O evento, que Pinto Balsemão considerou ser uma “afirmação anual da defesa e promoção da cultura”, foi o pretexto suficiente para, a ele, se juntar uma audiência que encheu a sala principal do edifício. A conferência foi moderada por José Carlos de Vasconcelos, diretor do Jornal de Letras.
Antes, o presidente do conselho de administração da Impresa (dona do Expresso e da SIC) fez questão de lembrar que “em pleno século XXI, grande parte da população mundial está [ainda] privada pelo poder político de aceder às notícias e às opiniões que constituem a essência do jornalismo livre”.
Embora Portugal tenha sofrido com os “efeitos da censura” durante 40 anos – libertando-se dela com o 25 de abril de 1974 – Pinto Balsemão preferiu não dar como garantida para sempre a liberdade de informar e de ser informado, “mesmo nos países como o nosso, que vigora num regime democrático”.
Aceder “onde, quando e como querem”
Para Francisco Pinto Balsemão, o panorama português não é “estático” pelo que os média “clássicos” – como a imprensa, a rádio ou a televisão – estão, atualmente, condenados a perder audiências e rentabilidade, “quando não a desaparecer”.
Uma tendência que o próprio considera ser mais visível na imprensa, cujos números quanto à circulação ou às receitas da publicidade paga são reveladores, registando uma acentuada queda, ao contrário, por exemplo, da televisão em que os números “não são tão assustadores”.
Segundo o também fundador do PSD, ainda que a publicidade televisiva se tenha “aguentado”, é inevitável a perda de audiências para os canais distribuídos por cabo e para iniciativas como o “streaming”, obtido diretamente da Internet.
Por sua vez, a publicidade digital registou uma subida “astronómica”, o que não quer dizer, no entanto, que as receitas sejam para os media nacionais, mas sim para, em muitos dos casos, as redes sociais – como o Facebook, o Snapchat ou o Instagram – que as pessoas acedem “onde, quando e como querem.”
A coragem jornalística na denúncia
É nesta fase que Pinto Balsemão parece responder à pergunta que deu nome à conferência, “Os media (ainda) são necessários?”: “Parto do princípio que o jornalismo tem um conjunto de funções a desempenhar”.
Considerada uma das chaves mestre da democracia, a liberdade de expressão é referida por Pinto Balsemão como essencial num regime democrático: “Os media não se podem circunscrever a funções neutras. Precisam também de assegurar um papel ativo como guardiões dos valores essenciais”.
Para tal, continua, “a capacidade e a vontade de investigar e denunciar abusos de poder, corrupções, faltas de transparência e de o fazer em relação aos poderes clássicos, mas também em relação aos novos poderes” é fundamental para o sucesso do jornalismo.
“Sem a coragem jornalística, física até, de diversos meios de comunicação social, verdadeiros abusos não teriam sido revelados e não teriam sido punidos”, adianta.
A imprensa como contrapoder
Embora a imprensa seja apelidada por muitos como o “quarto poder”, Francisco Pinto Balsemão recusa essa designação: “um jornal, uma rádio, uma televisão não deve substituir-se ao Estado. [Os media] não tem de assumir-se como grandes educadores do povo e, muito menos, estar ao serviço de um projeto de poder pessoal ou partidário, político ou económico, cultural ou desportivo”.
Por isso, prefere-lhe atribuir o conceito de contrapoder: “É contrapoder no sentido de que são a outra face da mesma moeda. […]. Isto não significa que os media devem estar contra o poder executivo, legislativo ou judicial ou qualquer outro poder, exceto poderes criminosos. Significa sim que estão do outro lado e [que] não podem ser confundidos”.
Todavia, põe em causa a legitimidade deste contrapoder não eleito, justificando-a, de seguida, como sendo uma legitimidade que não deixa de ser “criada, mantida e distribuída pelo público”. Ou seja: “O público como grande juiz”.
“O público como grande juiz”
Embora reconheça que a população, na sua generalidade, não possua uma “educação específica para a literacia dos media”, Francisco Pinto Balsemão é perentório quando afirma que o público tem demonstrado um enorme poder ao longo dos séculos.
Esse poder tem-se manifestado, sobretudo, na degradação do serviço prestado por “empresas de televisão, de imprensa, de rádio, de edição de livros”, entre outros.
Para além disso, Pinto Balsemão destaca que “as pessoas se habituaram a não pagar pelos conteúdos” e a serem elas próprias a produzir informação.
O “mundo maravilhoso da Internet” vs a credibilidade da mentira
Pinto Balsemão questiona se no futuro “o jornalismo se tornará cada vez mais doente, enfraquecido, pré-formatado, obsoleto e dispensável a favor das redes sociais para o funcionamento da democracia”. O responsável da Impresa reconhece ser “o primeiro a valorizar, a louvar e a utilizar as novas tecnologias”.
Contudo, alerta para o “mundo maravilhoso da Internet” responsável pela “criação de novos universos, muitos deles virtuais, e nem todos positivos” numa clara referência às irrupções de desinformação (facilitadas pelas novas tecnologias) que, baseadas na credibilidade da mentira, são, em muitos casos, irreparáveis para quem é afetado.
Com o consumo de notícias falsas a aumentar, o jornalismo profissional acumula, para além das suas missões clássicas, uma nova missão: a de corrigir os erros das redes sociais, dos agregadores de conteúdos e dos motores de busca.
“Esta função de separar o trigo do joio é uma função fundamental no jornalismo. Para as empresas e marcas de media sérias, e que pretendem ser duradouras, esta instabilidade é um enorme desafio”, conclui.
Artigo editado por Rita Neves Costa