O Politécnico do Porto festejou, esta quinta-feira, no Teatro Rivoli, 31 anos. Enquanto decorriam as comemorações no interior, à porta, estudantes gritavam contra a reestruturação do instituto.

O relógio marca as 17h35 e os primeiros convidados entram no Rivoli. O átrio fica cheio de caras conhecidas e os alunos da Escola Superior de Engenharia Industrial e Gestão (ESEIG) começam a servir as primeiras taças de champanhe.

No exterior, os colegas da mesma escola distribuem cartazes entre si. À ESEIG, juntam-se estudantes da Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo (ESMAE) e da Escola Superior de Educação (ESE). A manifestação contra a reestruturação do Instituto Politécnico do Porto (IPP) está prestes a começar.

Entretanto, no interior, as portas do Grande Auditório Manoel de Oliveira abrem-se e os convidados enchem a sala. A presidente do IPP, Rosário Gambôa, entra acompanhada do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor. As luzes apagam-se e a sessão abre com atuações de alunos de várias escolas do Politécnico.

O Grande Auditório Manoel de Oliveira, no Rivoli, encheu-se de caras conhecidas

O Grande Auditório Manoel de Oliveira, no Rivoli, encheu-se de caras conhecidas Foto: Francisca Figueiredo

O lema “Fazemos o presente orientados para o futuro” é enunciado várias vezes durante a cerimónia de comemoração, principalmente no discurso de Rosário Gambôa. “Feliz a presidente de uma escola assim”, é a frase que marca a sua entrada no palco. A presidente do Politécnico assegura que o posicionamento alcançado pela instituição não é sinónimo de estagnação: “É um exercício de trabalho continuado”.

Ao longo do discurso, Rosário não poupou elogios quanto ao dinamismo e à “pegada artística e cultural” que o IPP deixou no terreno português: “As instituições dinâmicas transformam-se, atualizam-se”, afirmou.

A presidente do Politécnico do Porto aproveita ainda para mencionar o processo de reestruturação da oferta formativa pelo qual o IPP está a passar: “Este reposicionamento visa responder a desafios cruciais”. Rosário Gambôa defende que “não há produção de conhecimento sem investigação” e que a missão do Instituto é “gerar conhecimento e cultura”. Mas nem todos concordam com a necessidade de reestruturação.

Lá fora começa a chover. Nem o mau tempo impede os cerca de trinta alunos de cercarem as portas do Rivoli. Ana Moreira, aluna do segundo ano do curso de Tecnologia da Comunicação Audiovisual (TCAV) da ESMAE, partilha o guarda-chuva com uma colega. “Nem tivemos voto na matéria”, garante a estudante. “Eles afirmam que a opinião dos alunos foi ouvida, mas na verdade não foi. Só quando souberam da manifestação, por via das redes sociais, é que marcaram uma reunião para esclarecer a situação”, conta ao JPN.

O IPP reuniu com alguns alunos das escolas mais afetadas para esclarecer as suas dúvidas, mas Ana garante que a comunicação “tem falhado”, nomeadamente entre a associação de estudantes e os alunos.

A aluna acredita que a principal consequência da reestruturação para a ESMAE é o facto dos cursos do Departamento de Artes e Imagem (DAI) passarem para Vila do Conde: “Isso implica fazer viagens de três ou quatro horas todos os dias, o que é impensável num curso que envolve o transporte de tantos materiais”. Ana espera que o IPP “tenha em conta as vidas pessoais dos alunos e que quem já iniciou o curso o termine na ESMAE”, alertando para o facto destas medidas serem “mais um corte no ensino artístico”.

Já Sara Lima Alves não vê a sua escola sofrer alterações diretas. No entanto, a vogal da Associação de Estudantes da ESE mostra-se contra a reestruturação. “Isto não tem nada de positivo, apenas pretende criar uma imagem daquilo que é verdadeiramente a estratégia do IPP. Dia 15 vamos todos para Lisboa manifestar-nos”, revela a estudante. Subfinanciamento, desvalorização e falta de credibilidade foram alguns dos problemas apontados pela aluna.

Vítor Hugo Lopes encaixa no exemplo que Sara refere. É antigo estudante da ESEIG e membro da associação dos antigos alunos da escola. Vítor acusa o Politécnico do Porto de tratar algumas das reivindicações dos alunos como meros “detalhes”: “Avançámos com uma petição. Pedimos que esta reestruturação não avance e que seja devolvido o debate ao IPP. Há uma parte sentimental que toca a todos, mas a questão de aparecer no currículo uma escola que está extinta é algo a ter em conta”.

Cá fora, os alunos expõem as suas indignações. Lá dentro, Rosário Gambôa finaliza o discurso, enaltecendo o trabalho de Manuel Heitor na área do ensino pelos “valores que defende”. A presidente do instituto sustentou a ausência de uma “política clara de financiamento do Ensino Superior” e a existência de uma “estrutura fixista” no sistema de ensino português. “Queremos contribuir para a procura de soluções no ensino”, afirmou Rosário Gambôa. A presidente do IPP ambiciona “múltiplos centros de ensino” para a cidade do Porto.

É o ministro Manuel Heitor quem se segue a Rosário Gambôa. “Será possível aqui dizer que o Politécnico do Porto se diferencia perante um contexto europeu”, assegura Manuel Heitor. O ministro lançou três desafios ao IPP: a “especialização”, o “alargamento da prática sistemática da atividade de investigação e de desenvolvimento” e a “profissionalização crescente” no instituto.

Manuel Heitor menciona também a relevância do Ensino Superior no Orçamento de Estado para 2016: “No âmbito do Orçamento de Estado, agora em discussão, consagrámos um orçamento de mudança nas áreas do Ensino Superior e da Ciência e acredito que o único desígnio que temos é apostar no conhecimento e em instituições como o IPP”.

No final da sessão comemorativa, Manuel Heitor conta ao JPN que não viu “um clima de contestação, pelo contrário”: “Vi um clima de grande esforço e vontade de fazer uma instituição cada vez mais portuguesa, mais moderna, mas também mais europeia. Para isso, o Politécnico precisa de mais autonomia. Foi a minha principal mensagem”, declara.

O relógio marca as 20 horas. A celebração é dada por terminada com a entrega de prémios e distinções aos elementos da comunidade do Instituto Politécnico do Porto e com as atuações dos alunos das várias escolas. Mas, lá fora, os gritos ouvem-se mais alto. Contra a reestruturação, contra a falta de condições materiais, contra a falta de discussão.

Unem-se para que quem está lá dentro os ouça.

O processo de reestruturação anunciado a 10 de fevereiro vai continuar a ser discutido pelo Instituto Politécnico do Porto e pelas associações de estudantes da instituição.

 

Artigo editado por Filipa Silva e Sara Gerivaz