Autarca e esposa foram condenados pelo Tribunal de Vila Nova de Gaia por peculato de uso. Em causa, o uso de um carro da autarquia para fins pessoais. Presidente da autarquia gaiense fala em "total injustiça" e anuncia recurso para a Relação.

Eduardo Vítor Rodrigues é presidente da Câmara de Gaia desde 2013. Foto: CM Gaia

O presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, foi esta terça-feira condenado em tribunal a perda de mandato e ao pagamento de uma multa de 8.400 euros pelo crime de peculato de uso. Igual multa foi determinada pelo Juízo Local Criminal de Gaia para a esposa do autarca, Elisa Rodrigues. Eduardo Vítor Rodrigues não assistiu à leitura da sentença, nem prestou declarações em tribunal durante o julgamento, mas já anunciou que vai recorrer da decisão.

O tribunal deu por provado que o casal usou para fins pessoais um veículo elétrico adquirido para empresa municipal Águas de Gaia, o que o presidente da autarquia gaiense refuta.

“A decisão hoje [terça-feira] pronunciada pelo Tribunal de Gaia, contra o Presidente da Câmara de Gaia, por factos que são dados pelo próprio Tribunal como nulos, é uma total injustiça, contra a qual reagirei recorrendo para a Relação e repondo a verdade e a justiça”, refere uma breve nota enviada aos jornalistas por fonte oficial da autarquia.

Os factos imputados ao autarca e à esposa remontam ao ano de 2017. Com base numa denúncia anónima, o caso foi investigado pela Polícia Judiciária (PJ) e o Ministério Público (MP) acabou por produzir um despacho de acusação segundo a qual os arguidos “decidiram usar, como se fosse seu”, um veículo elétrico adquirido em regime de locação financeira pela empresa municipal Água de Gaia, informou a Agência Lusa, que teve acesso ao despacho.

O MP considerou que Eduardo Vítor e a esposa “beneficiaram indevidamente” de 4.916 euros, valor das oito rendas da locação do carro, correspondente às prestações entre novembro de 2017 e junho de 2018. 

O autarca e a esposa chegaram a pedir a abertura da instrução do processo ao Tribunal de Instrução Criminal do Porto, mas esta instância decidiu, em dezembro de 2021, que o caso devia seguir para julgamento nos termos da acusação deduzida pelo MP.

Já na leitura da sentença, esta terça-feira, a juíza de Gaia considerou que o presidente da câmara cedeu o automóvel à sua esposa e que esta o utilizou para deslocações de trabalho e de lazer entre maio e junho de 2018, conforme corroborado por registos fotográficos e vigilâncias conduzidas pela investigação.

A b de Eduardo Vítor Rodrigues, refere o JN, pediu, por várias vezes, a nulidade destas diligências por as considerar “feridas de legalidade”.

A 31 de outubro, data de arranque do julgamento, o presidente da Câmara de Gaia não prestou declarações em tribunal, mas falou à saída. Em declarações reproduzidas pela Agência Lusa, o autarca explicou que o veículo em causa no processo – um Renault Zoe – foi comprado com o objetivo de servir a população idosa do centro histórico de Gaia que ficou sem acesso a transportes públicos próximos, depois das obras efetuadas na Avenida Diogo Leite. 

“As obras no centro histórico acabaram por ser inauguradas em véspera de São João pelo primeiro-ministro, houve uma derrapagem do tempo das obras, enquanto isso não aconteceu, o presidente da câmara, em vez de andar de Tesla ou Mercedes, andava num Renault Zoe e utilizava-o porque ele estava afeto à presidência”, declarou, acrescentando que, depois da inauguração da marginal, a viatura foi afeta ao serviço para o qual terá sido adquirida.

Ainda no arranque do julgamento, o socialista, que é também presidente da Área Metropolitana do Porto, garantiu que “em nenhum momento” usou, ele ou a mulher, os carros da autarquia para fins privados ou pessoais, apontando que o carro em causa “estava caracterizado e não era possível disfarçar”.

Quanto ao silêncio na sessão de julgamento, o autarca referiu que não considerou “oportuno” falar nessa fase.

Apesar da decisão do tribunal, o autarca mantém-se para já em funções, uma vez que a apresentação de recurso suspenderá a decisão que só terá validade quando transitada em julgado, isto é, quando e se se esgotarem os recursos judiciais possíveis para a tipologia criminal em causa.

Eduardo Vítor Rodrigues é presidente da Câmara Municipal de Gaia desde 2013. Cumpre, nesta altura, o terceiro e último mandato à frente do município, que governa com maioria absoluta desde 2017.

Em maio deste ano, o seu nome apareceu num outro processo, relativo à contratação de um funcionário. Nessa altura, as autoridades judiciais fizeram buscas na câmara relativas a este processo e a um outro, de maior dimensão, conhecido como Operação Babel. Esta operação, que envolve alegadas contrapartidas e favores decorrentes de grandes investimentos imobiliário do Grupo Fortera no concelho, não atingiu diretamente o autarca, mas o Executivo por ele liderado, uma vez que foi detido e constituído arguido o vice-presidente da autarquia à altura, Patrocínio de Azevedo, que entretanto renunciou ao mandato.