“O Reino Unido deve permanecer como membro da União Europeia ou sair da União Europeia?” é a pergunta à qual os britânicos vão ser chamados a responder num referendo que pode acontecer ainda em 2016. A eventual saída do Reino Unido da União Europeia (UE), conhecida como Brexit, foi um dos temas discutidos no Conselho Europeu que começou na quinta-feira.
Longe de haver um consenso, os líderes europeus discutiram o plano de exigências entregue em outubro por David Cameron, primeiro-ministro britânico, a Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu. O Reino Unido quer renegociar os seus termos de adesão em quatro áreas chave: soberania, economia, competitividade e imigração.
Caso o Brexit aconteça, esta decisão pode afetar os mais jovens porque vão sofrer as consequências da saída, a longo prazo.
Três jovens, três visões
Robert Winterton tem 21 anos e nasceu em Southampton. Atualmente vive em Washington e trabalha na área dos media digitais. É a favor da saída do Reino Unido da União Europeia. Isabel Douglas tem 16 anos, vive e estuda em Birmingham. É contra o Brexit. Filipa Gonçalves é uma portuguesa entre ingleses. Tem 23 anos e vive em Leicester há dois anos. Trabalha num armazém da Disney. Para Filipa, a saída do Reino Unido da UE tem prós e contras. “Muito honestamente”, Filipa duvida “se os ingleses estariam melhor sem a Europa, porque são muito independentes e orgulhosos”.
UE: Uma realidade distante?
Robert acredita que a UE tem uma “natureza antidemocrática”, na qual não confia e considera que as instituições europeias “tomam o poder das pessoas”, que perdem a sua soberania. Este é um dos objetivos de David Cameron na negociação com os restantes Estados-membros da UE. O chefe de governo britânico quer mais autonomia e capacidade de decisão nas questões europeias.
Isabel Douglas defende que a “Comissão [Europeia] é muito grande” e que, por isso, “torna-se mais difícil tomar boas decisões”. “O que é bom para um país, pode não ser bom para outro”, explica.
Robert e Isabel veem a União Europeia como uma realidade distante, o que torna “difícil simpatizar com a instituição”. Segundo Robert “as pessoas não se sentem ligadas às decisões que a UE toma, muito porque estas decisões não tem a qualidade que poderiam ter se fossem tomadas através de escrutínio público”.
Euro vs Libra
Outra das exigências de Cameron é uma maior equidade entre os Estados-membros da zona euro e Estados-membros com outra moeda. Apesar de estar fora do euro, o primeiro-ministro quer ter direito de veto sobre as decisões relativas à moeda única. O presidente francês, François Hollande e o ministro dos negócios estrangeiros português, Augusto Santos Silva, afirmaram que não estão dispostos a fazer esta cedência.
Isabel concorda com a exigência feita por Cameron. “A Grã-Bretanha e outros países não devem ser prejudicados pelo facto de terem uma moeda diferente”, expõe.
Filipa Gonçalves é perentória na resposta: “Não, de todo, nunca!”. É da opinião que o Reino Unido “perderia imenso com a mudança para o euro, assim como Portugal perdeu”. Já Robert acredita que “o euro foi mal administrado desde o início, por interesses políticos irresponsáveis”.
Imigração: fechar ou não fechar fronteiras?
A imigração é o ponto mais controverso da discussão. Os ingleses pretendem controlar e diminuir os benefícios dos cidadãos, de outros países da UE, que trabalham no Reino Unido. O objetivo é dissuadir a entrada de novos imigrantes.
Filipa Gonçalves explica a situação: “Há muita injustiça porque basta ser cidadão europeu, viver aqui três meses e ter filhos, para ter direito a um plafond de 500 libras por semana”. Um dos motivos para o Brexit é que “a Inglaterra já contribuiu muito para a União Europeia”, acrescenta.
Tusk, presidente do Conselho Europeu, já cedeu a uma das exigências de Cameron: o “travão de emergência” que vai permitir limitar os apoios sociais aos trabalhadores imigrantes. Assim, qualquer Estado-membro vai ter a possibilidade de limitar os benefícios dos imigrantes. Esta decisão está sujeita à aprovação dos restantes membros.
Mas, para Isabel, o Reino Unido não deve fechar as fronteiras aos imigrantes e alerta para o facto de muitos “tirarem proveito do facto da Grã-Bretanha ser um estado social”.
Como emigrante, Filipa reconhece que os que vão viver e trabalhar para o Reino Unido “são muito injustos para o governo inglês”. Filipa chega mesmo a afirmar que “existem casos de imigrantes que pedem ajudas ao Estado” de forma exagerada. Ao controlar os benefícios dados, ” o Reino Unido está a tentar proteger-se”, explica.
No entanto, com esta medida pode estar em causa o princípio da livre circulação de pessoas e da igualdade de direitos entre os cidadãos europeus. Robert alerta para o facto de “as pessoas terem o direito natural de se deslocar para o país que quiserem, como também é economicamente certo fazê-lo”.
“Acredito que o Reino Unido deve aceitar tantos imigrantes quanto possível”, reitera o britânico. Robert considera que os imigrantes são uma mais valia, uma vez que “trazem crescimento e inovação para a economia”. O argumento de que os imigrantes podem “roubar” o trabalho qualificado aos nativos não se justifica no entender de Filipa. “Os imigrantes não têm postos altos, não substituem os ingleses em nada”.
A portuguesa acrescenta até que numa entrevista de emprego, um imigrante “perde contra o inglês”. Isabel partilha da mesma opinião , mas tem uma visão diferente. Para a estudante inglesa os imigrantes parecem conformados “ao fazer um trabalho mal pago no Reino Unido, o que significa que a maioria dos empregos bem remunerados continuam disponíveis para os britânicos”.
Até ao momento não existe consenso entre os chefes de Estado e de governo de forma a evitar o Brexit. As negociações vão se estender pelo fim de semana.
Segundo uma sondagem realizada pela YouGov, para o The Times, nos dias 3 e 4 de fevereiro, 36% dos inquiridos quer ficar na UE, enquanto 45% quer sair, após o esboço do acordo ter sido anunciado por Tusk. Se o referendo fosse esta sexta-feira, estávamos de regresso à Europa dos 27.
Texto editado por Sara Gerivaz