Pessoas homossexuais deixarão definitivamente de ser discriminadas pela sua orientação sexual no acesso à doação de sangue. A notícia da atualização da Norma nº 009/2016 – que define os critérios de inclusão e exclusão de dadores de sangue por comportamento sexual – foi dada pela Direção-Geral da Saúde (DGS) esta sexta-feira (19).

Esta atualização surge na sequência da conclusão, pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), do estudo sobre “Comportamentos de risco com impacte na segurança do sangue e na gestão de dadores: critérios de inclusão e exclusão de dadores por comportamento sexual”, que tinha resultado na formação de um grupo de trabalho responsável pela revisão da norma em vigor . Tendo em vista um “processo inclusivo e participativo”, foi igualmente auscultada a sociedade civil, lê-se no comunicado da DGS.

A Direção-Geral da Saúde reforça que a avaliação das pessoas candidatas à dádiva de sangue durante a triagem clínica deve ser realizada de acordo com os princípios da não-discriminação, previstos no art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa, na Base 2 da Lei de Bases da Saúde, bem como na Resolução da Assembleia da República n.º 39/2010 de 7 de maio.

Esta é uma avaliação individual que tem em vista a examinação do risco relacionado com comportamentos da pessoa candidata à dádiva de sangue, com vista a garantir a segurança das pessoas recetoras. Contudo, por altura do último apelo feito pelo IST à dádiva de sangue, surgiram denúncias que demonstravam que alguns profissionais de saúde responsáveis pela triagem não seguiam a norma em vigor e baseavam-se na orientação sexual dos dadores, ao invés de nos comportamentos de risco.

Esta atualização da norma estabelece que “a pessoa candidata a dádiva deve ser esclarecida e informada, de forma não-discriminatória, sobre os comportamentos com potencial exposição ao risco infecioso e as suas formas de prevenção, e estabelece os períodos de suspensão da dádiva iguais para todas as pessoas”, pode ler-se no documento.

ILGA Portugal considera que a norma adquiriu um “cariz histórico”

A associação ILGA PORTUGAL – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo (LGBTI) considera que, depois de “depois de anos de denúncias e pressão pública pelo fim da discriminação de homens gays e bissexuais dos contextos de dávida”, a norma toma agora um “cariz histórico” por ter contando com a participação e envolvimento da sociedade civil.

No comunicado publicado no site da instituição, a organização afirma que esta é “a primeira norma com linguagem inclusiva” reconhecendo “esforço da nova redação pelo aumento da literacia para a saúde e adesão aos critérios científicos” e dá ainda destaque à “inclusão de uma nota revogatória e exclusiva para impedir que a interpretação da norma seja feita à luz de preconceitos ou documentos publicados paralela ou anteriormente”.

Marta Ramos, diretora executiva da ILGA Portugal, no mesmo comunicado, refere que ainda existe trabalho a ser feito e sublinha a “urgência” de haver mais debate cientifico em relação á dádiva por parte de “pessoas trabalhadoras do sexo e pessoas utilizadoras de drogas injetáveis e inaláveis, tal como em relação a alguns comportamentos considerados de risco infecioso acrescido”.

A instituição ressalva ainda que o questionário que é apresentado aos candidatos à dádiva de sangue “pode ser melhorado”, uma vez que “confunde os conceitos de sexo, identidade e características sexuais, erradamente ligando as pessoas intersexo a identidades e expressões de género não binárias” – revisão pela qual a associação garante que continuará a lutar.

A presente norma entrou em vigor na passada sexta-feira (19) reservando-se, no entanto, um período de três meses para a transição e atualização do questionário e do manual de triagem clínica de dadores pelo Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST). Segundo o comunicado, o IPST começou já na sexta-feira (19) a solicitar a todos os Serviços de Sangue que fosse disponibilizada informação e formação a todos os profissionais qualificados envolvidos na seleção de pessoas candidatas à dádiva de sangue.