica. Para mim é das que melhor sabe agrupar o presente e a mensagem transmitida todos os dias e as raízes, as ligações à terra e ao povo. Tanto Fausto com Zeca Afonso são grandes nomes da cultura musical portuguesa e da poesia de intervenção. Foram meus maestros, minhas inspirações e meus mentores”, conta Uxia.

A acompanhar esta artista galega, também viajou para Portugal uma orquestra de folk galego, a Son de Seu. Também o director da escola Rodrigo Romani se sente ligado a Portugal e à revolução dos cravos. E explica que mais do que vir fazer um espectáculo a Portugal, os músicos galegos vieram homenagear os portugueses lutadores de Abril. “Hoje no ensaio explicava aos músicos da orquestra que cantar a Grândola não é como cantar uma canção qualquer. Mesmo galego, eu sei o que significa e significou Grândola em Portugal. Para mim esta canção tem muito mais significado do que uma mera troca de regime político, é o cântico que mostra a força do povo”.

“O 25 de Abril também foi importante para a Galiza. De repente os nossos vizinhos tinham dito: “Acabou-se!” Nós vivíamos em plena ditadura de Franco mas pelo menos pelo lado português já se podia circular e falar livremente”, conta.

De mãos dadas

Tanto Uxia Senlle como Rodrigo Romani prometem voltar e continuar a estreitar laços entre Portugal e Galiza para não deixar nunca morrer uma “irmandade” que às vezes parece esquecida.

“Há que insistir para que não se percam os laços entre os dois lados da fronteira e estou convencido que tem de ser a gente da cultura, os artistas a manter viva essa convivência”, comenta Romani.

Texto e foto: Paula Teixeira