O financiamento do Ensino Superior é “um problema social complexo”, no qual “o governo tem um papel fundamental”. A ideia foi deixada na sexta-feira pelo ministro Manuel Heitor que esteve no encerramento do terceiro Fórum do Financiamento da Associação Europeia de Universidades (EUA, na sigla inglesa), que decorreu no Porto.

O ministro que tutela a pasta da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior apontou o dedo às fragilidades europeias que afastam o continente dos níveis de conhecimento dos Estados Unidos da América, da China e de outros países asiáticos. “Hoje a Europa não tem instrumentos financeiros para aquilo que são as ambições”, explicou o ministro aos jornalistas à margem do evento. Soluções? Diálogo das universidades com a sociedade, com o poder local e com o governo. No fundo, “aliarem-se aos parceiros sociais e económicos num debate que é sobretudo europeu”.

O ministro Manuel Heitor defendeu a aproximação do Ensino Superior à investigação e explicou que a questão se prende sempre em como distribuir as verbas entre os dois.

Thomas Estermann

Thomas Estermann Foto: Patrícia Garcia

“É preciso continuar a advogar que o investimento nas universidades é o investimento correto para o futuro”, explicou ao JPN Thomas Estermann, diretor para a Administração, Financiamento e Desenvolvimento de Políticas Públicas da EUA. Para ele, não é suficiente afirmar a necessidade de mais financiamento. Acima de tudo é preciso reconhecer o valor do ensino e da investigação para a sociedade.

Competição desigual pelos fundos estruturais europeus

Durante o evento, foi apresentado o estudo de 2016 do Observatório do Financiamento Público da EUA. Uma das principais conclusões é a crescente pressão governamental sobre as universidades para que estas obtenham financiamento por parte da União Europeia (UE) e outras entidades externas.

O estudo exemplifica com o Horizonte 2020, programa da UE para a investigação e inovação, em que o número excessivo de candidatos resulta numa taxa de sucesso baixa.

Mas o trabalho aponta para uma situação paradoxal: universidades sem financiamento público não conseguem competir em paridade com instituições financiadas, perdendo atratividade.

Pedro Teixeira

Pedro Teixeira Foto: Patrícia Garcia

“Em muitos aspetos, a Universidade do Porto está numa competição desigual. Ao longo dos últimos anos, em que houve cortes significativos no Ensino Superior e na investigação em vários países europeus, nomeadamente, do sul e do leste da Europa, houve países que continuaram a investir significativamente. Esses são os países que têm melhores condições para atrair e para competir pelas grandes bolsas e projetos de investigação”, explicou Pedro Teixeira ao JPN.

O vice-reitor da Universidade do Porto defende que a União Europeia terá de descobrir mecanismos de coesão interna, caso contrário “os grandes investigadores, os melhores estudantes e os principais financiamentos vão estar concentrados num número muito pequeno de instituições”, explicou.

“À exceção da Alemanha, houve uma mudança dramática do investimento no conhecimento”, afirmou o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior durante a sua apresentação. “O que eu vejo é uma Europa mais fragmentada”, sublinhou.

Portugal em crescimento

O Observatório do Financiamento Público da EUA revela que, em 2015, as universidades portuguesas receberam mais 4,8% de financiamento público em comparação com 2008, salientando que Portugal é “o único país do Sul da Europa com dinâmicas de financiamento positivas relativamente ao número de estudantes”.

Mas o estudo chama também a atenção para os cortes no Ensino Superior português que ocorreram ainda antes de 2008, alertanto para a possibilidade de Portugal não ter ainda recuperado para os valores pré-crise.

O ministro Manuel Heitor referiu as melhorias ao nível nacional. “Nós alterámos o trajeto que Portugal estava a tomar. Desde 2016, demos às instituições a possibilidade de contratarem. Passou-se de uma fase de contração para uma fase de relativo alargamento, ainda baixo, porque temos uma contenção orçamental muito crítica”, declarou aos jornalistas.

O vice-reitor da UP para a Formação e Organização Académica, Pedro Teixeira, confrontado com o aumento estimado de 2% de financiamento em Portugal no ano corrente, em comparação com o anterior, desvaloriza o valor apontado pelo estudo, explicando que esse aumento não chegou para compensar as reposições salariais feitas este ano. “É pouco significativo. Isto faz com que o valor que uma instituição como a UP ainda precisa de pôr para as reposições salariais seja alto. E nem cabe aqui discutir se essa questão é adequada ou não… É uma imposição feita às instituições. Mas a reposição salarial é maior do que os 2%”, afirmou. Já em fevereiro se previa que a verba alocada à UP iria ser largamente atribuída a aumentos dos custos salariais.

Pedro Teixeira explica que a atual preocupação, tanto para a UP como para as instituições de Ensino Superior em geral, é ter o mínimo de financiamento público que garanta condições de trabalho e de estudo para os professores, para os funcionários e para os estudantes.

O vice-reitor afirma que o custo por estudante é cada vez maior, fruto das expectativas do mercado de trabalho, que já não espera que os estudantes sejam ensinados em aulas de duzentos alunos, mas sim em ambientes de maior participação, “o que obriga a ter mais recursos, e isso implica mais investimento”.

O evento

img_5072A Universidade do Porto, anfitriã do evento, aponta-o como um sucesso, elogiando o formato escolhido, mais dinâmico e “participativo”.  “Foi bastante adequado para a audiência, composta de pessoas com responsabilidades de gestão corrente nas instituições e que valorizam poder aprofundar determinados assuntos através da discussão”, explicou Pedro Teixeira.

Thomas Estermann, da EUA, elogiou a UP, explicando que o objetivo era juntar diferentes pessoas, “desde líderes institucionais a decisores políticos, tanto ao nível national como ao nível europeu” para que se pudesse gerar uma discussão acerca do tópico. “Acho que conseguimos uma excelente troca de ideias”, concluiu Thomas Estermann.

O terceiro Fórum Internacional da Associação Europeia das Universidades sobre o Financiamento do Ensino Superior decorreu no Seminário de Vilar, no Porto, entre os dias 6 e 7 de outubro, sobre o tema “Efficient universities: value for society”. Este é um evento bienal organizado pela EUA, que reúne mais de 200 dirigentes de instituições de Ensino Superior, investigadores e agências de financiamento e regulação do Ensino Superior na Europa.

Lançado em 2008, o Observatório do Financiamento Público processa e analisa diversos fatores de contexto económico, entre eles a inflação e o crescimento do PIB, tendo por objetivo fornecer dados empíricos acerca das trajetórias de financiamento público das universidades.

As apresentações do evento estão disponíveis na internet, bem como a ferramenta online da EUA.

Artigo revisto por Filipa Silva