“Avec amour et acharnement” (2022), em português “Com amor e com raiva”, é a mais recente longa-metragem da cineasta francesa Claire Denis, que lhe deu o Urso de Prata no Festival de Berlim. O filme esteve em antestreia nacional no Batalha Centro de Cinema, no passado sábado (28), e estreia em Portugal no dia 9 do próximo mês.

A realizadora Claire Denis conta com um bom repertório, com obras cinematográficas como “Beau Travail” (1999), considerado um dos maiores filmes da sua década, “Chocolat” (1988), entre outros. “Avec amour et acharnement” foi digno de receber o prémio de “Melhor Realização” no Berlinale.

O drama de Claire Denis chega aos ecrãs portugueses a 9 de fevereiro. Foto: Edison Sanchez

A história retrata o triângulo amoroso entre Sara (Juliette Binoche), Jean (Vincent Lindon), o homem com quem mantém uma relação há uma década, e François (Grégoire Colin), o seu há muito amado, com quem se reencontra – e, imediatamente, é remetida para todos os sentimentos que outrora teve por ele.

Num enredo que pressupõe, desde o início, infidelidade, Denis não se deixa levar pelos clichês e apresenta uma obra complexa, evidenciando a sua mise-en-scène, que conduz o público para a interpretar como algo mais que uma simples traição.

É através do contraste entre os planos exteriores (varanda) e interiores da casa onde Sara e Jean vivem juntos que é representado o suspense que espoleta a curiosidade e, quiçá, desconfiança dentro do casal.

“Avec amour et acharnement” é um filme que utiliza a corporalidade como forma de expressão.  A elevação do toque e das palavras como fio condutor das ações funciona na perfeição e concede a esta fita poder sobre o argumento.

De certa forma (e ainda que, nas cenas que se complementam, haja uma contradição que cria um cómico de situação), a realizadora faz com que olhemos para as personagens exatamente como elas são: imperfeitas, movidas pela emoção e impulsivas.

No fundo, Denis faz o retrato perfeito do ser humano, ambicioso e emotivo.

Juliette Binoche encarna “Sara” no triângulo amoroso.

A personagem Sara destaca-se pela sua dualidade de sentimentos, assim como pela ideia de que é duas pessoas diferentes. Mergulha profundamente em qualquer emoção que lhe apareça, descartando por completo qualquer que seja a consequência das suas ações.

Para além das questões morais que o filme evoca, Claire Denis vai buscar temas como a dominância do branco sobre o negro e a sua ignorância face às questões raciais que não lhe concernem – como é exemplo Jean, um pai branco, que tem um filho negro, e, por isso, não compreende a realidade do mundo do mesmo.

Jean é também um ex-presidiário que tem de lidar com a dificuldade de arranjar emprego e refazer a sua vida. Sustentado por Sara, Jean passa os dias a ir ao supermercado e pouco mais, até receber uma oferta de trabalho de François.

Esta é uma obra cinematográfica que prima pelo seu realismo: quer através dos planos que, por vezes, fazem com que pareça que os nossos olhos são a câmara que acompanha o desenrolar da ação, quer pelas situações extremamente relacionáveis – como a situação pandémica e a rotina do dia a dia, repetida vezes e vezes sem conta.

É com uma sensação claustrofóbica que esta longa-metragem nos deixa, fazendo-nos questionar sobre a liberdade do ser humano e fazendo uma retrospetiva de um amor profundo, ainda que este seja por duas pessoas diferentes.

 “Avec amour et acharnement”, ao invés de retratar a história de relações falhadas, recorrente no mundo do cinema, explora todos os caminhos possíveis na luta de um amor durador

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira