As casas que ainda continuam de pé na pequena vila situada no oeste da Alemanha estão a ser demolidas para expandir a mineração de carvão. Apesar do cerco da polícia, ativistas pelo clima continuam a resistir e reclamam vitória mediática.
Centenas de pessoas continuam a protestar em Lutzerath, na Alemanha, contra a expansão da mina de carvão Garzweiler.
Durante a última semana, a polícia entrou na povoação com “maquinaria pesada”, conta Dorothee Haüssermann, ao JPN. Dorothee é uma das porta-vozes do Allen Dorfer Bleiben (ADB), um dos movimentos de ativistas que se manifesta no local.
”Começaram a cortar árvores, a deitar edifícios abaixo. Estão a pôr em causa a segurança das pessoas que ainda estão lá dentro”, relata, em entrevista realizada via telefone.
Na quarta-feira (11), as autoridades ergueram uma cerca e o acesso ao interior da povoação passou a estar vedado. “Muitas pessoas foram-se embora”, mas “cerca de 200” continuam a resistir, garante Dorothee.
Centenas de localidades destruídas pelas minas
Debaixo do solo da povoação jazem milhões de toneladas de lignito, uma forma de carvão vegetal. Um minério que, depois de extraído, vai contribuir para o aquecimento global: “O carvão tem que ficar debaixo do chão, para evitar o desastre climático”, explica Dorothee.
Os terrenos reapossados pela polícia nos últimos dias são propriedade da Garzweiler, uma empresa mineira que pertence à RWE, um gigante alemão da área da energia.
Durante décadas, a pujança industrial germânica alimentou-se da abundância de minérios existentes no oeste do país. O carvão, em particular, ajudou a Alemanha a tornar-se no motor da economia europeia, depois da Segunda Grande Guerra Mundial.
Isto conduziu a que “nos últimos 70 anos cerca de 300 localidades fossem destruídas para a mineração do carvão”. Segundo as contas da ADB, “dez mil pessoas tiveram que sair das suas casas”.
Ativistas montaram acampamento e ocuparam casas
Há dois invernos atrás, a mina reclamou para si os terrenos onde até então existiam apenas quintas pacatas e ruas típicas de uma pequena povoação localizada no estado da Renânia do Norte-Vestfália.
Pelo menos metade da vila desapareceu nessa altura. O “grande buraco a céu aberto” que é a mina cresceu até ficar a cerca de cem metros das casas que ainda continuam de pé. “Quase que conseguimos tocar-lhe”, diz Dorothee.
Só o esforço dos ativistas e de um morador que se recusou a sair impediram a destruição completa da localidade, algo que agora parece inevitável.
“Estamos há dois anos a preparar-nos para isto”, explica Dorothee. Os ativistas da ADB construíram um acampamento na povoação, montaram casas nas árvores e ocuparam os edifícios que ainda estavam de pé.
Ao longo destes meses, promoveram atos de desobediência civil para impedir que as máquinas da mina continuassem a trabalhar, ao mesmo tempo que organizavam festivais e workshops. “Lutzerah tornou-se um ponto de encontro de pessoas da região”, afirma.
Em setembro, porém, um tribunal decidiu a favor da RWE no processo judicial interposto pelo único habitante que ainda resistia ao despejo. Assim, no início de 2023, a empresa, com o apoio das autoridades, deu início aos trabalhos de demolição do que sobra da localidade.
Derrota no terreno, vitória na opinião pública, dizem ativistas
Dorothee Haüssermann admite que, face aos últimos desenvolvimentos, a destruição de Lutzerath é inevitável, mas sublinha que a luta dos últimos dias pode representar um novo fôlego para o ativismo climático: “É terrível o que está a acontecer. Lutzerah está perdida, mas estamos a ganhar nos media, na opinião pública”.
Nas últimas semanas, orgãos de comunicação de todo o mundo viraram a atenção para Lutzerath, que tem recebido a solidariedade de “cientistas, artistas e figuras proeminentes”. “Todo o mundo quer saber o que se passa aqui”, resume Dorothee.
Greta Thunberg visitou o local, nesta sexta-feira (13). A ativista sueca, fundadora da “Fridays for Future”, afirmou que “o carbono tem que ficar no chão”, manifestando repúdio pela “violência policial” que tem sido exercida sobre os manifestantes.
Enquanto se vivem os últimos dias de resistência em Lutzerath, a ADB aponta já para o futuro. Se nada for feito, há outras vilas na Alemanha que “vão ser destruídas para assegurar a expansão de minas de carvão”, garante a porta-voz do movimento.
Artigo editado por Paulo Frias