Após um afastamento de 15 anos, Todd Field regressa ao grande ecrã com “TÁR”. Protagonizada por Cate Blanchett, a fita está, agora, nomeada a várias categorias dos prémios da Academia.
Lydia Tár (Cate Blanchett) encontra-se no topo do mundo. A maestrina e compositora não lidera apenas uma orquestra, mas também é pioneira numa indústria de música clássica levada por homens. Contudo, não é só de orquestrar que vive. Tár, que acompanhamos ao longo do filme, é uma manipuladora nata caracterizada por segredos sujos e uma vida de fachada.
É mais complexa do que aparenta ser e são forças que nem a mesma consegue controlar que vão desvendando os seus mistérios – e corroendo o seu poder. Neste nomeado ao Óscar de Melhor Filme há um carrossel de emoções que levam à queda eminente de uma artista genial.
A longa-metragem, que no início poderá ser enfadonha devido aos termos musicais e cenas muito complexas e cansativas, transporta-nos para a vida de uma mulher que tenta ter sempre tudo sob o seu controlo, tanto na vida profissional como pessoal. Uma mulher que usa e abusa do poder que lhe foi dado para conseguir cada vez mais poder e sentimento de posse sobre os mais próximos a ela.
Na realidade, o que faz deste filme uma obra-prima é a atuação brilhante de Cate Blanchett. Todd Field soube conduzir – levando-nos a conhecer os podres de Tár mais a fundo com o avanço da narrativa. Mas foi a maneira como a atriz os abordou e tomou a personagem para si que transformaram o filme em algo mais especial. Com, talvez, o papel mais desafiador da sua carreira, a australiana fez-nos acreditar que a batuta que tinha na mão durante a película realmente lhe pertencia. É igualmente quem nos convence a ficar até ao fim.
O elenco coadjuvante também é essencial e acabou por trazer mais camadas à protagonista. Noémie Merlant, como assistente, e Nina Ross, como esposa, possuem intervenções mais discretas mas que ajudam a atingir o clímax da história.
Outra coisa surpreendente da longa-metragem foi a sua divisão – partida em atos, assim como a própria maestrina. Neste caso, todo o mérito pertence ao argumento de Todd Field. Desta forma, “TÁR” começa por nos mostrar a encenação do poder absoluto e acaba no desgaste desse mesmo poder.
O filme trata a cultura de cancelamento – mas não só. É muito mais que acabar com a carreira de uma artista pelos seus erros e contradições. Vai à raiz do poder e destrói a personagem por completo. E não só. É o poder retratado numa figura feminina. Permite à mulher esse lugar – o de manipular e convencer os seres inferiores à sua volta. E isso não é muito comum no cinema.
Passamos o tempo todo a querer saber tudo o que envolve a macabra personagem principal. Porém, nada obtemos – e é essa a parte fenomenal da película. Cabe ao espectador descobrir e imaginar certos aspetos da história e essa pode mudar de acordo com a mentalidade de cada um. Lydia Tár pode ser um ser asqueroso ou uma prova de superação. Tudo depende da perspetiva. Ganha por nunca parar de questionar o espectador, mas nunca respondendo às perguntas que o mesmo faz.
Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira