Na segunda-feira (19), o Governo português aprovou o diploma que visa mudar os estatutos de 12 ordens profissionais. Além de procurar “eliminar barreiras de acesso à profissão”, a proposta de alteração, que terá de passar pelo Parlamento, quer acabar com os estágios não remunerados nas ordens. O Executivo quer que os estagiários sejam pagos com pelo menos 950 euros por mês, isto é, um salário mínimo acrescido de 25%, nos valores atuais.

A ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, afirmou, na conferência de imprensa que o Governo promoveu sobre a reforma, que esta remuneração visa “garantir que nenhum jovem licenciado ganha o salário mínimo”.

A proposta do Governo

A governante esclareceu que o “objetivo é o combate à precariedade”, e por isso “acabar com os estágios gratuitos” é uma das medidas integradas na reforma dos estatutos das Ordens profissionais.

Depois de em maio ter concluído a adaptação dos estatutos de oito ordens, agora são abrangidas pelas propostas do Governo mais 12 ordens: dos Médicos Dentistas, dos Médicos, dos Engenheiros, dos Notários, dos Enfermeiros, dos Economistas, dos Arquitetos, dos Engenheiros Técnicos, dos Farmacêuticos, dos Advogados, dos Revisores Oficiais de Contas e dos Solicitadores e Agentes de Execução. Nestas ordens, os estágios profissionais são obrigatórios para exercício da profissão.

Para combater entraves ao acesso laboral, Ana Catarina Mendes acrescenta que quem não tem condições económicas “pode ficar isento ou ver reduzidas as taxas no acesso à profissão”. Além disso, a ministra afirma que serão “removidas provas que hoje são exigidas nas várias ordens profissionais e que funcionam como uma dupla barreira”, e que haverá também uma “redução dos exames obrigatórios atualmente”.

O diploma inclui os cidadãos estrangeiros em Portugal e pretende que estes tenham “um reconhecimento das suas qualificações” e que “não seja obstacularizado o exercício da profissão”.

Bastonários não estão satisfeitos

A proposta do governo não é vista com bons olhos pela Ordem dos Advogados (OA) e pela Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução (OSAE). Em declarações ao “Jornal de Negócios”, Fernanda de Almeida Pinheiro, bastonária da OA, explica que a maioria dos patronos não têm possibilidades de pagar o valor mínimo de 950 euros mensais, acabando por dificultar o acesso à profissão dos jovens licenciados por falta de estágio. Ao mesmo jornal, o bastonário da OSAE, Paulo Teixeira, afirma que esta proposta “está feita a pensar nas grandes sociedades de advogados de Lisboa ou Porto que, mal ou bem, já remuneram os seus estagiários”.

Parlamento Europeu quer estágios remunerados em todos os estados-membros

Também no plano europeu se discute e avança no sentido de combater os estágios não remunerados. No dia 8 de maio, foi aprovado na Comissão de Emprego e Assuntos Sociais um relatório que promove os estágios pagos. Em declarações ao JPN, José Gusmão um dos dois eurodeputados portugueses envolvidos – o socialista João Albuquerque também votou favoravelmente a proposta -, sublinha que este documento assegura a formação profissional e estabelece critérios de remuneração e proteção social. O relatório propõe que esta seja uma medida legal para todos os estados-membros, e por isso os países não podem escolher não remunerar os estágios.

O que vai acontecer agora?

O Parlamento Europeu não tem poder de iniciativa legislativa. Como tal, o relatório foi enviado à Comissão Europeia para que se avance com uma proposta diretiva – na qual será incluído um prazo para a União Europeia adotar a medida. Depois, regressará ao Parlamento. José Gusmão afirma que Nicolas Schmit, o Comissário Europeu do Trabalho e dos Direitos Sociais, tem interesse em avançar com uma proposta como esta.

Confrontado com a possibilidade de as empresas poderem tentar contornar a hipotética legislação, alterando, por exemplo, designações dos estágios, o bloquista considera que  “não será assim tão fácil” as empresas arranjarem soluções que deem a volta à medida. “De acordo com o Direito de Trabalho, uma empresa não pode ter alguém a trabalhar e chamar-lhe qualquer coisa. As pessoas ou estão a trabalhar para a empresa com um contrato de trabalho ou estão a trabalhar para a empresa ao abrigo de qualquer outra figura legal reconhecida. Uma empresa não pode inventar simplesmente uma figura que não existe e dizer que é isso.” O eurodeputado português deu como exemplo os voluntariados, que também têm enquadramento legal próprio.

De acordo com dados da Comissão Europeia, quatro em cada cinco jovens da União Europeia fez pelo menos um estágio para integrar no mercado de trabalho.

Editado por Filipa Silva