Quase metade dos jovens portugueses não se identifica com uma religião. Mas se em Portugal a percentagem está nos 42%, esse valor chega aos 91% na República Checa. Em Israel, em contraponto, apenas 1% dos jovens não professa uma crença religiosa. Os dados constam do relatório “Jovens Adultos Europeus e a Religião” feito por Stephen Bullivant, professor de Teologia e Sociologia da Religião na Universidade de St Mary, em Londres, e diretor do Centro Bento XVI para a Religião e a Sociedade.

Entre os 22 países estudados, os jovens portugueses estão no sétimo lugar entre os mais religiosos.

Helena Vilaça, investigadora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) e especialista em Sociologia das Religiões, defende que o facto de um jovem não se identificar com uma religião instituída não significa a ausência de uma dimensão espiritual na sua vida: “Isto não quer dizer que as pessoas não tenham interrogações de natureza existencial. As pessoas podem não ser religiosas, mas podem ser espirituais e, assim, buscar um determinado tipo de espiritualidade”, explica a investigadora ao JPN.

De acordo com a Helena Vilaça, os jovens não se associam a uma religião, porque criam a sua própria espiritualidade, através da “busca de ingredientes em diferentes religiões”.

“Pode haver algo nas religiões tradicionais que eles concordam e até seguem, mas, ao mesmo tempo, podem acreditar na reencarnação ou nos contactos com o Além”, exemplifica a socióloga.

Diminuição de jovens portugueses nas igrejas católicas é a tendência

O estudo de Bullivant mostra que, dos 57% de jovens portugueses que se identificam com o Cristianismo, 53% destes são católicos.

Ao JPN, o padre Filipe Diniz, diretor do Departamento Nacional da Pastoral Juvenil, admitiu que a diminuição de jovens nas igrejas é algo que tem visto acontecer e que esta tendência se relaciona com a educação: “A formação tem a ver com as nossas bases familiares: aquilo que nos é proposto, que nos desperta para uma continuidade religiosa, e, muitas vezes, essa formação não existe”.

Em Portugal, 23% dos jovens adultos dizem rezar pelo menos uma vez por semana, enquanto 41% admitem nunca rezar.

Entre os jovens católicos, 27% dos jovens portugueses entre os 16 e os 29 anos vão à missa pelo menos uma vez por semana; quase um em cada cinco (17%) nunca vai à igreja.

Para o padre Filipe Diniz, este dado não é preocupante porque “a religião católica não se pode medir por uma questão de exercício da Eucaristia dominical”. Contudo, o responsável da Pastoral Juvenil aponta que o principal fator para a ausência nas missas passa pela falta de envolvimento dos jovens.

“Não estando entusiasmados, os jovens deixam de fazer parte. O jovem necessita de integração. Se está integrado, sente-se envolvido e fica”, considera o padre Filipe Diniz.

Ter religião nos dias de hoje é “politicamente incorreto”

Helena Vilaça lembra que há uns séculos, era “correto ser católico e ir à missa todos os domingos”. “A religião ficou muito rotinizada e muito ritualista”, referiu a especialista.

Hoje, já é “politicamente incorreto” ser católico porque “no círculo das amizades, se o jovem é religioso, até é objeto de chacota”, sublinha a socióloga.

Para a especialista da FLUP, a religião associada à identidade nacional, como é o caso do catolicismo em Portugal, “é quase transformada num serviço público. A pessoa vai buscar a parte que lhe interessa e quer moldar às suas próprias necessidades”.

A Igreja está a competir para reverter esta tendência

Segundo o padre Filipe Diniz, o papel da Igreja é lançar desafios, “para despertar consciências”. Contudo, para o sacerdote, a melhor forma de chamar jovens é com jovens. “São os próprios jovens que vão ser dinamizadores uns dos outros e dando um pouco o rosto de uma igreja que acolhe”, revela.

Helena Vilaça concorda com esta ideia, usando como exemplo “o acompanhamento maior dos jovens” e o “insistir no compromisso dos pais de levar os filhos à catequese para irem à missa”.

“A igreja católica está a aprender a competir.  Quando há padres que têm um perfil mais carismático, nós vemos essas paróquias completamente cheias. Pode ter uma missa mais leve, com música mais contemporânea e com a forma de comunicar nas homilias que vai mais ao encontro das necessidades das pessoas”, explica a socióloga.

A República Checa é o país europeu menos religioso

Os investigadores do relatório “Jovens Adultos Europeus e a Religião” destacam que, em 12 dos 22 países estudados, mais de metade dos jovens adultos declaram não se identificar com uma religião. O país menos religioso é a República Checa, com 91%, seguindo-se a Estónia, a Suécia e a Holanda, que se situam entre os 70% e os 80%. O oposto é Israel, com 1% de jovens não religiosos, seguindo-se a Polónia (17%) e a Lituânia (25%).

O estudo inclui a filiação religiosa de jovens adultos dos 16 aos 29 anos de 22 países da Europa. Bullivant usa dados recolhidos no European Social Survey (ESS), nas edições de 2014 e 2016, para fazer um retrato da prática religiosa dos jovens.

O relatório foi publicado no ano em que o Vaticano se prepara para um Sínodo dos Bispos a realizar-se em outubro. As conclusões do trabalho devem contribuir para a discussão entre o Papa e os bispos de todo o mundo sobre a forma como a Igreja Católica se relaciona com os jovens.

Artigo editado por Filipa Silva